Os factos e a opinião
A informação complementar e diferente, o "background"
e protagonização da notícia, a análise e a interpretação indispensáveis
à sua compreensão integram e distinguem o estilo do PÚBLICO.
1. Opinião, interpretação, informação
a. Tal como não existe objectividade em estado puro,
não existem nos textos jornalísticos fronteiras absolutas entre
informação, interpretação e opinião. De qualquer modo, há três níveis
essenciais na construção das peças: a apresentação dos factos, que
podem ser a divulgação da opinião de terceiros a informação;
o relacionamento desses factos entre si a interpretação;
e o juízo de valor sobre esses factos a opinião.
Na notícia predomina a apresentação dos factos. É
uma evidência que decorre da própria estrutura da notícia, do seu
espaço e do seu tempo. Espaço curto, tempo imediato. No entanto,
a notícia não se reduz, no PÚBLICO, ao telex de agência que
constitui, sempre, um mero ponto de partida para uma informação
mais completa (mesmo no âmbito das Breves). É nessa medida que a
notícia não dispensa o enquadramento básico dos factos no contexto
em que eles ocorrem, ou seja, o "background", nem a sua
relação com outros factos que condicionam os primeiros. E esse enquadramento
pressupõe, naturalmente, a capacidade de interpretar aquilo que
é mais relevante e significativo para uma apresentação rigorosa
e sugestiva dos factos.
É na reportagem e no inquérito que a interpretação
dos factos encontra a sua expressão mais desenvolvida. Mas essa
interpretação tem, frequentemente, uma fronteira difusa com a opinião,
na medida em que a subjectividade do olhar do jornalista o leva
a escolher um ângulo de abordagem dos acontecimentos e situações
que observa e descreve. Aí intervém a necessidade da distanciação
e a preocupação da imparcialidade. Interpretar não é julgar, mas
explicar o porquê e o como das situações. Enquanto na notícia predominam
o quem e o quê, a reportagem e o inquérito procuram saber mais sobre
o como e o porquê.
Notícia: a aprovação na Assembleia
da República por escassa maioria de uma lei que conta com a oposição
do Presidente da República.
Interpretação (o relacionamento
dos factos narrados e as suas consequências): a medida está provavelmente
condenada ao veto presidencial, dada a inexistência dos indispensáveis
dois terços na votação dos deputados. O jornalista não precisa
de "pendurar" nenhuma declaração autorizada para justificar
a hipótese aventada. É a verdade pura decorrente do texto constitucional.
A interpretação, desde que utilizada
com rigor e seriedade, é ainda um instrumento para que o jornalista
não se resuma ao papel de mensageiro e a notícia que leva ao leitor
não se torne num logro.
Por exemplo, em plena campanha
eleitoral de um clube desportivo, não basta noticiar os reforços
em novos jogadores, prometidos por um presidente em busca de reeleição.
Com toda a legitimidade, o jornalista deve confrontar essas promessas
com outras antes feitas pelo mesmo presidente e eventualmente
nunca cumpridas.
b. Uma relação séria e leal com o leitor pressupõe
o respeito pela diferença de códigos entre informação e opinião.
O equilíbrio e a complementaridade entre informação
e opinião são uma preocupação permanente do PÚBLICO em todas as
suas áreas editoriais.
"É notícia segundo
a definição já consagrada de Lester Markel, presidente honorário
do Instituto Internacional de Imprensa informar que o Kremlin
acaba de lançar uma ofensiva de paz. É interpretação explicar
as razões dessa medida. É opinião adiantar que qualquer proposta
soviética deve ser recusada, pura e simplesmente."
2. Ir mais longe na informação
a. O PÚBLICO não sonega nenhuma informação e publica
tudo o que revestir interesse jornalístico isto é, for baseado
num facto verdadeiro, inédito, surpreendente ou actual, que seja
de interesse para muitos leitores e não colida com preceitos éticos
e deontológicos atrás descritos. Cf. Ética e Deontologia.
b. Na valorização de uma notícia influem alguns critérios
suplementares que definem igualmente o interesse jornalístico (e
em última análise interessem um maior número de leitores).
