O discurso de José
Saramago ao receber o Prémio Nobel de Literatura de 1998
De
como a personagem foi mestre
e o autor seu aprendiz
O homem mais sábio
que conheci em toda a minha vida não sabia ler nem
escrever. Às quatro da madrugada, quando a promessa
de um novo dia ainda vinha em terras de França, levantava-se
da enxerga e saía para o campo, levando ao pasto a
meia dúzia de porcas de cuja fertilidade se alimentavam
ele e a mulher. Viviam desta escassez os meus avós
maternos, da pequena criação de porcos que,
depois do desmame, eram vendidos aos vizinhos da aldeia. Azinhaga
de seu nome, na província do Ribatejo. Chamavam-se
Jerónimo Melrinho e Josefa Caixinha esses avós,
e eram analfabetos um e outro.
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