1984
George Orwell



 

Uma sátira lida como uma profecia
Por Clara Barata


Já se gastaram caudalosos livros de tinta sobre "1984", sobre o seu significado e a forma como este romance de George Orwell lançou críticas mordazes aos intelectuais da esquerda europeia no período que marcou o início da Guerra Fria, que dividiu o mundo em dois blocos até final dos anos 80.

Afinal, Orwell foi ele próprio socialista, participou na Guerra Civil de Espanha e viveu por dentro as rivalidades destruidoras que dividiram as forças de esquerda na guerra que dividiu Espanha entre 1936 e 1939. Isso fez com que o livro se tornasse um símbolo, brandido sobretudo pelos opositores do comunismo. Tornou-se um "best-seller", compreendido com maior ou menor subtileza, consoante os leitores.

O romance foi lançado em 1949 e interpretado, geralmente, como uma leitura de tendências assustadoras que se revelavam na sociedade da época e que podiam, ou não, concretizar-se daquela forma num futuro próximo. Foi também encarado por alguns críticos como uma sátira, ao jeito feroz do também britânico Jonathan Swift (de "As Viagens de Gulliver", entre outras obras), sobre a corrupção do poder.

Mas houve quem visse em "1984" um insulto contra a União Soviética e contra isso se levantou. Outros encararam a obra como uma denúncia, uma profecia de um homem de esquerda inglês que tinha revisto as suas convicções. Era isso que diziam, na altura do lançamento do livro, a revista "The Economist" (britânica) ou as norte-americanas "Time" e "Life", bem como o "The Wall Street Journal", de Nova Iorque.

George Orwell acabou por se agastar com estas interpretações e teve que vir a público explicar que "1984" era uma sátira, e não uma profecia. O seu objectivo era falar sobre a lógica de preparação de um confronto entre a Rússia e o Ocidente, que estava a tornar as sociedades totalitárias e autistas uma em relação à outra.

O escritor, no entanto, não teve assim tanto tempo para discutir a sua obra: morreu em 1950, um ano após a publicação de "1984".