Por exemplo:
o seu impacte uma notícia é tanto mais
importante quanto mais pessoas forem afectadas, de uma forma ou
de outra;
proximidade caso das questões do quotidiano;
uma greve de camionistas europeus: quais as consequências para Portugal?;
a guerra na ex-Jugoslávia na perspectiva dos portugueses que lá
estejam; ou o interesse sempre acrescido da informação sobre os
países lusófonos: por todas as razões históricas, mas também porque
há um vastíssimo público sintonizado para esse tipo de informação;
relevância pessoal, social, política,
artística, cultural, económica, científica, técnica, profissional,
desportiva, etc..
Outros factores concorrem para
a importância de uma notícia: a sua raridade (a notícia menos
provável é mais importante do que a notícia esperada); a oportunidade
da informação (um trabalho sobre o funcionamento dos aeroportos
de Lisboa e Porto num dia de greve da TAP, por exemplo); a sua
própria utilidade para os leitores (um jornal é também um serviço
público); interesse pessoal ou até mesmo a aventura; a originalidade;
a curiosidade; a expectativa e o "suspense" inerentes
(normalmente matérias de "faits-divers").
c. Notícias em primeira mão (cachas) e restante informação
do PÚBLICO reclamam dos seus jornalistas uma rede de contactos com
credibilidade reconhecida tanto quanto possível publicamente nas
respectivas áreas de trabalho.
Normas práticas:
Contactos regulares, boas relações em
postos-chave e iniciativa junto de entidades que possam constituir-se
como fonte de informação e/ou ponto de partida para uma investigação
jornalística.
O recurso ao contacto telefónico não
deve substituir o contacto personalizado e exclusivo junto de
uma fonte de informação, a não ser em situações de manifesta impossibilidade;
nessas situações, o jornalista deve telefonar para qualquer local
e a qualquer hora para obter ou confirmar uma informação. O telefone
é um instrumento indispensável ao jornalismo, mas o seu papel
é apenas supletivo do trabalho de campo.
d. O jornalista deve estar sempre disponível para
captar e interpretar os aspectos novos e inesperados das situações,
os sinais de mudança, as perspectivas que se abrem no panorama nacional
e internacional.
e. Apresentar uma notícia de forma completa, exacta
e interessante pressupõe clareza, simplicidade e precisão. São as
características básicas do estilo informativo do PÚBLICO. Cf.
O Rigor da Escrita.
f. "Background" e incorporação própria da
Redacção: o enquadramento noticioso e a interpretação dos factos
apresentados em cada peça deverá incluir, sempre que possível, os
respectivos antecedentes o leitor não é obrigado a saber
o que o jornalista tem como adquirido; o público são muitos públicos,
com interesses e níveis de conhecimento distintos.
Princípio geral: escrever como se todos os leitores
comprassem o jornal pela primeira vez na vida. O leitor não sabe
e quer saber mas é preciso que ele também compreenda. O leitor
quer e agradece que se lhe dê toda a informação útil sobre qualquer
acontecimento.
Num e noutro casos, esses antecedentes
devem ser introduzidos de forma elegante e sem prejuízo da actualidade
e da novidade da notícia em si. Sempre que se façam referências
a acontecimentos ainda a decorrer e em que os leitores possam
vir a participar é obrigatório referir com precisão toda a informação
útil local, hora, preço, etc...
g. As informações colhidas nos telexes das agências
ou noutros órgãos de comunicação não deverão ser meramente transcritas
pelo PÚBLICO, que as completará, inserindo sempre um contributo
específico da sua Redacção. Cf. Regras
das assinaturas, em Regras de Construção.
h. Uma crítica ou um comentário mais especializado
não devem prescindir do "background" e dos elementos informativos
básicos indispensáveis à sua legibilidade e clareza para o leitor
comum.
