"Enterrei todo o dinheiro que tinha nas estufas"
Adriana Dimas, 42 anos, tenta manter o sorriso, mas o olhar não consegue esconder a amargura pelas partidas que a crise lhe está a pregar. Tinha uma "vida linda", com muito trabalho. Produzia as hortícolas de que gostava em três estufas que comprou no Brejão, Odemira, daquelas que foram deixadas pelo empresário belga Tierry Roussell. Agora é a mulher dos sete ofícios. Até o pão que a família come é ela que o faz. "Estou tentando sobreviver", desabafa uma das poucas mulheres, senão a única, que produzia couves, alfaces e cenouras para uma clientela certa, em lojas e superfícies comerciais.
A "descida aos infernos" começou há quase um ano, quando arrendou cerca de dez hectares de terra junto a uma albufeira que faz parte do sistema de rega de Alqueva.
Instalou as estufas, gastou mais de cinco mil euros em plástico, "já não contando com o gasóleo, electricidade e as plantas". E ficou a aguardar pela água prometida pela Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas de Alqueva (EDIA).
Entretanto, "um senhor do Ambiente" avisou-a de que não podia ter as estufas tão próximas da albufeira, por causa das escorrências que iam contaminar a água. O precioso líquido que deveria estar disponível para rega em Junho passado só chegou em Novembro, "quando já estava com a corda na garganta", relata Adriana Dimas.
Depois dos atrasos na construção das estufas e da chegada da água, o último Inverno foi fértil em chuva e frio intenso e "estragou-se tudo". Não havia outro caminho que não fosse o abandono da actividade.
"Enterrei todo o dinheiro que tinha a montar as estufas." Desmoronou-se o sonho de uma década. Nestas circunstâncias, "uma coisa desajuda a outra", lamenta-se Adriana Dimas, descrevendo o ciclo vicioso que deitou por terra a sua actividade. "Ele é os clientes que pagam tarde e a más horas, porque vendem fiado [e depois] não me pagam a mim e eu não pago aos dos adubos e aos das sementes."
O orçamento já não lhe permite pagar à Segurança Social há precisamente um ano. Tentou receber, no Ministério da Agricultura, o subsídio de gasóleo a que tem direito. "Impediram-me de o levantar porque eu não tenho a Segurança Social paga."
Pressionada pela crise, a família Dimas, que tem um filho com 12 anos, foi à procura de outros trabalhos. O marido, Micael Silva, "regressou aos camiões", de onde saíra para se dedicar à agricultura. Em Outubro sentou-se ao volante de um TIR e passou a transportar fruta para a Noruega, de onde regressa com bacalhau para Espanha. Até ao momento, apenas recebeu meio mês de salário e, mesmo esse, relativo a Outubro.
Adriana foi servir à mesa de um restaurante. "Ganho 550 euros por mês", sensivelmente o que realizava em cada uma das quatro entregas de produtos hortícolas que fazia semanalmente.
O corte no orçamento obrigou-a a um segundo emprego, numa empresa de turismo rural, e a vender fruta no mercado de Aljustrel às sextas-feiras. A dimensão da crise familiar não deixa dúvidas. Mesmo assim, ainda há lugar para a solidariedade. José Gaspar, de 60 anos, que trabalhava com a família, foi acolhido em casa com direito a cama e a um lugar à mesa.