Piotr Ilich Tchaikovsky
UMA ALMA DIVIDIDA

Acusado de vender a alma (e a música) aos alemães, Tchaikovsky foi o mais controverso e importante sinfonista russo da sua geração. Pós-romântico e apaixonado pelo teatro e pela dança, compôs “O Quebra-Nozes” e “O Lago dos Cisnes”, amanhã editados com o PÚBLICO

O compositor russo Igor Stravinsky, considerado um “revolucionário”, defende em “Crónicas da Minha Vida” que o compatriota Piotr Ilich Tchaikovsky era um músico “com ideias e ofício”, “segurança na exposição” e um “valor dramático que não deixa dúvidas”. Apesar dos elogios, muitos houve que não reconheceram o génio e a obra de Tchaikovsky, o sinfonista russo pós-romântico mais importante da sua geração.

Depois de Beethoven, Wagner e Schubert, a Colecção Royal Philharmonic do PÚBLICO dá-lhe a conhecer, em dois volumes, as criações mais importantes do controverso Tchaikovsky. O primeiro volume, publicado amanhã, revisita as composições dos célebres bailados “O Quebra-Nozes” e “O Lago dos Cisnes”. Já o segundo volume, a publicar na segunda-feira, contém a sombria “Sinfonia Patética” e a popular e divertida “Marcha Eslava”.

Filho de um engenheiro de minas russo e de uma descendente francesa de uma família imigrada, Tchaikovsky nasceu em 1840 na pequena cidade de Votkinsk, na Rússia. Após completar os estudos de direito, decidiu formalizar os seus estudos de música e ingressou no conservatório de S. Petersburgo, onde trabalhou durante três anos com Rubinstein, que lhe ensinou orquestração, e com Zaremba, que foi o seu mestre de composição. A flauta, o órgão e o piano eram os seus instrumentos preferidos.

Compositor pós-romântico, ainda que a sua estética e gostos estivessem mais próximos do romantismo, Tchaikovsky era um admirador de Mozart, Bach e Beethoven. Tinha ainda um grande respeito pelo trabalho de músicos que se dedicavam ao teatro, como é o caso de Meyerbeer, Weber ou Schumann. Liszt é, no entanto, aquele que tem um papel mais determinante na escrita de Tchaikovsky, cujas primeiras sinfonias foram claramente influenciadas pelo estilo do mestre húngaro.

Em 1866, Tchaikovsky obteve o cargo de professor de Harmonia no Conservatório de Moscovo, onde permaneceu durante 11 anos. Foi durante este período que entrou em contacto (e também em confronto) com o “Grupo dos Cinco”, que se formou por oposição à influência da música germânica na Rússia. Fizeram parte deste movimento de carácter nacionalista os russos Rimski-Korsakov, Balakirev, Mussorgski, César Cui e Borodin.

Trabalhar como um sapateiro Incompreendido, Tchaikovsky teve sempre alguma dificuldade em afirmar- se e foi acusado pelo “Grupo dos Cinco” de se deixar influenciar pela música alemã, em detrimento do espírito russo. Quando foi a Moscovo com a sua primeira sinfonia e ópera, “O Voivoda” (Sonho no Volga), a crítica reconheceu-lhe o mérito, mas César Cui não lhe poupou comentários depreciativos. A composição “Orquestra nº1” também originou um sério conflito com Nikolai Rubinstein, seu antigo mentor, quando este se negou a aceitá-la como uma obra de qualidade e não quis estreá-la.

Cansado de ser acusado de não preservar o espírito russo, Tchaikovsky rompeu com o “Grupo dos Cinco” e estreitou relações com músicos de outros países europeus como os franceses Saint-Saens ou Bizet. Foi, então, que se começou a deixar fascinar pelo universo musical do teatro e da dança, dedicando-lhe uma boa parte do seu tempo: ao todo, compôs dez óperas e inúmeros “ballets”.

“É preciso compor da mesma forma que os sapateiros fazem... trabalhando todos os dias e normalmente por encomenda”, dizia Tchaikovsky, que durante anos foi sustentado pela sua amiga, a senhora Nadejda von Meck, viúva de um importante empresário. Os dois conheceram-se através do violinista Cotek, amigo de Tchaikovsky, e viveram um romance platónico, baseado numa correspondência quase diária, mas sem grandes declarações de amor da parte dele.

“Romeu e Julieta”, “Fatum”, “Francesca de Rimini” e alguns outros poemas sinfónicos assinados pelo compositor russo são considerados obras magistrais. Quanto aos “ballets”, “O Lago dos Cisnes”, “O Quebra-Nozes” e “A Bela Adormecida” encontram-se entre alguns dos seus maiores êxitos. Morreu em S. Petersburgo, em 1893, mas antes confessou numa carta ao seu irmão como o magoavam as críticas de que fora alvo: “Sou russo, russo até à medula.”.

PRÓXIMO COMPOSITOR

Richard Wagner

Wilhelm Richard Wagner (1813-1883) é uma das figuras mais célebres da história da música e também uma das mais polémicas. Tanto do ponto de vista pessoal, como do ponto de vista musical ou político, suscitou mais discussões, estudos e interpretações do seu pensamento do que qualquer outro compositor. Depois da sua morte, os seus escritos voltaram a dar lugar a posições diametralmente opostas. O que causou esta situação foi o seu ideal que tentava unir um pensamento tipicamente libertário e anarquista a um elitismo tipicamente burguês, para não dizer – já que não era – aristocrático. Nascido em Leipzig, na Alemanha, escreveu uma tragédia shakespeariana aos 14 anos e começou a estudar música, influenciado por Beethoven e Weber, para que a sua obra pudesse ser cantada. Aos 20 anos, tornou-se maestro do coro de Wurzuburgo e nunca mais parou. Quando chegou à idade de se dar a conhecer como compositor, o romantismo já estava no seu apogeu. Entre as suas obras mais famosas contamse “O Navio Fantasma” (1843), “Tanhäuser” (1861), “Tristão e Isolda” (1865) e “O Anel de Libelungo”(1876). Dedicou-se também às meditações filosóficas e estéticas, publicando as obras teóricas “A Obra de Arte do Futuro” (1849) e “Ópera e Drama” (1851).