Toda a terminologia mais especializada
deve ser devidamente descodificada, seja da ciência, da cultura,
da economia ou do desporto. Qualquer valor em moeda estrangeira
deve ser sempre convertido para o escudo; milhas e outras distâncias
em sistemas de unidades diferentes do métrico devem ter imediata
equivalência neste. As horas de determinado acontecimento ocorrido
num país estrangeiro indicam-se com a correspondente hora portuguesa,
entre parênteses. Cf. Alfabeto
do PÚBLICO.
i. Fazer coincidir o novo com o humano, interessar
e aproximar o leitor da notícia, dar-lhe rostos, atmosferas, climas
e sentimentos é a protagonização da notícia. Sempre que possível,
a informação do PÚBLICO deve ser humanizada, ter nomes e conter
pormenores suficientemente identificadores que retratem personagens
vivas e com interesse para os leitores.
A frieza de uma estatística,
a descrição de um empreendimento ou a votação de um debate sobre
direitos humanos na ONU justificam sempre a referência aos respectivos
protagonistas. Todos os assuntos devem ter uma dimensão humana
(histórias e factos pessoais) e subordinar-se à lei da proximidade.
Por exemplo, a situação em Moçambique ganhou maior relevância
a partir da integração de um batalhão português nas forças das
Nações Unidas aí presentes.
Outra regra na técnica da protagonização
é a identificação completa das personagens em qualquer história
que se conte, dramática ou não: "Na terra, porém que
se orgulha de ter tido, num dos seus antepassados mais recentes,
Américo Antunes Martins de seu nome, um alfaiate de Salazar ,
a ideia da professora não entusiasmou toda a gente. Dídia Filomena
Miranda, de 28 anos, casada com um sargento do Exército e residente
em Coimbra..." "Iam tão bonitos, com as
mochilas da merenda às costas, contou entre lágrimas
Laurindo Teixeira de Oliveira, de 61 anos, antigo emigrante em
França e que..."
Ou, também, por simples razões
de "background" informativo: "O julgamento
de Luís Monterroso, ex-presidente da Câmara da Nazaré pelo PS..."
"O governador de São Paulo Luís António Fleury Filho (PMDB)..."
Nomes, cargos e formas de tratamento
citados obedecem a regras específicas Cf. Alfabeto
do PÚBLICO.
j. Uma informação distante deverá, sempre que possível,
transformar-se em informação próxima; um facto ou um acontecimento
encerram sempre uma história oculta para contar, muitas vezes ao
alcance de uma rápida investigação jornalística. Capta ainda mais
o interesse do leitor, a quem é dada mais informação.
Dois tiros pelas costas mataram,
em Junho de 1989, o mais conhecido domador de circo português.
Paquito Cardinalli encontrava-se em plena exibição do seu número,
no interior da jaula dos leões, e chegou já sem vida ao hospital.
A notícia, seca, foi divulgada pela Lusa, que adiantava dois outros
pormenores: a identificação do autor dos disparos, um jovem espectador
que Paquito Cardinalli tinha impedido de entrar sem bilhete; e
que o espectáculo continuara, após rápida substituição do domador
pela própria mulher, ela também uma antiga domadora de leões.
A notícia mereceu registo na imprensa diária, que se limitou porém
a transcrever o telex da Lusa e noticiar depois o funeral
de Paquito Cardinalli. Mas nenhum jornal aproveitou a informação
para contar a história hoje ainda oculta: o que de facto se passou
antes e depois dos tiros.
l. Interesse, emoção e vivacidade: o distanciamento
indispensável do jornalista perante os factos e as histórias não
significa apatia ou desinteresse nem ausência de sentimentos. Os
textos do PÚBLICO devem registar o clima, a cor e a acção das situações,
captando os pormenores e as "nuances" das declarações
pessoais, mas sem que se tornem eles próprios reféns dessa emotividade.
Depende do talento do jornalista saber transformar um facto rotineiro
numa narrativa que surpreenda e seduza o leitor.
Os textos deverão procurar conter
o máximo possível de dados e testemunhos, que auxiliem o leitor
a criar uma ideia rigorosa do tema que se está a abordar. Ou da
história que se está a contar. Uma peça é tanto mais verídica
e completa aos olhos do leitor quanto mais fundamentada estiver.
