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  A Fretilim foi o único partido a aventurar-se a fazer um comício no Estádio Municipal de Díli
 
   
   
 

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Fretilin mostra a sua força no encerramento da campanha
Por Luciano Alvarez, em Díli
Quarta-feira, 29 de Agosto de 2001

Milhares de pessoas invadiram ontem Díli para o comício-festa de encerramento da campanha da Fretilin. Uma oportunidade para os dirigentes do partido repetirem a certeza de que vão ter 85 por cento dos votos. Hoje é dia de reflexão; amanhã Timor-Leste realiza a sua primeira eleição democrática.

A Fretilin tinha prometido deixar claro o apoio popular de que goza, e fê-lo ontem. No seu comício de encerramento, em Díli, juntou um número de apoiantes nunca visto na campanha eleitoral que ontem terminou. "Mais de 50 mil pessoas", asseguram. Talvez não tenham sido tantos, mas foram de facto muitos milhares os que coloriram Díli com as cores do partido e que quase encheram o estádio da capital de Timor-Leste. Uma manifestação pacífica que levou os seus dirigentes a voltar a afirmar a certeza de que vão ganhar com "pelo menos 85 por cento" dos votos - e a dizer que, se conseguirem "apenas 51 por cento", consideram que saem derrotados das eleições de amanhã.

Na noite de segunda-feira, já havia caravanas automóveis pelas ruas de Díli. Às primeiras horas da manhã de ontem, as ruas encheram-se com os carros e camiões da Fretilin que, vindos um pouco de todo o país, entravam pela cidade, proporcionando uma manifestação nunca vista. Todos os caminhos iam dar ao estádio de Díli. A polícia da ONU montou uma forte operação de segurança e, quando pelas duas da tarde se iniciou a festa, as ruas ficaram quase vazias de timorenses.

Uma multidão imensa. Bandeiras, cartazes anunciando a presença de quase todos os 13 distritos de Timor-Leste. Centenas de pessoas pintadas com as cores do partido. Um palco enorme por onde passaram as principais vedetas da canção timorense. Danças populares e até uma imitação de um rancho folclórico português, dançando ao som de "O meu burrito". Foi uma festa como ainda não tinha sido visto nas seis semanas da campanha eleitoral para as eleições da Assembleia Constituinte.

A Fretilin fez a festa, mas, como ao longo de toda a campanha, não se esqueceu de lembrar também a sua história de resistência. Lá estavam as "t-shirts" com as caras dos seus principais heróis mortos em combate. Os cartazes com os seus nomes. As lágrimas nos olhos de muitos quando, a uma só voz, cantaram o hino das Falintil, ou quando os seus dirigentes lembraram o "sangue derramado", ou "os corpos que nunca apareceram."

"Alguns partidos dizem que a Fretilin só fala na sua história, no seu passado. Pois fala, e continuará a falar porque a Fretilin tem passado. Um passado que não quer esquecer", afirmou Lu-Olo, o presidente do partido.

Xanana recebido com pouco entusiasmo
Xanana Gusmão também por lá passou. Foi aplaudido pela maioria, mas de forma pouco entusiasmada. Na meia-hora em que Xanana esteve presente, houve vivas à Fretilin, às Falintil, ao povo, "ao camarada presidente e ao camarada secretário geral" (Mari Alkatiri), mas nunca ao líder histórico da resistência, apesar de a Fretilin já ter anunciado que apoia a sua candidatura à presidência.

Xanana, ao contrário de que aconteceu nos comícios de todos os outros partidos, não discursou. Limitou-se a tirar dezenas de fotos.

"Xanana não anunciou que vinha cá e por isso não incluímos o seu discurso no programa. Poderia não querer falar e nós não queríamos causar-lhe qualquer embaraço", explicou Lu-Olo.

Mari Alkatiri afirmou no seu discurso que Xanana "não precisa de falar nos comícios da Fretilin". "Nos outros, sim, para lhes ensinar a democracia. Aqui não é preciso. Aqui não precisamos das palavras de Xanana", acrescentou.

A tónica forte dos dois principais dirigentes da Fretilin foi, contudo, mais uma vez os resultados eleitorais. "Já ganhámos", anunciou Mari Alkatiri, voltando a assegurar que "os 85 por cento estão garantidos". E se não for assim? E se a Fretilin não tiver a maioria? "Isso é impossível", respondeu Lu-Olo aos jornalistas. "Se tivermos 51 por cento consideramos que isso é uma derrota", acrescentou.

No entanto, ambos garantem que aceitam qualquer resultado e que, independentemente das percentagens que cada partido alcance, vão "dialogar com todos". "Mesmo que tenhamos 100 por cento dos votos, o que não é impossível, vamos ouvir todos. Os partidos, a igreja todos. Não se assustem com a Constituição que vai ser feita, mesmo com 100 por cento vamos consultar toda a gente."

A Fretilin diz ainda estar disposta a formar um "governo de inclusão", embora já tenha recusado formar um governo de unidade nacional. "Admitimos ter pessoas de outros partidos no nosso Governo, mas não será um Governo de coligação de partidos. Será um Governo de talentos", lembrou mais uma vez Mari Alkatiri.

O número dois da Fretilin, que traduziu parte do seu discurso para português, afirmando que essa será a língua nacional de Timor-Leste independente, pediu ainda aos seus militantes para "não terem medo de sair de casa no dia das eleições": "Ao contrário do que alguns dizem, não vai haver violência."

Já no final, a frase usada por alguns dirigentes do partido durante a campanha, que afirmaram que depois da vitória iriam "varrer Timor", foi motivo para Alkatiri voltar a gracejar: "Vamos ganhar, disso não há dúvida. E no dia 31 vamos todos sair à rua para fazer uma grande limpeza na cidade. Vamos plantar flores e plantas, vamos cuidar do ambiente."

A festa prolongou-se ao longo da noite pela capital, com a Fretilin a cantar vitória pelas ruas e com os seus apoiantes a gritarem a frase escrita nas camisolas de campanha do partido: "Fretilin 100 por cento." É esta a percentagem que os dirigentes do partido continuam a dizer ter como objectivo nas eleições de amanhã.



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