Dona Flor e seus
Dois Maridos
Jorge Amado



 

Terça-feira, 18 de Junho de 2002
"Dona Flor e Seus Dois Maridos", de Jorge Amado, Amanhã nas Bancas
Por Bárbara Simões

Amanhã volta a ser dia do livro no PÚBLICO. "Dona Flor e seus dois maridos", de Jorge Amado, é o quinto livro da colecção Mil Folhas, numa tiragem de 95 mil exemplares

Ao enunciar assim uma das mais fortes mensagens desta obra Jorge Amado não pretendia certamente tranquilizar quem o lesse: "A felicidade é bastante cacete, assaz maçante, em resumo: uma aporrinhação." É com o segundo marido que Dona Flor é feliz e, à luz da frase anterior, dizê-lo é já revelar muito.

Uma boa parte da história conta-se em poucas palavras. Dona Flor (na realidade chama-se Florípedes), professora de culinária de qualidades sobejamente conhecidas, foge de casa para casar com Vadinho, boémio e sedutor, noctívago e jogador. Mas Vadinho morre na manhã de um domingo de Carnaval, vestido de baiana. Algum tempo depois, Flor contrai matrimónio pela segunda vez com um homem que é o oposto do primeiro marido: doutor Teodoro, o da farmácia, homem sério e organizado, honesto e atencioso. A "professora de temperos" pode então viver aquilo que todos apontam como exemplo de um casamento feliz.

Até aqui, tudo claro. Simplesmente, tal como a vida, esta é uma história "clara e obscura". E a pacatez da vida de Dona Flor sofre um abalo sem fim. A determinada altura, a mulher de doutor Teodoro começa a sonhar com o falecido. E com tanta intensidade o faz que ele acaba por voltar. Nu, disponível, matreiro, malicioso e a mandar bocas ao "colega". Pode a tranquilidade da "vidinha sem novidade" tornar dispensável a loucura, a graça, a tentação? Pode a "gula acesa" saciar-se em regime "magro e insosso, sem sal e sem açúcar"? Há lugar para vencedores nesta luta?

Flor "não era mais uma pessoa só e igual, inteira e íntegra: estava dividida em duas, a honesta e a salafrária, seu reto espírito de um lado, do outro a matéria em ânsia". "Um desacordo." Vadinho não vê razão para dramatizar tanto: "Entre nós dois, tu está muito bem servida. Ele para penas e cuidados, eu para a gente vadiar..."

Em Julho de 2000, a polícia brasileira dava conta da detenção, em São Paulo, de uma ladra que há meses aterrorizava os proprietários de restaurantes. Era conhecida como Dona Flor e não é preciso pensar muito para perceber porquê: atacava sempre com dois homens.