E, melhor ainda, quanto mais essas fundamentações (declarações,
comentários, opiniões, números e pormenores curiosos) representarem
as diversas perspectivas de abordagem de um problema ou as diversas
posições sobre ele existentes. Deve haver pelo menos uma citação
de 20 em 20 linhas ao longo de um artigo, que ganha em autenticidade
e interesse. Torna-se mais vivo e apelativo à leitura, devendo
o jornalista fazer valer, em cada peça que escreve, toda a sua
criatividade e capacidade de sedução do leitor pelo ritmo do texto
e o encadeamento da informação com os pormenores ambientais e
as mudanças de registo que quebrem a monotonia.
m. Por isso, deve recorrer-se, sempre que possível,
à visualização da mensagem informativa: uma foto, a utilização de
gráficos, quadros ou mesmo desenhos facilitam a leitura e a compreensão.
E o PÚBLICO dispõe de um sector inforgráfico especialmente dotado.
A inforgrafia é especialmente aconselhável para os casos de especificação
mais clara de distâncias, percursos e localizações em geral.
n. Finalmente, mas não menos importante, a precisão
indispensável. Por exemplo, no trabalho sobre a inauguração da Via
do Infante, para além do facto noticioso em si e das histórias pessoais
realçadas pelo repórter, a peça (ou melhor, as peças) ficaria(m)
sempre mais apelativa(s) se contivesse(m) dados e números precisos
da obra: custos, tempo de execução, número de trabalhadores e técnicos
envolvidos, distâncias e percursos facilitados. Ou, noutro exemplo,
dar o pormenor do número do quarto e do andar do hotel onde ficou
alojado Frank Sinatra no Porto, o carro em que se deslocava, etc.
Cf. O Rigor da Escrita.
Mas a precisão deve combinar, aqui, também
com variedade discursiva. Num texto sobre o serviço público de
televisão, a comparação dos números facilita o entendimento da
ideia pretendida: "Em Portugal, o Estado dá à RTP entre seis
e sete milhões de contos. Quase metade vai para os Açores e Madeira
e outro tanto para a RTP Internacional e a cooperação com África,
os tempos de antena para os partidos, sindicatos, etc. Para a
TV2 sobram cerca de 500 mil contos por ano. Quase mil vezes menos
do que na Alemanha. O preço de uma campanha e meia para explicar
aos utentes as novas tarifas da portagem na ponte de Lisboa."
Ou, num texto de economia, o (astronómico) número "150 mil
milhões", obriga a um termo de comparação acessível
e rápido. Por exemplo: "... o equivalente a 15 por cento
das despesas da Segurança Social portuguesa.". Cf.
Números, em Alfabeto do PÚBLICO.
3. Investigação
A reportagem investigativa permite proporcionar ao
leitor algo mais do que as simples aparências, as meras evidências
e a interpretação imediata. É verdade que jornalismo é a procura
da actualidade e da notícia e não se confunde com a pretensão de
a fabricar. No entanto, sem investigação, o jornal e o jornalista
transformam-se numa simples caixa de ressonância ou em porta-voz
de campanhas. Ou, então, sem essa capacidade de iniciativa de investigar
os factos e as pistas da actualidade, deixam-se inevitavelmente
ultrapassar pelos acontecimentos e pela concorrência.
A investigação jornalística não se deve confundir
com investigação policial. A preocupação de saber "quem-como-quando-porquê"
pode ser idêntica; os métodos e os objectivos é que não o são. A
polícia tem como funções prevenir e reprimir as actividades criminosas,
estando para isso legalmente empossada de determinados poderes.
A função do jornalista é informar o público, não tendo para esse
efeito outras prerrogativas além do direito de acesso à informação,
nos termos da lei. Por isso, é tão importante a questão da divulgação
da identidade dos acusados, detidos ou simples suspeitos. E, afinal,
o princípio da equidade de tratamento. Cf. Informar
sem Manipular... e Segredo de justiça,
em Fichas da Lei.
4. Reportagem: a acção, os factos e as pessoas
a. Género específico até pela sua liberdade narrativa
e de estilo, a reportagem assenta no terreno preferencial dos factos
e da sua observação directa no local onde se registaram. Deve conter,
por isso, o máximo de pormenores ambientais e humanos.
