Irlanda
do Norte: A fé e fogo
O conflito na Irlanda do Norte tem tido altos
e baixos, entre ataques bombistas e assassínios,
compromissos de paz e cessar-fogos, conversações
e promessas de desarmamento. Após um período
de relativa acalmia, o processo voltou a conhecer
um revés. Mais uma vez, a paz real parece
adiada para data incerta.
A Irlanda do Norte debate-se há mais de
30 anos com o conflito que opõe a maioria
protestante e a minoria católica e que já
causou a morte a cerca de 3600 pessoas. A demora
do Exército Republicano Irlandês (IRA)
em proceder ao desarmamento e a suspensão
da curta coligação governamental gerou
um novo impasse no processo de paz. O Reino Unido
voltou a exercer o domínio directo sobre
a província e o clima é de tensão
constante.
O Governo britânico suspendeu, na noite de
dia 11 de Fevereiro, a coligação católico-protestante
(ou republicano-unionista) que governava, há
nove semanas, de forma semi-autónoma, a Irlanda
do Norte.
O Reino Unido voltou a decretar o domínio
directo sobre o Ulster - imposto pela primeira vez
em 1972 -, porque considerou que a promessa de desarmamento
do IRA não estava a ter "suficientes
progressos", já que este se recusava
a avançar qualquer prazo concreto para proceder
à entrega das armas.
O anúncio da suspensão da coligação
governamental foi feito pelo ministro britânico
para a Irlanda do Norte, Peter Mandelson, ao qual
o Sinn Fein, braço político do IRA,
ainda tentou contrapor uma proposta sobre o desarmamento,
para salvar o processo de paz - afirmando que a
entrega unilateral das armas anularia a razão
de existir do IRA -, mas o Governo britânico
não voltou atrás.
Perante esta decisão, o líder do Sinn
Fein, Gerry Adams, acusou Londres de trair o acordo
de paz histórico de Sexta-feira Santa, assinado
em Abril de 1998 e aprovado, em referendo, pela
população da Irlanda do Norte, ao
suspender o Governo de coligação entre
os partidos católico-republicanos, Sinn Fein
e Partido Social-Democrata e Trabalhista (SDLP),
e os partidos protestante-unionistas, Partido Unionista
do Ulster (UUP) e Partido Democrático do
Ulster (UDP).
Por seu lado, o líder do UUP, David Trimble,
ameaçou deixar o cargo de primeiro-ministro
da coligação se o Governo britânico
não congelasse a assembleia enquanto não
se resolvesse a questão do desarmamento.
"Não podemos ter paz, nem qualquer tipo
de democracia, com exércitos privados activos",
sublinhou.
Passados dois dias da suspensão, existiam
sinais de que o IRA poderia avançar para
o desarmamento. Apesar disso, Londres manteve a
decisão de suspender as instituições
autónomas da Irlanda do Norte.
Na passada terça-feira, o processo conheceu
mais um revés, quando o IRA rompeu os contactos
com a Comissão Internacional para o Desarmamento
no Ulster - liderada pelo general canadiano John
de Chastelain e criada em 1995 - em reacção
à suspensão da assembleia. O IRA responsabilizou
o Governo britânico, na pessoa de Peter Mandelson,
e os unionistas protestantes pelo impasse do processo
de paz.
Peter Mandelson mostrou-se "desapontado"
com a decisão do IRA de abandonar as negociações
para o desarmamento. Esta situação
conduziu a uma reunião de emergência
em Londres, na residência oficial do primeiro-ministro,
Tony Blair.
As delegações do Sinn Fein e do UUP
recusaram sentar-se à mesma mesa e foram
recebidas separadamente por Tony Blair e pelo primeiro-ministro
irlandês, Bertie Ahern. Da reunião
não resultou qualquer avanço significativo
e as duas forças políticas continuam
a culpar-se mutuamente pelo congelamento do processo
de paz.
O UUP diz que só continua as negociações
se o IRA depuser as armas definitivamente. O IRA
diz que só desarma quando as instituições
autónomas da Irlanda do Norte voltarem a
funcionar, acusando o Reino Unido de contribuir
para um "vazio político" e alertando
para o possível regresso das acções
terroristas.
Sofia Branco
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