“A Criança
no Tempo”, de Ian McEwan
Neste livro, que recebeu o prémio
de ficção Whitbread de 1987, o autor lembra
que não se pode escapar ao tempo. “Amesterdão”
e “Expiação” ainda vinham longe.
Novos prémios também.
Por Rita Pimenta
Logo às primeiras páginas, o
livro magoa. O protagonista perde a filha de três anos
no supermercado. O embate é forte, mas o leitor deve
resistir e seguir em frente. Como a personagem.
Ian McEwan sabe dosear e intervalar as emoções
a que sujeita quem o lê, e muitas serão vividas
durante a leitura de “A Criança no Tempo”.
É também para isso que se procura a literatura.
A relação dos pais de Kate,
a criança desaparecida, desmorona-se. Há demasiado
silêncio. É daqui que a personagem central do
romance parte para uma complexa reconstituição
do tempo vivido com a filha, com os pais e com todas as pessoas
que passaram pela sua vida. O tempo e a memória como
construções humanas. E a dor de imaginar a criança
a crescer longe.
Para ainda maior desconcerto, Stephen —
o protagonista — escreve livros para a infância
e faz parte de um comité de educação.
Horas infinitamente perdidas a discutir teorias pedagógicas,
a que presta pouca atenção.
Esta obra foi distinguida com o prémio
de ficção Whitbread de 1987 e, 11 anos depois,
o autor, britânico, receberia o Booker Prize com o título
“Amesterdão”, derrotando a favorita da
altura, Beryl Bainbridge. Já em Fevereiro deste ano,
Ian McEwan obtinha o prémio norte-americano para o
melhor livro de ficção do National Book Critics
Circle, relativo a 2002, pelo livro “Expiação”.
Muitas vezes considerado perverso e mordaz,
o autor revela uma ironia e lucidez que tanto divertem como
fazem engolir em seco. O retrato frio de comportamentos e
situações comuns conquista e apura a atenção
de quem mergulha na narrativa.
Ian McEwan afirma que “A Criança
no Tempo” foi o último dos seus livros a tratar
de dramas individuais dissociados do tempo e do espaço.
A partir daí, passou a integrar as suas personagens
em períodos históricos bem definidos. Exemplos
disso são as obras “Cães Pretos”
e “Amesterdão”.
O pai do autor leu “A Criança
no Tempo” num só dia.
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