Eduardo Cintra Torres
:Roby, o Capitão Brilhantina


Roby, o Capitão Brilhantina Por EDUARDO CINTRA TORRES Segunda-feira, 5 de Junho de 2000 Há 30 anos, passava um anúncio do Bryllcream na RTP que mostrava um homem de frente, assim como se estivesse a fotografar-se no Photomaton, antes e depois de usar aquele produto para acachapar o cabelo. A "voz off" dizia: Fulano de tal, cabelo empastado; Fulano de tal, Bryllcream. As fotografias do «capitão Roby» que apareceram de novo na imprensa e no Especial TVI dedicado ao personagem (26.05) lembraram-me o homem que usava Bryllcream. Aquela popa no cabelinho não engana. O Roby das fotografias encaixa bem nos anos 70. Depois dos "Ballet Rose", a jornalista Felícia Cabrita soube novamente agarrar numa estória real com todos os ingredientes para dar um bom produto ficcional. Fez muito bem, porque em Portugal há poucas estórias destas - aliás, há poucas estórias, ponto final. É essa a razão por que tem sido tão difícil criar bons argumentos para o cinema e a televisão: somos um país de coisas pequenas em que os dramas nunca são grandes dramas e as tragédias nunca são grande tragédias. Há que aproveitar o pouco de realidade que parece ficção. O Roby dos anos 60 e 70 é mais do que um vulgar sedutor, havendo ali material para muitos episódios: além da sedução sexual, há a converseta cheia de petas, os sentimentos Corin Tellado, a política marginal, o falso nome, a falsa tropa, os falsos negócios, o julgamento mediático na Boa Hora. Há as fotografias das raparigas nuas, cheias de boa vontade mas sem jeito nenhum, coitadas. Há as passagens pelas prisões, que revelam que os nossos serviços prisionais têm tantos segredos para contar como a nossa criminalidade. E há o próprio personagem físico, aquele cabelo sedoso, os olhos lânguidos, as pestanas trabalhadas, o ar papudinho que devia despertar os piores instintos maternais em raparigas com dote do papá ou pé-de-meia arrancado ao horário de trabalho de então. Ei-las, as seduzidas do Roby, em bicha para entrar com ele nos lavabos da sala de visitas da Penitenciária! O Roby dos anos 60 e 70 que foi ficando na memória é o deste piroso bem português que seduz a filha do comendador, saca a massa aos dois, mas não mata o papá nem o papá o tentar matar a ele. Fica tudo assim-assim, como nós todos. A série da SIC (quartas-feiras) mostra esta verdadeira farsa de forma desenvolta e desinibida. As cenas de sexo eram incontornáveis e só poderão chocar quem nunca vai ao cinema ou quem nunca faz "zapping". O sexo no écrã, hoje, é um conto normal. O argumento parece que se fez por si, o que é bom. Há hesitações no desenrolar da estória, mas parecem resultar mais da montagem do que do argumento. A realização ateve-se ao registo telenovelístico: talvez pudesse ter sido um pouco mais ousada - dando um passo em frente, que já faz falta, neste tipo de séries ficcionais televisivas. Afinal de contas, uma estória invulgar merece uma concepção de imagem invulgar também. Mas o momento certo - proporcionado por este argumento - não foi aproveitado para se dar o salto. O actor Vítor Norte parece que ganhou um lugar cativo na ficção televisiva e a sucessão de papéis em que o temos visto mostra uma grande versatilidade. Mas, sem querer ensinar o padre-nosso ao vigário, acho que no Roby lhe fazem falta alguns tiques, algumas características físicas ou comportamentais que fizessem do seu Roby mais do que um grande personagem, um autêntico tipo de personagem. Vítor Norte caracterizou o seu Roby através da dicção, o que poderia ter sido completado por elementos visuais. Já a série da SIC ia no segundo episódio e a TVI prometia-nos com muita emoção o que a SIC não poderia apresentar, por ter optado pela ficção: o produto genuíno, o Jorge Monteiro que para si mesmo inventou esse extraordinário nome que jamais um guionista seria capaz de desentalar dos miolos - «capitão Roby»! É certo que ao vermos Jorge Monteiro, o verdadeiro artista, the one and only capitão Roby, ao vivo na TVI, todos pudemos apreciar as diferenças entre a verdade e a ficção. O Roby de Vítor Norte não se parece nada com o Roby de Jorge Monteiro. E ainda bem! Eu prefiro o Roby de Vítor Norte. O que vimos na TVI foi um indivíduo que não sabe dizer uma frase seguida, que não sabe exprimir um raciocínio, que não consegue acabar uma frase. O Monteiro ex-Roby é uma daquelas pessoas de todos conhecidas que, por não saberem exprimir um pensamento linear, vão dando deixas aos interlocutores para que estes os interrompam. Foi o que sucedeu. Não disse nada. Aquele friso de entrevistados que Paulo Salvador enfrentou - o Roby de Jorge Monteiro, o seu advogado, homem «da bola», que é de fugir, e um biógrafo jornalista, que também é de fugir - foram a desilusão da semana na TVI, mas percebe-se: era impossível prever que nenhum deles servisse para nada em termos televisivos. Paulo Salvador meteu o rabo entre as pernas e fechou o programa. Terminava ingloriamente a promessa de uma grande noite televisiva, com a curiosa e divertida situação - um autêntico achado da TVI - de haver dois programas em canais concorrentes que se apresentavam na mesma semana com o mesmo título: «Capitão Roby». Mas, hélàs!, Jorge Monteiro no "Especial TVI" matou o Roby de antigamente. Jorge Monteiro não é o Roby que nós queremos lembrar! Que pobre figura! Onde está o sedutor? Onde está o fantástico vendedor de banha de cobra, ao nível do Oliveira da Figueira que se cruza com Tintin em tantas aventuras? É aquilo o nosso Casanova? É aquilo o nosso Don Juan?! Que horror! Mulheres portuguesas de há 30 anos, onde estava o vosso brio? Mereciéis ser enganadas por um sedutor melhor - por alguém como o Roby de Vítor Norte!