“A História de Um Fantasma com Medo"

Uma família americana chega ao Castelo de Canterville e o fantasma residente deixa de assustar para passar ele a ter medo. Muito medo. Por Diego Armés dos Santos

Na Primavera de 1890, o diplomata americano Hiram B. Otis chega a Inglaterra e decide comprar o Castelo de Canterville, nos arredores de Ascott.

Lord Canterville, o honesto proprietário do castelo - que há várias gerações pertence à família -, adverte o comprador para a existência de um eventual obstáculo ao negócio: o lugar está assombrado.

E é com este aviso que Oscar Wilde, autor do conto "O Fantasma dos Canterville", inicia a narrativa. O senhor Otis, um portento de obstinação e pragmatismo, não aceita o aviso da existência de uma alma penada, vagueando pelas paredes e vãos de escada da propriedade desejada. Aliás, a resposta de Otis a Lord Canterville não se faz esperar e surge tão curiosa quanto arrogante: "Compro o castelo com todo o seu recheio, incluindo o fantasma", ao que acrescenta, indelicadamente, "venho de um país onde se adquire tudo com dinheiro".

Neste momento, ficam desenhados traços que serão altamente vincados ao longo do conto: a oposição entre o conservadorismo da cultura aristocrática britânica, e a nova cultura americana que, do outro lado do Atlântico, rejeita a monarquia, os títulos de nobreza e as crenças tradicionais, enveredando pelo pragmatismo republicano, que aprecia a inovação, o progresso e a saúde da economia.

Esta oposição é exposta por Wilde em peripécias divertidas e frases das personagens. Há, por vezes, situações que roçam o ridículo, especialmente em relação aos americanos, vistos por Wilde como uns burgueses novos-ricos. E há, ainda, uma passagem que ilustra a vacuidade com que o autor caracteriza os britânicos e os americanos: quando descreve a Sra. Otis, mulher do diplomata, diz que esta "parecia quase inglesa, e aí estava um excelente motivo para se dizer que temos [a Inglaterra], hoje, tudo em comum com a América, excepto, é claro, o idioma".

Partindo desta oposição, Wilde conduz uma história simples. O fantasma de Canterville habita um castelo (este é o castigo pelo mal que cometeu há mais de 300 anos), mas não desdenha a vida que leva. Pode-se até dizer que sente um certo prazer em horrorizar as pessoas - em casos extremos, provocar-lhes sustos que levem à loucura ou à morte.

O fantasma de Canterville é inglês e, portanto, tem requinte, chegando a pontos de encenar situações e encarnar diferentes personagens. Porém, quando Hiram B. Otis compra o castelo e decide habitá-lo com a sua família (a mulher, o filho mais velho Washington, os dois terríveis gémeos e a filha Virgínia), a alma penada vê-se impedida de manter o modo de vida - se é que se pode dizer que um fantasma tem vida.

Com o avançar da narrativa, assiste-se ao triste declínio do fantasma, que chega ao cúmulo de ter medo de... tentar assustar. Passa, então, a habitar uma divisão recôndita do castelo, recusando-se a aparecer todas as noites. Cada vez mais humilhado, tanto pela indiferença que os Otis lhe dedicam como pelas partidas que os gémeos lhe pregam, o fantasma passa a ansiar pelo descanso eterno, que não chega enquanto não se cumprir determinada profecia.

É aqui que Virgínia Otis, que é pura e tem bom coração, irá desempenhar um papel fundamental. E só então o leitor poderá compreender como é triste a vida de um fantasma que paga pelos seus pecados e que pecados são estes...

Em "O Fantasma dos Canterville", Oscar Wilde faz uso de certos traços que caracterizam a sua escrita, como o humor, a sátira e os ambientes sombrios com alusões ao sobrenatural. Além deste, o livro contém ainda os contos "O Príncipe Feliz", "O Rouxinol e a Rosa", "O Gigante Egoísta", "O Amigo Dedicado", "O Notável Foguete", "O Jovem Rei", "O Aniversário da Infanta", "O Pescador e a Sua Alma" e "O Filho-da-Estrela".




Livros que nos transportam para o plano da aventura da fantasia, da descoberta e da ficção, apelando à imaginação de cada leitor para criar as imagens, as personagens e os cenários.