"Todos os meses, 150 indivíduos
toxicodependentes, quase sempre desesperados, procuram um sector
pouco conhecido da Polícia Civil de São Paulo em busca de apoio.
Todos eles acabam na sala do comissário Alberto Coraza, um ex-maestro
que há trinta anos colocou as partituras de lado para se aventurar
na carreira policial e, nos últimos seis, se especializou no combate
ao consumo de drogas. Hoje, este paulistano de 54 anos, casado
e pai de dois filhos..."
b. Uma reportagem não é um artigo de análise nem uma
crónica: todas as versões contraditórias devem ser oferecidas ao
leitor através de uma multiplicidade de dados, entrevistas e fontes
de documentação.
c. Observar, retratar pessoas e ambientes, analisar
e interpretar personagens e situações, aconselham uma liberdade
narrativa maior do que na notícia pura; mas deverá ser sempre uma
liberdade condicionada pela necessidade e obrigação de informar.
Só ao leitor cabe retirar as suas conclusões.
Normas práticas:
O repórter deve ser cuidadoso na recolha
das declarações dos entrevistados e na anotação de outros dados,
como números, nomes, idades e profissões. A sua reprodução deve
ser sempre fiel e rigorosa.
A cor local, a descrição das personagens
e o retrato dos protagonistas são indispensáveis numa reportagem.
O estudo prévio da situação, os hábitos, locais de residência,
convicções políticas ou religiosas, as preferências e os gostos
das pessoas que se vai entrevistar ajudam à preparação da reportagem
e contribuem para a qualidade do texto final.
A adaptação de uma história concreta
ao contexto geral de uma reportagem é uma técnica especialmente
aconselhada. Por exemplo, um trabalho sobre delinquência juvenil
será muito mais apelativo se a história contada se centrar num
caso pessoal concreto, em vez de se perder numa generalização
anónima. Uma reportagem sobre refugiados despertará tanto mais
interesse no leitor quanto mais densa for a atmosfera humana recriada.
5. A entrevista e as citações
a. Na sua dupla perspectiva, a entrevista é um género
autónomo, mas também uma técnica de investigação específica.
b. Neste último caso meio de pesquisa noticiosa
, a entrevista é um método de investigação comum a todos os
géneros jornalísticos. Ouvir e perguntar, apurar e seleccionar factos,
recolher informações, citar dados ou simples declarações com relevância
jornalística são o quotidiano do redactor. Da informação à opinião,
passando pela cobertura noticiosa de uma conferência de imprensa
ou de um debate, o jornalista utiliza no seu trabalho a transcrição
ou meras citações dessas entrevistas.
É uma técnica que deve obedecer a alguns requisitos
mínimos:
Actualidade e interesse.
Autenticidade e exactidão: as declarações
atribuídas são verídicas e, por regra, sempre identificadas. Devem
ser textuais, não se alterando nunca a literalidade do que foi
dito a não ser para eliminar repetições ou palavras próprias
da linguagem oral, desde que irrelevantes;
Clareza e expressividade: as frases e
expressões reproduzidas devem ser sempre as mais importantes,
expressivas e espontâneas da personagem da notícia. Por exemplo,
um aparte, um tique de linguagem ou uma exclamação inesperada.
Em contrapartida, as ideias e as referências genéricas deverão
ser expostas no discurso indirecto pelo autor do texto. Deverão
também ser valorizadas as declarações segundo a sua raridade ou
impacte na opinião pública: quanto menos forem esperadas mais
valor terão para o leitor.
Elegância e vivacidade: a transcrição
integral das palavras do entrevistado deve ser intervalada com
o ritmo de uma prosa viva e aliciante da leitura. Citações em
excesso equivalem a banalidade e monotonia em suma, empobrecem
um trabalho jornalístico.
Normas práticas:
As declarações textuais nunca devem ultrapassar
os 200 caracteres, quando se tratar de textos "corridos".
As citações vêm sempre entre aspas. É
preferível empregar uma intercalar entre travessões, ou
entre vírgulas fechando as aspas antes e abrindo-as de novo depois
para a referência ao entrevistado, de modo a evitar a rotineira
atribuição do discurso directo no fim da citação.
