"A
Trilogia de Nova Iorque", de Paul Auster
Um dia, há pouco mais de 20 anos, Paul Auster
estava em casa e o telefone tocou. Era alguém à
procura da Agência de Detectives Pinkerton.
Por Alexandra Lucas Coelho
Os livros de Paul Auster estão cheios de acasos destes.
Coincidências, encontros, acidentes que inclinam a vida
das personagens numa determinada direcção. Como
uma das suas personagens diz, "as histórias só
acontecem às pessoas que são capazes de as contar",
e o que Auster fez com esse telefonema foi aproveitá-lo
para o início de um novo romance.
Esse romance é "A Cidade de Vidro", que
viria a ser o primeiro da "Trilogia de Nova Iorque".
Começa assim: um homem chamado Quinn está em
casa e o telefone toca. É alguém à procura
da Agência de Detectives Paul Auster.
Quinn já teve outra vida, uma mulher, um filho, poemas
publicados com boas críticas. Agora vive de escrever
policiais, esperando nada. Como os telefonemas prosseguem,
decide entrar na pele do tal Paul Auster. É então
contratado para seguir um homem que poderá vir a cometer
um crime. Segue-o passo a passo, pelas ruas de Manhattan.
Toma nota dos seus percursos num caderninho vermelho, chega
a desenhar mapas. Um dia perde-o. Em busca de pistas, procura
então o detective Paul Auster, que afinal não
é detective mas sim escritor, vai a casa dele, conversam
sobre Dom Quixote. Nada que adiante para o caso. Quinn acaba
a vigiar a casa de quem o contratou - para tentar evitar o
crime. Come e dorme, ali, num beco, agarrado ao caderno vermelho.
Passa a viver em função do homem que persegue.
Como um seu duplo.
"A Cidade de Vidro" foi publicado em 1985.
Entretanto Paul Auster reencontrara o esboço de uma
peça de teatro que escrevera anos antes. Pensou nela
como uma sequência da "Cidade de Vidro". Estamos
nos anos 40. Blue é contratado para seguir Black. Anota
todos os seus passos, lê o livro que ele lê, "Walden
ou a Vida nos Bosques", de Henry David Thoreau. Passa
a viver em função do homem que persegue, como
um seu duplo. A esta história Paul Auster chamou "Fantasmas"
e publicou-a em 1986.
Faltava a terceira história, a última, a única
contada na primeira pessoa por um narrador sem nome. Esse
narrador também persegue um homem, Fanshawe. Fanshawe
fora o seu amigo de infância, o amigo mais que talentoso.
Um dia a mulher de Fanshawe telefona a dizer que ele desapareceu,
deixando toda uma obra por publicar. Mais uma vez, o homem
que procura funde-se, afunda-se, no homem procurado. Como
um seu duplo. Mas desta vez quem está a contar a história
é seu protagonista. Um protagonista com muito mais
do autor Paul Auster do que a personagem Paul Auster da primeira
história.
"O Quarto Fechado" foi publicado em 1987. É
o melhor desta trilogia - e é também o favorito
de Paul Auster, como ele diz, na entrevista que publicaremos
amanhã. |