A Colecção
Mil Folhas continua com mais
30 títulos
Depois da primeira série,
a Colecção Mil Folhas prossegue com mais 30 volumes
da literatura contemporânea. No dia 30 de Dezembro, segunda-feira,
quem comprar o 30º título - "A Metamorfose",
de Franz Kafka - terá grátis o número 31, "Fanny
Owen", de Agustina Bessa-Luís. Os outros livros serão
distribuídos, como habitualmente, às quartas-feiras.
Terça-feira,
11 de Junho de 2002 Mais de 90
mil exemplares nas bancas "O Outono do Patriarca"
Amanhã à Venda com o PÚBLICO Clara Viana
O mundo de um ditador eterno, escrito
num monólogo a várias vozes pelo colombiano
Garcia Márquez
O general de "O Outono do Patriarca"
- publicado pela primeira vez em 1975 e que será
vendido amanhã com o PÚBLICO - começou
a ser perseguido pelo colombiano Gabriel Garcia Márquez
em 1958. Era ainda então "uma narrativa conformista
e linear, na terceira pessoa" sobre um ditador imaginário
das Caraíbas, que sofreu o primeiro assalto na
Cuba recém-saída da revolução,
quando o escritor, e mais tarde Prémio Nobel da
Literatura, no seu papel de jornalista, assistiu ao julgamento
de um outro general num estádio sobrelotado. Garcia
Márquez soube então que se impunha escrever
de outro modo o mundo do seu ditador eterno. Mas isso
foi antes de ter sido "tomado de assalto pelo cataclismo
de Cem Anos de Solidão".
O general teria, assim, de esperar
vários anos mais para entregar o mar do seu país
aos gringos. Filho bastardo de uma criadora de pássaros,
que se quis a si próprio concebido pela graça
divina, que se fez Messias, aclamado pelo povo, e atacado
pelo "vício solitário do poder"
até o seu próprio compadre serviu ao jantar,
o corpo recheado de pinhões e ervas aromáticas.
Mas a ele doía-lhe tão-só
aquela "inconcebível maldade do coração
com que vendeu o mar a uma potência estrangeira
e nos condenou a viver defronte desta planura sem horizonte
de áspero pó lunar", como contam os
que descobriram o seu cadáver. Numa altura em que
o seu poder ganhara já uma existência distinta
da do velho que percorria sozinho o palácio presidencial,
deixado por conta de vacas, galinhas e cães.
Sete anos de escrita
Muito tempo antes desse longuíssimo Outono em que
foi apanhado pela morte numa idade incerta entre os 107
e os 232 anos, a sua mãe Bendición Alvarado,
vendo-o, pela primeira vez, de "uniforme de cerimónia
com as medalhas de ouro e as luvas de cetim que continuou
a usar durante o resto da vida", exclamou "que
se eu soubesse que o meu filho vinha a ser presidente
da República tinha-o mandado à escola".
Foi um hipotético pai de cinco
mil filhos, todos nascidos de sete meses, dono de umas
mãos sem mácula de linhas nas palmas, de
uns enormes pés chatos e de um também descomunal
testículo que lhe encharcou de dor toda a sua longa
vida, e cuja segunda morte foi saudada com música,
foguetes e sinos, anunciando ao mundo "a boa nova
de que o tempo incontável da eternidade tinha finalmente
acabado".
Ao fim de sete anos de escrita, Garcia
Márquez alcançara o que se tinha proposto
e que ensaiara em vários contos escritos com o
fito de não repetir a sua obra mais aplaudida,
"Cem Anos de Solidão". Como ele próprio
confessou sobre este seu livro: "O mais difícil
não foi escrevê-lo, mas sim tirá-lo
de cima de mim."