A fórmula "disse ao PÚBLICO"
deverá ser criteriosamente utilizada, sob pena de se cair na redundância;
em caso algum se usará a expressão "o nosso jornal".
Quanto à fórmula "disse-nos", deverá ser evitada.
Não sendo sinónimos, os verbos "acentuar",
"afirmar", "confessar", "declarar",
"dizer", "esclarecer", "observar",
"precisar", "referir", "rematar",
etc., são, muitas vezes, empregados como se o fossem. Importa,
assim, cuidar do seu uso adequado e preciso.
O jogo entre o discurso directo (das
citações) e discurso indirecto (do jornalista) terá de respeitar
sempre as regras gramaticais. Assim, por exemplo, os pronomes
na 1ª pessoa só podem vir em transcrições da frase completa e
nunca nos pequenos excertos incluídos no discurso indirecto:
Certo |
Errado |
Tavares ingressou no Benfica.
"Mas afirma não me sentia mal no Boavista.
Antes pelo contrário, sentia-me até muito bem no Bessa." |
Tavares ingressou no Benfica,
mas afirma que "não se sentia mal no Boavista, antes
pelo contrário, sentia-me até muito bem no Bessa". |
Uma multidão de pessoas revoltadas
tomou de assalto dois pequenos hospitais da cidade de Surat.
Um estudante envolvido nos distúrbios justifica a fúria
popular: "Os médicos não deviam ter abandonado a cidade,
deixando-nos para trás." |
Uma multidão de pessoas revoltadas
tomou de assalto dois pequenos hospitais da cidade de Surat,
manifestando-se porque, segundo um estudante, "os médicos
não deviam ter abandonado a cidade, deixando-nos para trás". |
(...) considerou a hipótese
de sabotagem do avião "absolutamente excluída":
"Se tal tivesse acontecido, não haveria sobreviventes."
E acrescentou: "Além disso, o Cessna caiu apenas a
500 metros da pista e, aí, nós temos controlo do terreno,
centímetro a centímetro." |
(...) considerou "absolutamente
excluída" a hipótese de sabotagem do avião, porque,
se tal tivesse acontecido, "não haveria sobreviventes,
e depois porque o Cessna caiu apenas a 500 metros da pista,
e aí nós temos controlo do terreno, centímetro a centímetro". |
A reconstituição de declarações a partir
de várias citações numa só frase ou ideia (paráfrases) só se aceita
nas transcrições de documentos escritos.
Admite-se excepcionalmente o uso da expressão
latina "sic" para chamar a atenção do leitor para algo
de errado ou estranho no discurso ou texto original.
Nestes e noutros casos em que se enxerte
numa citação um termo ou uma ideia indispensável à sua compreensão,
esse termo ou essa ideia deve vir entre parênteses rectos.
c. A entrevista como género autónomo distingue-se,
em três aspectos, da simples recolha de declarações, mesmo quando
estas assumem relevância excepcional:
1º Sob o ponto de vista do entrevistado, pressupõe
a aceitação prévia dos limites precisos da conversa. Quem aceita
uma entrevista obriga-se a aceitar todas as questões que o jornalista
entenda indispensáveis sobre o assunto, definido de comum acordo,
assim como a publicação das suas respostas.
Pode-se aceitar um encontro informal
e recusar uma entrevista ficando para o jornalista a obrigação
de perguntar sempre ao seu interlocutor o que pode ou não ser
citado explicitamente. Numa entrevista formal, pelo contrário,
é ao entrevistado que cabe precisar os limites do "off"
e do "on the record". Tais limites, porém, carecem
de um entendimento prévio sobre o objectivo da entrevista; se
existir o risco de demasiados "off" porem em
causa tal objectivo, é legítimo manifestar ao entrevistado a eventualidade
de, após revisão do material recolhido e publicável, se optar
pela não publicação da entrevista.
2º Sob o ponto de vista do entrevistador, requer
uma intervenção activa na condução do diálogo. Importa recolher
declarações, informações ou opiniões originais da parte de quem
se entrevista.
