MUSEU NACIONAL E CÍVICO DE S. MATEUS, PISA (ITÁLIA) |
Mestre Francke, de Hamburgo (1380-1430), Natividade |
Jesus
Simone Weil (1909-1943), a filósofa judia que se aproximou do cristianismo, escrevia (Espera de Deus, ed. Assírio & Alvim): “O amor divino atravessou a infinidade do espaço e do tempo para vir de Deus até nós.”
Esta é a afirmação central do Natal: para os cristãos, Jesus Cristo é o próprio Deus que se torna humano, pela palavra. “Nasceu o Verbo eterno sem começo,/ O Criador do homem fez-se homem”, canta um hino da Liturgia das Horas, rezado no Dia de Natal. Uma ideia inspirada no belo poema com que se inicia o Evangelho de S. João (1, 1-2 e 14): “No princípio existia o Verbo; o Verbo estava em Deus;/ e o Verbo era Deus./ No princípio Ele estava em Deus./ E o Verbo fez-se homem/ e veio habitar connosco.” O nascimento de Jesus acontece na fragilidade: entre os mais pobres e para todos. Daí que a narrativa do seu nascimento, segundo S. Lucas, fale dos pastores, desprezados no tempo, e dos magos, estrangeiros que vieram a Belém adorar o Menino.
Em Jesus, é o próprio Deus que nasce frágil. Tal como a humanidade. Escreve o teólogo italiano Domenico Pezzini (O Tesouro e o Barro, ed. Paulinas): “Somos criaturas frágeis, isto é, no sentido etimológico do termo, somos coisas que ‘podem quebrar-se’ e que, de facto, continuamente se partem. (...) É algo que nos marca dolorosamente e que não podemos ignorar. (...) Em nós está a força da criatividade que nos aproxima de Deus, como também está em nós uma radical fragilidade que nos leva à nossa origem e ao nosso destino; pois vimos da terra e a ela voltaremos.”
Pezzini acrescenta: “O que o Natal proclama bem alto e com alegria é que Deus veio até nós através da parte que, em nós, parece mais afastada d’Ele, que parece exactamente o contrário da própria ideia de divindade, a nossa fragilidade.” Mensagem “explosiva”, essa fragilidade torna- se “princípio fundamental” do agir de Jesus, torna-se “caminho de salvação”.
A mensagem que Jesus anunciará retoma, de novo, essa inversão da pirâmide. Os marginais e os estropiados “têm, aos olhos de Deus, tanto valor como os que respeitam escrupulosamente os seus mandamentos, recitam diariamente as suas preces e fazem oferendas ao Templo”, escreve Henri Tincq (Os Génios do Cristianismo, ed. PUBLICO/Gradiva).
Este modo de agir culmina no Sermão da Montanha: “Bemaventurados os pobres de coração, porque é deles o reino de Deus; bem-aventurados os que choram, porque serão consolados; bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados; bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus; bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus; bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque será deles o reino dos céus.” (Evangelho de S. Mateus 5, 3-10).
No livro Em Ti, a Paz do Coração, escreve o irmão Roger, de Taizé: “Jesus, filho da Virgem Maria, no Natal tu ofereces- nos a mensagem de alegria do teu evangelho. Quem escuta, quem acolhe os dons do Espírito Santo, tanto de dia como nas vigílias da noite, descobre que tem tudo, com uma fé bem pequena, com quase nada.”
A FOTO DO DIA
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Todos os dias, neste espaço, é publicada a foto escolhida no âmbito da iniciativa Grande Fotografia de Natal, promovida pelo Millennium BCP. Dia 26, serão publicadas as 3 grandes vencedoras.
O regulamento pode ser consultado aqui ou em www.millenniumbcp.pt. |
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Fotografia: José Pedro Abril Abreu
Data: 16 Dezembro 2005 |
POEMA DE NATAL
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Poema escolhido
por Vasco Graça Moura
e incluído no livro Natal... Natais
– Oito Séculos de Poesia
sobre o Natal, por ele compilado,
a editar pelo PÚBLICO
no próximo dia 14 de Dezembro
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Natal up-to-date
Em vez da consoada há um baile de máscaras
Na filial do Banco erigiu-se um Presépio
Todos estes pastores são jovens tecnocratas
que usarão dominó já na próxima década
Chega o rei do petróleo a fingir de Rei Mago
Chega o rei do barulho e conserva-se mudo
enquanto se não sabe ao certo o resultado
dos que vêm sondar a reacção do público
Nas palhas do curral ocultam microfones
O lajedo em redor é de pedras da lua
Rainhas de beleza hão-de vir de helicóptero
e é provável até que se apresentem nuas
Eis que surge no céu a estrela prometida
Mas é para apontar mais um supermercado
onde se vende pão já transformado em cinza
para que o ritual seja muito mais rápido
Assim a noite passa E passa tão depressa
que a meia-noite em vós nem se demora um pouco
Só Jesus no entanto é que não comparece
Só Jesus afinal não quer nada convosco.
DAVID MOURÃO-FERREIRA |
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