"Oliver
Twist"
Por RITA PIMENTA
Franzino e pálido, Oliver Twist vive
num orfanato perto de Londres, desconhece a sua origem e é
maltratado por quem dele devia cuidar – os funcionários
da instituição Asilo da Mendicidade e Órfãos.
Terá uma vida desgraçada e triste, mas não
para sempre.
Criada por Charles Dickens, esta personagem enquadra-se
no perfil que o autor gosta de atribuir às “crianças
que inventa”. Com percursos difíceis e sempre vítimas
de injustiças sociais, os pequenos protagonistas acabam por
conseguir ajustar contas com o destino. À semelhança
do autor.
Nascido em Landport (Reino Unido), em 1812, o próprio
Dickens foi obrigado a trabalhar desde cedo numa fábrica,
em consequência de o seu pai ter sido preso por não
conseguir pagar as dívidas que fora contraindo ao longo de
vários anos. Tornou-se num activista contra as desigualdades
sociais da sociedade britânica do séc. XIX e chegou
a redigir panfletos de carácter político, em que denunciava
as injustiças do seu tempo – a era industrial.
As personagens caricaturais a que deu forma personificavam
a hipocrisia das elites e a indigência perante os pobres e
desprotegidos, sobretudo as crianças. Em “Oliver Twist”,
todas as desventuras têm por base a origem social do rapaz,
aparentemente excluído do ciclo da gente respeitável
londrina.
Dickens, aos 26 anos, consegue desafiar o seu próprio
“condicionalismo social” e torna- se famoso, ascendendo
na escala que se diria intransponível. Fá-lo através
das palavras. Vende-as em fascículos, como era comum na época.
Oliver tem sorte mais cedo. É logo na pré-adolescência
que se livra do bando de ladrões que o querem explorar e
encontra uma família disposta a ajudá-lo. Mais, a
sua verdadeira família sempre tinha algo para lhe deixar
como herança. Um final que ajuda os mais novos a acreditar
que, mesmo estando a viver um momento dramático, este pode
um dia vir a alterar-se.
Antes do desfecho, o miúdo tem de suportar
inúmeras privações, não só de
alimentos e conforto, como de afectos. Obrigado a ser ajudante de
limpa-chaminés e a trabalhar depois como cangalheiro, perde
ainda o seu amigo mais próximo. Continuamente maltratado
por quem com ele se cruza, decide fugir para Londres. Quando parece
que tudo vai melhorar, descobre- -se no meio de uma quadrilha de
ladrões, num ambiente escuro, sujo, a que não falta
a presença sempre repelente das ratazanas.
É assim que Charles Dickens vai desconcertando
o leitor, que desespera perante a impotência e solidão
da criança. Quando se está prestes a perder irremediavelmente
a esperança nos homens, o autor resolve dar uma oportunidade
às personagens. E aos leitores.
Esta reviravolta positiva que “o homem
que inventou o Natal” imprime nas suas narrativas mais trágicas
não deve ser alheia ao seu percurso de vida. Quando criança,
decerto não imaginaria que seria famoso pelas suas histórias.
E, afinal, passados quase dois séculos, aqui estamos a falar
dele.
|