“O Retrato de Dorian
Gray”, de Oscar Wilde
Romance fascinante sobre a imortalidade,
a perfeição, a juventude eterna e outras impossibilidades
Por Lucinda Canelas
Num luxuoso atelier, Basil Hallward, um reconhecido
pintor, e Lord Henry Wotton, um homem com um especial apreço
pela ironia, conversam sobre um retrato. Lord Henry exige
a Basil que exponha aquela que considera ser a sua obra-prima.
O pintor recusa-se e diz que pôs no quadro demasiado
de si mesmo. “Todo o retrato pintado com sentimento
é um retrato do artista e não do modelo.”
“O Retrato de Dorian Gray”, uma
das obras mais aclamadas do controverso Oscar Wilde, o próximo
livro da Colecção Mil Folhas, é muito
mais do que um romance. Wilde, exímio contador de histórias
e observador mordaz, fez da obra um “tratado”
sobre a relação entre a arte e a vida, colocando
a primeira acima de todas as coisas.
Publicado em 1890 – com uma segunda
edição do ano seguinte, a que o escritor acrescentou
seis novos capítulos e um prefácio –,
“O Retrato de Dorian Gray” chocou a hipócrita
sociedade vitoriana que viu nele um espelho dos seus defeitos,
alheio àquelas que considerava serem as suas virtudes.
A crítica apressou-se a envolver o
romance num escândalo que passou de literário
a social quando a relação de Wilde com o Lord
Alfred Douglas se tornou pública (em 1891).
No prefácio à segunda edição,
Wilde distancia-se da polémica (“Não existem
livros morais ou imorais. Os livros são mal ou bem
escritos. É tudo”) e desencoraja os que procuravam
encontrar no seu ciclo de amizades as figuras inspiradoras
das suas personagens: “O que a arte espelha realmente
é o espectador e não a vida.”
Obcecado pela beleza dionisíaca do
jovem Dorian Gray, que conhece numa festa da alta-sociedade
londrina em casa de Lady Agatha, Basil Hallward faz dele seu
modelo. Nas várias sessões em que Dorian pousa
para Basil desenvolve-se entre os dois uma amizade que coloca
o artista numa posição de extrema fragilidade.
Basil está fascinado pelo perturbador Dorian que, por
sua vez, se deixa envolver pelo olhar cínico e irónico
de Lord Henry Wotton, o mesmo que define a beleza como uma
forma de génio.
Confrontado com a beleza do seu retrato e a
impossibilidade de a manter para sempre, Dorian promete a
sua alma em troca da juventude eterna. Ao longo do romance,
o quadro passa de retrato a duplo de Dorian, já que
nele se inscrevem todas as marcas que o tempo e o comportamento
deviam deixar no homem – é o retrato que envelhece,
enquanto Dorian conserva os traços perfeitos que Basil
inicialmente fixou.
Romance gótico ou comédia de
costumes, “O Retrato de Dorian Gray” é
uma obra em que Oscar Wilde confronta o leitor com a perfeição
impossível, as convenções dispensáveis
ou a mortalidade inevitável. Sempre com um tom provocador.
“Toda a arte é inútil.”
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