|
Ornette Coleman
Em 1959, ao abrir uma série de concertos no famoso clube nova-iorquino Five Spot, Ornette Coleman chamou a atenção do mundo do jazz. Aparecendo a tocar num saxofone de plástico branco, com uma sonoridade estranha e uma linguagem musical desconcertante, baseada num suporte temático aparentemente simples, quase infantil, era acompanhado por Don Cherry no seu pocket trumpet, e uma secção rítmica composta por Charlie Haden no contrabaixo e Billy Higgins na bateria. A principal novidade era que os improvisos não obedeciam a uma série de acordes pré-definidos, como seria de esperar na época.
Com o succès de scandale que costuma marcar as revoluções artísticas, Ornette fazia história. O seu estilo não tinha precedentes, e tanto o público como a crítica não sabiam muito bem como reagir. A sua música era inclassificável. As opiniões sobre esta música oscilavam entre dois extremos: Leonard Bernstein considerou-a genial, Roy Eldridge uma fraude.
Ornette não era o único a explorar esta via. Outros, como Cecil Taylor, eram ainda desconhecidos mas trilhavam o mesmo caminho. Claro que o estilo não nasceu do nada. Antes de ir para Nova Iorque, o seu grupo teve vários anos de experimentação, em que foram reequacionados todos os aspectos do jazz, como ritmo, melodia, harmonia, sonoridade, fraseado, estrutura. A esta música, que lhe surgia naturalmente, chamaria free jazz.
Os limites da sujeição aos acordes são explicados pelo próprio: “Using changes [série de acordes] (...) let the audience know what you’re doing. But that means you’re not playing all your own music, or all the music you’re playing’s not yours”. (...)
Para Ornette, a expressão pessoal é o mais importante. O que ele gostava mais era de ver alguém fazer aquilo que melhor sabia, fosse em que área fosse. Sobre um malabarista que ele observou em frente ao Radio City Music Hall, em Nova Iorque, comentou mais tarde que fora a obra de arte mais bela que alguma vez tinha visto.
O seu estilo é muito marcado pela sua passagem por bandas de rhythm & blues, o que torna a sua música menos abstracta, mais alegre e rítmica, o que permite uma leitura mais fácil, apesar da complexidade da gramática musical. Uma afinação muito pessoal, utilização de multifónicos (produção de vários sons em simultâneo), efeitos sonoros, sonoridade poderosa, glissandi, etc., tudo contribui para o seu estilo como saxofonista. Acima de tudo ele pretende encontrar a voz humana no seu som: “You can always reach into the human sound of a voice on your horn if you’re actually hearing and trying to express the warmth of a human voice.” Na realidade, Ornette era mais respeitado como compositor do que como saxofonista. (...)
Será que Ornette deixou alguma vez de ser um músico de rhythm & blues? Talvez não, e talvez seja essa a marca que o distingue de outros representantes das correntes de vanguarda no jazz. Desde a sua fase de “bebop progressivo” à música eléctrica de Prime Time, passando pelo desbravar do free jazz (a seguir ao qual se retirou, deixando a porta aberta para outros o explorarem), Ornette nunca abandonou uma certa visceralidade na execução, apesar de já não se deitar de costas no chão e bater os pés no clímax dos seus solos, como quando imitava o saxofonista Big Jay McNeely, um dos seus ídolos da adolescência. (...)
FAIXAS DO CD OFERECIDO
COM O VOLUME
|