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  Pastrana consagrou parte do seu mandato a procurar a paz com os rebeldes das FARC
 

Pastrana: um mandato em busca da paz
Por Tiago Tibúrcio
Segunda-feira, 14 de Janeiro de 2002

Andres Pastrana, do Partido Conservador, chegou ao poder em 1998, quatro anos depois de ter sido derrotado nas eleições pelo liberal Samper.
Logo no primeiro ano da sua governação, Pastrana iniciou um ambicioso processo de negociações com o principal grupo guerrilheiro, as FARC. A pedra de toque para o início das conversações foi a criação de uma gigantesca zona desmilitarizada com cerca de 42 mil quilómetros quadrados (aproximadamente o tamanho da Suíça), que ficou, na prática, sob o controlo das FARC. Esta área compreende os municípios de San Vicente del Caguán, La Macarena, Vista Hermosa, Mesetas e Uribe. A concessão deste espaço - fortemente contestada pelo Exército, paramilitares e Estados Unidos - era suposto fomentar o processo de paz, servindo como um local onde os guerrilheiros pudessem reunir-se, sem receios de ataques, com o Governo.

A zona desmilitarizada, no estado colombiano de Caquetá (a sul de Bogotá), tornou-se porém num autêntico campo de treino militar da guerrilha. Segundo os serviços de segurança colombianos e organizações humanitárias, os guerrilheiros das FARC serviram-se do espaço para intensificar a exportação de droga, tráfico de armas e lançar ofensivas e operações de sequestro.

A reacção das forças governamentais foi apertar o controlo nos acessos à zona desmilitarizada, revistando os carros que pretendiam entrar ou sair do espaço e realizando emboscadas a colunas da guerrilha que saíam para qualquer operação.

A detenção de membros do IRA (Exército Republicano Irlandês), que tinham vindo dar treino sobre explosivos e guerrilha urbana a membros das FARC, levou o Governo a apertar as medidas de controlo e a proibir a entrada de estrangeiros na área desmilitarizada.

Protestando contra estas restrições, as FARC abandonaram as conversações com o Governo, dizendo que só voltariam quando estas medidas fossem levantadas. A pretensão das FARC não foi atendida.


O Plano Colômbia


Paralelamente, o Governo de Bogotá, a braços com uma grave crise económica, apresentou à comunidade internacional um programa de apoio ao processo de paz, o controverso Plano Colômbia, no âmbito do qual os Estados Unidos concederam uma ajuda, essencialmente militar, de 1,3 mil milhões de dólares. Num primeiro momento, o Congresso norte-americano condicionou a ajuda ao cumprimento de uma série de condições em matéria de direitos humanos, bem como ao fim das relações entre as forças governamentais e os paramilitares. Todavia, em Agosto de 2000, o Presidente Clinton suprimiu estas condições, invocando o interesse nacional dos Estados Unidos.
Este plano foi fortemente contestado pelos mais diversos sectores políticos nacionais e internacionais. Muitos alertaram que o plano constituía uma ameaça ao processo de paz, nomeadamente pelo perigo do agravamento do conflito armado e das violações dos direitos humanos. Outros viram na ajuda norte-americana reminiscências da ingerência dos Estados Unidos na América Latina nos anos 70 e 80 e que, mais do que o combate ao narcotráfico (o argumento invocado pelos EUA para concederem a ajuda) estava em causa a eliminação de todas as tentativas da esquerda chegar ao poder na América Latina.

Outros membros da comunidade internacional, nomeadamente a União Europeia, continuaram empenhados no apoio ao processo de paz, mas demarcando-se sempre do Plano Colômbia, de que diziam ser independentes.
A Administração de Pastrana remeteu para segundo plano o outro grupo rebelde, o Exército de Libertação Nacional (ELN), assumindo que este seguiria o acordo a que o Governo eventualmente chegasse com as FARC. Em Maio de 2000, Pastrana anunciou a desmilitarização de um enclave, a sul da capital, para iniciar o diálogo com o ELN. Esta tentativa viria a frustrar-se, devido à oposição de uma parte das populações da região, em grande medida devido à pressão exercida pelos paramilitares.

O crescimento espectacular dos paramilitares de extrema-direita, unidos desde 1997 sob o guarda-chuva das AUC (Autodefesas Unidas da Colômbia), cuja acção realizou-se demasiadas vezes com a complacência das forças colombianas, foi outras das marcas do mandato de Pastrana.

Quase quatro anos volvidos sobre o início das conversações, nenhum acordo de paz foi alcançado. Durante estes anos, as FARC conseguiram reforçar as suas fileiras, contando actualmente com cerca de 20 mil homens, e as forças governamentais (hoje com cerca de 150 mil soldados) passaram a dispor - graças à ajuda militar dos EUA - de meios de intervenção aéreos, que lhes permitiu inverter uma série de derrotas às mãos das FARC.

O Exército colombiano, que sempre se opôs à criação da zona desmilitarizada, pressiona o Governo a ocupá-la, dizendo que pode expulsar de lá as FARC num espaço de horas.

De acordo com vários analistas, a verdade é que nenhuma das partes está em condições de derrotar a outra. Se o Governo ou as FARC abandonarem definitivamente a via das negociações, será o fim do processo de paz iniciado em 1998. Assim sendo, e afastado o cenário de uma vitória total de um dos lados, o conflito promete prolongar-se por muito mais tempo.

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