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"O
Último Moicano"
Por RAQUEL RIBEIRO
Cora e Alice são filhas do comandante
do Forte William Henry, escoltadas numa expedição
pelos territórios inimigos até reencontrarem o pai.
Esta é
a parte ficcional do romance "O Último Moicano",
de James Fenimore Cooper. As desventuras das duas raparigas e da
sua escolta - traída pelo índio Magua, Raposa Matreira,
chefe dos Hurões,, que tenta assim vingar-se do pai das jovens,
a expedição é salva pelo batedor Olhos-de-Águia
e os seus amigos índios, entre eles, Uncas, o último
dos Moicanos, filho de Chingachgook.
Durante a Guerra entre os Franceses e os Índios,
o livro documenta o massacre do Forte William Henry pelos franceses,
em 1757. Esta é a parte verídica do livro. Cooper
conhecia alguns índios e delineou uma história de
conflito entre duas tribos opostas: os Delawares (os Moicanos) e
os "Mingos". Apesar das imprecisões históricas
que alguns criticaram no escritor americano, as descrições
das tribos permitiram a Cooper criar uma imagem que perdurou no
imaginário e na consciência da América durante
mais de dois séculos.
Os leitores ficaram tocados pela dualidade das versões:
a visão romântica do destino cruel dos índios
e a justificação histórica dos colonos para
a exterminação dos mesmos. Foi Sir Walter Scott que
inspirou Cooper a delinear estereótipos de luz e escuridão,
bem e mal, e criar dicotomias, por exemplo, nas mulheres, da imaculada
para a impura.
No livro, os ingleses têm que se render e retirar
do forte, perante a investida dos franceses, que sitiaram o local.
Mas os Hurões atemorizam as mulheres e as crianças,
matando-as ou raptando-as, como a Alice e Cora.
Raposa Matreira já no princípio dissera
a Cora que era ela que ele queria como vingança ao seu pai:
"Quando as feridas arderem nas costas do Hurão, ele
saberá onde encontrar uma mulher para lhe aliviar a dor.
A filha de Munro [o comandante] irá buscar-lhe água,
cavar o milho e cozinhar o que ele caçar. O corpo do homem
branco dormiria entre os seus canhões, mas o seu coração
ficaria ao alcance da faca de Raposa Matreira."
O ataque ao forte de William Henry pelos franceses
e os seus aliados, os Hurões, é um dos factos verídicos
do livro. É o narrador que a isso se refere: "O espectáculo
sangrento e desumano a que fizemos referência no capítulo
anterior vem referido nas páginas da história colonial
com o merecido título de 'O Massacre de William Henry'."
E continua: "E é de longe muito maior esta mancha do
que a que um anterior e muito semelhante acontecimento deixou na
reputação do comandante francês e que não
foi inteiramente apagada pela sua precoce e gloriosa morte. O tempo
foi-a desvanecendo, e milhares de pessoas agora sabem que Montcalm
morreu como um herói, nas planícies de Abraão,
devem também ficar a saber quanto lhe faltava de coragem
moral sem a qual nenhum homem pode ser verdadeiramente grande."
"Moralismos" à parte, o resto do
livro é sobre o salvamento das duas raparigas. Não
se pode revelar se Uncas e os amigos conseguem ou não salvar
Alice e Cora das mãos dos Hurões. Mas outro momento
alto é a aceitação, pela tribo Delaware,
de Uncas como chefe dos Moicanos. Uncas é um jovem destemido,
forte e orgulhoso da sua tribo.
É ele que defende Olho-de-Águia - o branco "adoptado"
pelos índios e que aprendeu a escutar os ruídos da
floresta como um índio - quando a tribo quer expulsá-lo
do grupo, por ser "rosto-pálido". "Demos-lhe
o nome de Olho-de-Águia porque a sua vista nunca falha. Os
Mingos conhecem-no melhor pela morte que ele espalha sobre os seus
guerreiros. Para eles é Carabina Comprida", diz Uncas,
calmo, mas firme.
A origem dos nomes
Como Sir Walter Scott e outros escritores seus contemporâneos,
Cooper criou uma enorme galeria de personagens - cerca de 40 por
livro, a que "O Último Moicano" não é
excepção. Quase todas têm uma "alcunha"
e muitas ficarão conhecidas na história da literatura,
sobretudo pelo nome que Cooper lhe deu.
A "James Fenimore Cooper Society",
na internet, mostra que são especialmente os índios
que têm vários nomes, alguns no original, outros que
se foram deturpando com as traduções para outras línguas.
Assim, 1286 personagens de todos os romances de Cooper dão
um total de 1536 nomes. Isto porque, como é o caso de "O
Último Moicano", cada índio tem o seu nome próprio,
o seu nome de guerra e o nome que as tribos inimigas lhe deram.
O que confere ao romance de Cooper uma riqueza de descrição
de caracteres impressionante e, acima de tudo, um jogo aliciante
sobre quem é esse tal "Carabina Comprida", "Veado
Ligeiro" ou "Serpente Grande", ou seja, Olho-de-Águia,
Uncas ou Chingachgook, respectivamente.
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