Uma
história real
Por Marco Vaza
A história de Pauline Parker e Juliet Hulme não
acabou na altura em que termina o filme de Peter Jackson e o que
se passou a seguir poderia facilmente dar origem a uma sequela.
Após o julgamento, as duas raparigas, que só não
foram condenadas à pena de morte porque não tinham
idade, foram enviadas para prisões diferentes e não
se voltou a ouvir falar delas. Soube-se apenas que Pauline, que
foi quem desferiu o golpe fatal em Honora Parker, tentou o suicídio
antes de cumprir cinco anos de prisão, e que Juliet regressou
a Inglaterra também depois de cinco anos na prisão
– foram libertadas com a condição de não
voltarem a ver-se. Durante 40 anos, o paradeiro das duas raparigas
foi desconhecido. Depois, em 1994, “Amizade sem Limites”
estreou e descobriu-se que Juliet Hulme tinha assumindo a identidade
de Anne Perry, uma escritora que ganhou fama e fortuna a escrever
romances policiais. Perry, que diz nunca ter visto o filme de Jackson,
admitiu o seu passado mas nunca comentou muito o assunto, salvo
raras excepções, como a entrevista em Novembro do
ano passado ao diário inglês “Daily Telegraph”.
“Fiz os possíveis para esquecer”, conta Perry,
que recusa ser identificada com a pessoa que era aos 15 anos. “Eu
sou Anne Perry. Penso em mim como Anne Perry. Não tenho outro
remédio.” Meio século depois dos acontecimentos
de Christchurch, Anne/Juliet recorda com algum distanciamento a
sua relação com Pauline: “Era apenas mais uma
das amigas. Ela adorava estar na minha casa, perto do estilo de
vida da minha família.” Procura também minimizar
o seu envolvimento no crime que vitimou Honora Parker, encontrada
encharcada em sangue depois de ter sido espancada até à
morte com 45 golpes de um tijolo enrolado numa meia. Diz que se
sentia em dívida para com Pauline, por esta ter estado ao
seu lado enquanto convalescia de uma tuberculose – “Não
tenho problemas em admitir que, por uma vez, cedi à pressão
de fazer algo errado e coloquei a lealdade em primeiro lugar”.
Os diários de Pauline insinuavam que as duas seriam amantes,
uma dimensão da relação bastante explícita
no filme de Peter Jackson. Anne Perry nega: “A nossa amizade
nunca teve uma conotação sexual. Estávamos
nos anos 50. Eu era ingénua em relação a muitas
coisas, mas tenho a certeza que não éramos amantes.”
Quanto ao destino de Pauline, que saiu da prisão duas semanas
depois de Juliet, permaneceu um mistério durante mais alguns
anos, até ter sido descoberta em Kent a viver como Hilary
Nathan, professora numa escola de equitação para raparigas.
Apesar de as duas mulheres – que nunca casaram ou tiveram
filhos – viverem no mesmo país, não voltaram
a encontrar-se, e é provável que tal nunca venha a
acontecer. Hilary/ Pauline, nunca aceitou falar sobre o seu passado,
mas Anne/ Juliet diz que não quer rever a amiga: “Voltar
a encontrá-la seria o meu pior pesadelo.”
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