Normas práticas:
Uma entrevista não é uma discussão nem
um debate de ideias: o jornalista deve perguntar, inquirir, confrontar
o entrevistado com as suas próprias contradições ou com factos
e opiniões que contradizem o seu discurso, levantar questões e
procurar respostas; nunca deve impor a sua opinião, como se estivesse
num frente-a-frente com o entrevistado. É o jornal e, no
limite, a opinião pública quem pergunta através do jornalista.
Por isso, as perguntas são assinadas pelo PÚBLICO.
O jornalista nunca deve hostilizar o entrevistado,
mas também não deve comportar-se de forma passiva ou subserviente
perante as contradições e inverdades do entrevistado. É condição,
no entanto, que tudo o que se escreva tenha sido levantado directamente
ao interlocutor no decorrer da entrevista.
As interrupções devem ser feitas a propósito
e de forma concisa: para clarificar uma resposta ou uma ideia
ou introduzir um novo tema.
A espontaneidade e a confidência pretendidas
numa entrevista dependerão sempre da preparação prévia do entrevistador
sobre quem se vai entrevistar e o tema da própria entrevista.
A utilização do gravador é uma garantia
e um apoio indispensáveis para o jornalista, especialmente nas
entrevistas de maior fôlego e não para a transcrição burocrática
e integral das declarações do entrevistado. O recurso ao gravador
nunca pode constituir uma alternativa preguiçosa ao registo escrito
das declarações do entrevistado.
O jornalista deverá sempre tomar notas
das principais declarações do entrevistado, mesmo quando utilizar
o gravador, para facilitar a organização do seu trabalho.
A versão escrita da entrevista deve ser
sempre trabalhada pelo próprio jornalista que a fez, mesmo quando
a transcrição do registo magnético for efectuada por outrem.
A revisão do texto escrito das entrevistas
pelos próprios entrevistados só será aceite em condições excepcionais
acordadas com o editor e/ou a Direcção.
3º Sob o ponto de vista narrativo, utiliza-se
o discurso directo (pergunta-resposta) ou indirecto (as perguntas
indirectas aparecem implícitas nas respostas ou no texto do redactor),
segundo opções editoriais previamente determinadas.
Normas práticas:
As entrevistas com perguntas e respostas
obedecem ao seguinte modelo editorial: a entrevista abrirá sempre
com um pequeno texto introdutório (até 400 caracteres) contendo
pormenores de reportagem um pequeno perfil do entrevistado,
condições e local da entrevista, etc. As perguntas são grafadas
a negro, precedidas de PÚBLICO também a negro e com travessão
por extenso e caixa alta quando da primeira pergunta, seguindo-se
depois apenas a letra P a negro, com ponto e travessão (P. ).
As respostas vêm sempre a fino precedidas do nome mais conhecido
do entrevistado, com travessão, por extenso e caixa alta na primeira
resposta e, depois, apenas com a letra R com ponto e travessão
(R. ).
PÚBLICO Ao fim destes dez anos de
presidência, já decidiu recandidatar-se?
NUNO SOUSA Já, e conto oficializar esta minha
decisão para a semana.
P. E quem o apoia?
R. Todos os clubes do meu bairro menos o
meu próprio...
A técnica do pinguepongue prevalecerá
sempre que possível como forma de captar o interesse do leitor:
perguntas breves e rápidas, sem conterem implicitamente a resposta;
mudanças apropriadas no ritmo do diálogo e na passagem dos assuntos,
sem prejuízo da informalidade e da exposição lógica do discurso
do entrevistado.
A informalidade exclui o tratamento por
tu qualquer que seja a circunstância, mas recusa também qualquer
tipo de reverência protocolar, do género "V. Ex.ª",
"Vossa Majestade" ou "Vossa Eminência". Formas
de tratamento (ver Alfabeto do PÚBLICO)
como "senhor Presidente" ou "senhor ministro"
admitem-se excepcionalmente, na primeira pergunta, por exemplo.
O jornalista não deverá fazer observações
pontuais ao comportamento do entrevistado que possam influenciar
a leitura das suas declarações.
As entrevistas escritas em discurso indirecto
devem respeitar as normas anteriormente expostas. Não são admissíveis
pseudo-entrevistas, construídas a partir de um documento ou um
texto escrito pelo entrevistado.
