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“Dizem que ele é trombudo, afinal, ri-se o tempo todo!”

14.05.2010 - 13:01 Por Ana Cristina Pereira

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Talvez não seja preciso entendê-lo para gostar dele. Talvez baste vê-lo como “uma mancha dourada no meio de uma mancha branca”.

Uma mulher passa as lojas da Praceta de Santo António em revista – à cata de uma “lembrancinha” em conta. “Está a ser melhor do que na televisão”, comenta, com o rosto virado para trás. Segue-a o marido, costas dobradas, boné enterrado na cabeça, não vá ela abrir os cordões à bolsa em tempo de crise: “Dizem que ele é trombudo, afinal, ri-se o tempo todo!”

“Ele” é Bento XVI, que o casal da Maia acabara de ver, no Santuário de Fátima. A sua popularidade parece ter crescido por estes dias – embora o antecessor, João Paulo II, continue na boca de qualquer um a quem, neste 13 de Maio, se pergunte pelo Papa. E nem é preciso perguntar. Basta ouvir as impressões trocadas depois da missa – ou durante: enquanto ele faz a homilia e a homilia ecoa numa das maiores lojas de recordações da cidade.

- Você acha que ele faz isto sozinho ou alguém o ajuda?

- Alguém ajuda. Está tão velhinho!

- O Miguel viu-o em Lisboa e disse: ‘Tenho de ir lá!’

- É. As pessoas ficaram com mais carinho.

Os lojistas não estavam preparados para esse aumento de capital simbólico: feita a análise de risco, poucos encomendaram produtos com o rosto de Joseph Alois Ratzinger. “A imagem de Fátima vende este ano, para o ano, daqui a dez anos – o Papa é agora e depois passa”, explicava a comerciante Maria José, numa loja sem nome, virada para ao Museu de Arte Sacra. Aqui e ali, um terço, uma moldura, um chaveiro, uma pulseira ou um lenço do adeus.

Muitos viriam, com ele ou sem ele. Maria Fernanda Pimenta proclamava-o junto à camioneta que a trouxera de Aveiro: “A minha fé é em Nossa Senhora – gosto tanto dela!” O marido ficou em casa: “Ele dá-me ordem para eu fazer o que eu quero.” E ela veio com os pais. Sobra experiência à mãe: “Ainda sou do tempo de vir, três dias a pé, com a cesta à cabeça!”

As cestas foram substituídas pelas geleiras e os termos. Não faltam peregrinos assíduos a circular nestas ruas. Um comia sentado na bagageira da camioneta que trouxera Fernanda e a mãe. Duarte Crêoulo já aqui veio 36 vezes a pé e três de carro: “Tomo dez comprimidos por dia. Hoje não quero tomar nenhum! Estou num lugar sagrado.”

Parece haver aqui qualquer coisa de viciante para alguns. Adolfo Mesquita e uns amigos já combinavam voltar domingo: “Vamos ao Estádio do Jamor ver o Chaves jogar com o F.C. Porto; se o Chaves ganhar, passamos por aqui.” Vem cá “três ou quatro vezes por ano”. “Sinto-me bem aqui dentro – não sei explicar.”

Não fora essa sensação inexplicável, Glória Fernandes não voltaria saciada para o seu lar distante. Viu Bento XVI lá ao longe. E, lá ao longe, Bento XVI era “uma mancha dourada no meio de uma mancha branca”. O marido não ficou com uma imagem tão poética: “Ninguém entende o Papa! Aquilo é português?’” A mulher retoma a palavra, sem tirar os olhos do marido, que com ela saíra de Fafe às cinco da manhã, como se lhe pedisse autorização: “Já gostava dele e agora gosto mais.”

Para alguns, não é preciso entender. Duas primas, da Póvoa de Varzim, que comiam uma sopita feita no parque de campismo que não é parque de campismo – é zona ajardinada entre parques de estacionamento – provavam isso mesmo . “O Papa? É bonito! Por acaso, é bonito”, comentava a mais velha, Alexandrina Gabriel, rapariga para 78 anos, menos cinco do que o Papa. Esteve desde as 7h30 a guardar lugar para a missa das 10h00 – perto do altar. Percebeu o que ele disse? “Percebi tudo. Falou de Portugal, dos países. Não foi mais fraco do que o outro.”