Tiragem de 98 mil exemplares
Se é quarta-feira, é dia do
livro no PÚBLICO. Com a maior tiragem desde "O
Nome da Rosa", de Umberto Eco, "O Jardim do Éden"
é o sexto livro da colecção Mil Folhas.
Ernest Hemingway, obra póstuma.
Ernest Hemingway falou de suicídio
durante toda a vida. Por fim matou-se mesmo, em 1961. Deixou
material por publicar. Imenso. "O Jardim do Éden"
foi a segunda obra póstuma e só surgiu ao
público 25 anos depois. Se hoje ressuscitasse, o
escritor norte-americano dificilmente saberia que livro
era este. Não quer dizer que não gostasse
- a "O Jardim do Éden" não faltaram,
desde a edição até hoje, êxito
de público e elogios de críticos, a par com
polémica q.b.. Quer dizer que o autor teria dificuldade
em reconhecê-lo.
Hemingway terá dedicado a este livro
mais tempo de escrita do que a qualquer outro. Na verdade,
começou a trabalhar nele em 1946 e embora tenho escrito
a maior parte no ano e meio seguinte, continuava a cortar,
a emendar e a acrescentar no ano da morte. Quinze anos de
trabalho, portanto. A fazer fé nos números
mais pormenorizados, revelados aquando da publicação
inicial, deixou escritos 48 capítulos com um total
de 200 mil palavras. O que foi editado tem 30 capítulos,
curtinhos, e um total de 70 mil palavras.
Este "O Jardim do Éden"
que temos à nossa disposição é
portanto cerca de um terço do que ele deixou escrito.
Até é comum que obras póstumas sejam
editadas, despojadas de gorduras, arranjadas, mas esta é
seguramente, por qualquer padrão, uma das maiores
intervenções do género jamais realizadas.
Quem meteu ombros à tarefa e assumiu
com coragem os cortes foi Tom Jenks. Com coragem e com o
medo de que, no momento da apresentação pública,
o livro fosse considerado mais dele do que de Hemingway.
Na época, as justificações éticas
e literárias de Jenks foram muitas. "Cortei
umas coisas, rearranjei outras, mas não acrescentei
nada, não reescrevi nada", garantiu. Ou: "Só
fiz aquilo que pensei que Hemingway teria feito".
O resultado foi o que ele tinha prometido:
"um Hemingway novo e sensível". Porque
distante da imagem do macho caçador e marido-em-série
que ele cultivou ao longo da vida.
Houve várias personagens deitadas
fora por Jenks. Ficaram, em suma, três: David Bourne,
escritor, Catherine Bourne, a mulher, casal em lua-de-mel,
e Marita. David, Catherine, Marita. Un, deux, trois. Há
uma "ménage à trois" neste Jardim
do Éden. Muito sexo, sol, praia, vinhos e manjares.
É isto a entrada no Paraíso ou o caminho mais
rápido para ser expulso dele? A ler amanhã.