Só em circunstâncias excepcionais o PÚBLICO
publicará entrevistas por escrito e, quando o fizer, mencionará
explicitamente esse facto.
No caso ainda das entrevistas em discurso
indirecto, o "retrato" do entrevistado, os gestos, o
ambiente que o rodeia, as expressões e os pormenores observados
no decurso da entrevista incluir-se-ão ao longo do texto "corrido".
É o caso das conferências de imprensa, cuja cobertura não deve,
por princípio, descurar este tipo de pormenores.
É importante seleccionar e reescrever
sem deturpar. Uma entrevista de uma hora é raramente suportável
"in extenso" duas páginas inteiras do PÚBLICO.
Convém, por isso, estabelecer limites de tempo e cuidar da sua
preparação prévia. Só assim se facilitará o trabalho final de
selecção e reconstrução da entrevista, respeitando-se integralmente
o pensamento do entrevistado. Se prevalecer alguma dúvida sobre
uma declaração ou ideia, deve-se contactar o entrevistado.
6. Os espaços
da opinião
a. Informação e opinião têm espaços claramente demarcados
no PÚBLICO.
b. A opinião em sintonia com a actualidade diária
divide-se em três géneros: o editorial, assinado por um elemento
da Direcção editorial; o comentário, assinado por um director, editor
ou jornalista; e a opinião, assinada por um convidado.
Estes três géneros têm como denominador comum a brevidade
dos textos, a interpretação clara e incisiva dos factos e, naturalmente,
a opinião do autor sobre a matéria em causa. Essa opinião deverá
ser sempre devidamente fundamentada, não se inspirando em razões
exteriores ao objecto do comentário. Não há quaisquer restrições
ao teor das opiniões expressas desde que elas se enquadrem nos preceitos
de isenção ética e rigor de escrita que identificam o estilo do
PÚBLICO. A independência de espírito, a irreverência e o desassombro
polémico são necessários à vitalidade do jornal, mas não é admissível
a utilização de uma linguagem panfletária ou insultuosa.
c. Noutra lógica, mas sem prescindir dos critérios
mínimos de qualidade e actualidade jornalística, o jornal solicita
ou aceita outro tipo de opinião externa, de colaboradores regulares
e/ou ocasionais. Com características mais intemporais ou de tema
livre, esta opinião será paginada em colunas específicas e personalizadas
e/ou editada no Espaço Público.
Salvo casos excepcionais, estes textos de opinião
não devem ultrapassar os cinco mil caracteres. Somos um jornal diário
e tudo o que exceda estas dimensões contraria as mais elementares
regras da legibilidade rápida e fácil.
Os textos de opinião estão também sujeitos ao respeito
pela linguagem não insultuosa e não panfletária a que se obriga
o PÚBLICO. O jornal não procurará expurgar tal linguagem de eventuais
textos que a contenham, preferindo devolvê-los sem os publicar.
Em qualquer caso, toda a intervenção do jornal num texto de opinião
só é admissível com prévia autorização do autor.
d. Os textos de crítica, recensões ou notas sobre
filmes, livros, discos, teatro, exposições e espectáculos em geral
serão introduzidos por uma breve memória descritiva dos objectos
criticados. Esta introdução deverá ser escrita em linguagem jornalística
e acessível ao comum dos leitores.
O crítico deve exprimir com toda a liberdade o seu
ponto de vista, devidamente fundamentado, sobre a(s) obra(s) criticada(s).
Isso não o impede, porém, de fornecer previamente os dados de informação
essenciais sobre a(s) obra(s) que critica.
e. Estão excluídas as "private jokes", o
jargão especializado e os preciosismos académicos.
f. Nas colunas personalizadas dos colaboradores permanentes,
em princípio com periodicidade fixa, ou em testemunhos pessoais
solicitados pelo PÚBLICO, poderá ser utilizada a primeira pessoa
do singular.
g. Os jornalistas, colunistas e colaboradores
permanentes do PÚBLICO não poderão manter polémica entre si, salvo
nos casos antecipadamente acordados com a Direcção.
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