"Don Juan DeMarco", de Jeremy Leven
Por Vasco T Menezes
Uma delicada e irónica comédia romântica
que opera a revisão do mito de Don Juan e conta com três
actores de eleição: Johnny Depp, Marlon Brando e Faye
Dunaway
Johnny Depp, o "maior sedutor do mundo"?
Uma ideia em que talvez não seja muito difícil acreditar...
É assim que ele se apresenta em "Don Juan DeMarco"
(1995), na pele de um perturbado jovem que, munido de anacrónicas
capa e mascarilha (ecos do Zorro de Douglas Fairbanks...), se convence
de que é um grande amante, o lendário Don Juan.
Diz-se mexicano (descendente de nobres espanhóis),
mas o apelido é italiano (herdado do pai, Tony, um emigrante
de Queens que em tempos foi o "rei da dança" no
Astoria de Nova Iorque...) e o sotaque um castelhano cerrado.
Encontramo-lo aos 21 anos, disposto a suicidar-se
após ter sido rejeitado pelo verdadeiro amor da sua vida,
Dona Ana (a francesa Geraldine Pailhas), uma das mais de mil (1502,
para sermos mais exactos...) mulheres que amou. Quem o consegue
demover é o Dr. Jack Mickler (o ícone Marlon Brando),
um veterano psiquiatra prestes a reformar-se. Intrigado, resolve
ajudar o rapaz e fazer dele o seu último caso, enviando-o
para o hospital psiquiátrico onde trabalha.
Durante os dez dias seguintes, Don Juan vai contar
a história (rocambolesca) da sua vida e acabar por reavivar
o ligeiramente adormecido amor entre o médico e a mulher
(magnífica Faye Dunaway, que com pequenos pormenores transcende
os limites de uma personagem pouco desenvolvida).
Por aqui facilmente se percebe que "Don Juan
DeMarco" vive da permanente oscilação entre dois
mundos radicalmente diferentes: o mundo real, onde as coisas são
vistas de uma "maneira limitada e nada criativa", a que
Mickler relutantemente pertence; e o "mundo maravilhoso",
barroco e de contornos oníricos, do seu paciente (que vê
"o que está para além do olhar"), feito
de cores vivas e de peripécias várias, desde duelos
de espadas a passagens por magnificentes haréns.
O filme é a primeira incursão
do escritor e argumentista Jeremy Leven na realização
(a convite de Coppola, que aqui serve de co-produtor), uma experiência
que até agora não voltou a repetir. É pena,
pois Leven (que cruzou a leitura do "Don Juan" de Lord
Byron com a sua experiência anterior como psicólogo)
constrói aqui um objecto singular e despretensioso, uma fantasia
graciosa à qual não pode ser negada um certo charme
etéreo. Ainda para mais, serve de veículo perfeito
para o extraordinário actor que é Johnny Depp, utilizando
de forma hábil a sua beleza exótica e andrógina.
|