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Pedro Terrinha, geólogo, 50 anos
Como geólogo, Pedro Terrinha tem perseguido um enigma com mais de 250 anos: onde se gerou o terramoto de 1755, com uma magnitude estimada de 8,5, que deitou abaixo Lisboa e a engoliu num tsunami? A Europa dessa época ficou tão impressionada com a destruição da capital de um império por uma catástrofe natural que Voltaire até mencionou o terramoto na obra Cândido, pondo o protagonista a chegar a Lisboa na manhã em que tudo aconteceu.
"Gostaria mesmo de contribuir para os conhecimentos da origem da sismicidade na zona entre Portugal, Marrocos e os Açores, onde se geram grandes sismos e tsunamis, que varrem o Atlântico de um lado ao outro, como o de 1755", diz o geólogo do Laboratório Nacional de Energia e Geologia e do Instituto D. Luiz, em Lisboa. Por coincidência, o cenário da conversa fica perto de uma das principais marcas do terramoto de 1755 que perduraram em Lisboa, as ruínas da igreja do Convento do Carmo, e relembram a todos o poder dos sismos.
A zona no mar onde se têm originado estes sismos (de que o de 1969, com magnitude entre 7,3 e 7,8, é outro exemplo dos que têm atingido Portugal) tem uma grande complexidade, situando-se na fronteira das placas africana, euroasiática e americana. Não só a fronteira das placas africana e euroasiática é mal conhecida, como existem ali diversas falhas tectónicas que podem estar na origem desses sismos, algumas descobertas apenas na última década pela equipa em que se insere Pedro Terrinha.
É fácil ver os benefícios para a sociedade do conhecimento da geologia da zona onde, algures, ocorrem sismos grandes como o de 1755: "Pode-se compreender melhor a origem dos sismos, a sua magnitude e frequência e os seus efeitos nas zonas populacionais." E como estes grandes sismos têm origem no mar, acrescenta o geólogo, podem-se encontrar maneiras de alertar para os tsunamis que podem gerar.
A causa dos sismos nesta região do mar pode estar relacionada com uma questão em aberto na geologia, mais teórica: como começa o fenómeno da subducção oceânica, em que uma placa mergulha debaixo de outra? Se olharmos globalmente para o planeta, vemos zonas em que nasce crosta e as placas se vão afastando e zonas em que as placas se enfiam por baixo de outras e são destruídas. A crosta terrestre está sempre a ser criada num lado e destruída noutro.
No meio do Atlântico, tem estado a formar-se crosta nova. Chegará o dia em que, algures nas margens dos continentes banhados pelo Atlântico, uma placa começará a ser destruída por baixo de outra. Há cientistas que consideram que as estruturas tectónicas que têm sido localizadas na zona onde nasceu o sismo de 1755 podem ser interpretadas como o início da subducção no Atlântico. Por essa razão, este é um dos pontos de interesse no planeta para desvendar o enigma sobre o início deste fenómeno.
"Segundo as contas, as placas litosféricas são resistentes demais para se partirem e começar a subducção. Contudo, ela existe. É um paradoxo", diz Pedro Terrinha. Ajudar a desvendá-lo faz parte dos seus sonhos como cientista. "Perceber o início da subducção oceânica é uma questão conceptual das geociências. Seria um grande contributo para o paradigma filosófico da tectónica das placas."
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