A Colecção
Mil Folhas continua com mais
30 títulos
Depois da primeira série,
a Colecção Mil Folhas prossegue com mais 30 volumes
da literatura contemporânea. No dia 30 de Dezembro, segunda-feira,
quem comprar o 30º título - "A Metamorfose",
de Franz Kafka - terá grátis o número 31, "Fanny
Owen", de Agustina Bessa-Luís. Os outros livros serão
distribuídos, como habitualmente, às quartas-feiras.
Dois jornais, um italiano, outro português,
numa iniciativa mais que louvável, propõem
ao seu público habitual uma escolha de livros já
clássicos ou aspirando a sê-lo. Como não
são explícitos quaisquer critérios
dessa escolha - por impossíveis ou inúteis
-, os autores apadrinhados por esses jornais são,
mais do que escolhidos, "eleitos". No fundo, é
bom que assim seja. O arbítrio da eleição,
com o seu quê de divino, é menos pretensioso
que o de uma escolha que, ao fim e ao cabo, nada justifica
se não o arbítrio também divino dessa
eleição.
Pertencem os 30 livros que o PÚBLICO
destina aos seus leitores àquela constelação
ideal que um famoso crítico dos anos 30, Charles
du Bos, chamava o "céu das estrelas fixas"?.
Recentemente um aerópago de críticos designou
o "D. Quixote" como a maior novela (romance) do
mundo. Teria feito melhor se a designasse como "a mãe
de todas as novelas", ao menos para o Ocidente, não
tanto por ser o livro imortal que é, como por ser
a primeira novela que se sabe novela, ficção
de ficções e matriz ideal de todas as que
até hoje recorrentemente reinventam o que teve começo
sem ter fim ("Gulliver", Flaubert, Gogol, Joyce).
Vendo bem, numa cultura há só "um"
livro, mas cada livro que merece esse nome é também
"todos os livros". A esse título e com
menor obsessão de hierarquias celestes, à
Charles du Bos, os livros propostos são, no seu género,
estrelas fixas e, como as verdadeiras, em constante deriva
e metamorfose nos céus mais que abertos da literatura.
Nestas escolhas-eleições
o que interpela não é o ou os livros oferecidos
ao apetite do leitor. Muitos fazem parte já das suas
leituras. Para quem "A Metamorfose" será
ainda uma imprevista novidade? Mais se repara nos que não
estão lá, alheios ou nossos. Quem pode resignar-se
a não ver entre os eleitos o autor de "Lord
Jim"? E entre as eleitas, a autora de "Sibila"?
Mas tudo é reparável. O essencial é
que o gosto dos livros agora descobertos - e sobretudo entre
nós, onde pouco se lê - tragam na sua esteira
o oceano dos livros que não conhecemos e tanto nos
faltam, até para saborear de outra maneira aqueles
que agora chegam à nossa mesa.