Na colecção Let’s Jazz
em Público, é a vez do rompete.
É o sétimo de 31 livros
com oferta de CD,
sob a direcção de José
Duarte, onde a história
do jazz é percorrida
através de alguns dos
seus nomes essenciais,
mas também do papel
dos instrumentos
ou das vozes que o
marcaram. Do texto do
trompetista Laurent
Filipe, que integra este
livro, publicamos hoje
um breve excerto.
Na música, seja ela qual for, em última instância, o que é importante é contar uma história. Essa história é contada através do instrumento, das possibilidades que ele oferece e do domínio que se tem dele. Quanto maior o domínio sobre o instrumento, maior a possibilidade de desenvolver e aprofundar o discurso que a história conta.
Há mais de 4000 anos que o ou a trompete conta histórias. Desde as muralhas de Jericó até à ultima gravação ou concerto que ouvimos, o trompete mantém a sua condição de “voz” dos instrumentos. Sendo, descaradamente, um instrumento de intervenção capaz de abanar paredes, o trompete tambem pode ter uma doçura tímbrica cujo registo de expressão se pode aproximar mais da voz humana.
“O trompete é um instrumento sacrificial. É o mais difícil dos instrumentos de sopro e também o mais exigente”, disse o crítico Stanley Crouch. Não admira pois que, comparando com o extenso número de instrumentistas que se destacaram noutros instrumentos, o trompete, por muitos considerado como o “king” (rei) dos sopros tenha tido uma dinastia marcada por poucos grandes virtuosos que souberam dar voz ao seu génio através deste instrumento, por sinal bem rudimentar na sua construção.
É na forma de expressão musical do jazz, a partir de 1900, que o cornetim, com a sua sonoridade mais escura e o trompete começam verdadeiramente a contar a sua “história”.
Nascido na emblemática cidade de New Orleans em 1877, Charles Joseph Buddy Bolden tinha um som de cornetim a condizer com a sua personalidade. Poderoso, inovador e arrojado, o estilo de Bolden era particularmente marcado pela forma sincopada de tocar as frases.
É-lhe atribuída a invenção do “big four” que consiste em acentuar com o bombo o quarto tempo do segundo compasso. Juntando a esta nova forma de “marchar” um som potente onde as notas eram arrancadas como um roncar (“growl”), Bolden conseguiu imprimir à sua música uma exuberância que lhe consagraria o título nobiliário de King Bolden”. (...)
Ainda na era que antecede as gravações, está Freddie Keppard, nascido em New Orleans em 1890, no seio de uma família de músicos.
Depois de se iniciar no bandolim, violino e acordeão, o jovem Keppard decidiu-se pelo cornetim e em 1914 tornouse co-líder da Original Creole Orchestra. No ano de 1915. a orquestra viajou de costa a costa dos EUAvindo a desfazer-se em 1917 para se reconstituir pouco tempo depois. (...) Conta-se que a sua energia era tanta que durante um espectáculo a surdina saltou-lhe do cornetim com tal força que foi aterrar na mesa dos espectadores mais próximos, a uns escassos três ou quatro metros dele… (...)
|