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  À ASPIRINA Claramente: o mais prático 
  dos sóis, o sol de um comprimido de aspirina:
 de emprego fácil, portátil e barato,
 compacto de sol na lápide sucinta.
 Principalmente porque, sol artificial,
 que nada limita a funcionar de dia,
 que a noite não expulsa, cada noite,
 sol imune às leis da meteorologia,
 a toda a hora em que se necessita dele
 levanta e vem (sempre num claro dia):
 acende, para secar a aniagem da alma
 quará-la, em linhos de um meio-dia.
 Convergem: a aparência 
  e os efeitos da lente do comprimido de aspirina:
 o acabamento esmerado desse cristal,
 polido a esmeril e repolido a lima,
 prefigura o clima onde ele faz viver
 e o cartesiano de tudo nesso clima.
 De outro lado, porque lente interna,
 de uso interno, por detrás da retina,
 não serve exclusivamente para olho
 a lente, ou o comprimido de aspirina:
 ela reenfoca para o corpo inteiro,
 o borroso de ao redor, e o reafina.
 JOÃO CABRAL DE MELO NETOin "Antologia Poética"
 Livraria José Olympio Editora, 5ª ed.
 Rio de Janeiro, 1979
 206 páginas
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