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Dizzy de “estonteante” e não de “tonto”. Diz-nos Miles Davis na sua biografia que, se Charlie Parker representava o espírito do be-bop, Dizzy representaria simultaneamen-te as mãos e a cabeça, pelo simples facto de que, para além da dupla que fez durante muito tempo com Charlie Parker, até Miles Davis lhe tomar progressivamente o lugar, foi um dos principais (senão o principal!) mentores do be-bop, e que muito contribuiu para que fosse registado como forma e linguagem de aproximação à improvisação no jazz, marcando o início do jazz moderno.
Jazz é música de excitação, e Dizzy Gillespie é um dos maiores exemplos disso mesmo. Sobre a sua vida existem vários livros. Vários, porque muito há para contar, e muito ficou decerto por contar. Dizzy não faz só parte da história do jazz, ele é ela própria. No entanto foi sempre uma pessoa modesta no que toca às suas contribuições para o be-bop e para o jazz.
Dizzy era músico autodidacta, mas sabia bem da matéria em causa. Demonstrava, na prática, conhecimentos de harmonia que muitos outros não faziam ou conseguiam. Foi um dos primeiros a revelar a importância da aprendizagem do piano para os instrumentistas de sopro, pela razão que a percepção auditiva dos acordes mudaria a forma como tocam, porque mudaria a forma como olham para um dado tema, e como o ouvem. Ele próprio o diz num registo televisivo do programa Jazz Casual nos anos 50. Miles também o refere. As sessões depois dos concertos até altas horas, ou simples jam sessions serviam para Dizzy “espalhar a palavra”, colocar em discussão, experimentar, e em particular explorar novos motivos rítmicos e os novos temas que nasciam. Passou também esses conhecimentos e conclusões ao papel, escrevendo textos de teoria da música, uma inovação que permitiu o início de um legado para todos os músicos de jazz, e para que o be-bop fosse a base de todo o futuro de uma linguagem. Há quem diga que tudo de facto começa no be-bop. O tal jazz dito “moderno”.
Dizzy convidou muitos músicos a participar nesta nova euforia, que levou particularmente os músicos negros à 52nd Street de Nova Iorque, onde se viriam a gerar misturas e confusões, negras e brancas, indesejáveis à luz da segregação existente. (...) O colorido latino patente nos concertos de Dizzy veio também a demonstrar o lado de entertainer de Dizzy, que fazia o jazz parecer afinal uma música fácil. A sua figura ajudava: as enormes bochechas ao soprar o trompete, o trompete com a campânula dobrada para cima. Desta campânula dobrada muito se diz, que terá sido “por um azar” num concerto ou jam, ou propositadamente também se diz. Seja como for, Dizzy disse um dia que também ajuda o som a chegar mais rapidamente aos ouvidos do público. Ele lá sabia! (...)
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