Eduardo
Cintra Torres
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Na televisão: vitória do profissionalismo e do marketing adequado |
A campanha mediática do PS, centrada em conceitos e repetida adi infinitum – mudança, confiança, segurança, esperança – ganhou à campanha errática do PSD, baseada na figura desequilibrada e egocêntrica de Santana Lopes. O líder do PSD levou o seu partido ao abismo e, o que é extraordinário, este deixou-se levar, provando como as organizações colectivas não têm mais razoabilidade mental do que os indivíduos. Quando acabou a noite política, com os mais dependentes dele gritando histericamente o seu nome, percebeu-se que Lopes não largará a liderança e tentará queimar tudo à sua volta antes de ele mesmo se imolar. Nem na declaração de derrota ele deixou de falar dele mesmo, dele mesmo, dele mesmo. O «drama» no PSD, como lhe chamou António Barreto na RTP1, promete. Entretanto, no PS, prosseguiu a campanha mediática vencedora de deixar a personalidade do líder de fora do combate político-mediático. A relação do PS com os media seguiu um caminho muito diferente do do PSD desde que Sócrates e Lopes se enfrentaram como «comentaristas» na RTP1. Enquanto o PS se centrou em conceitos, o PSD centrou-se doidamente na personalidade inconstante do seu amado líder. Os resultados? Medem-se em número de deputados eleitos. A nova relação do PS com os media é contrária à seguida no tempo de António Guterres, que foi basicamente semelhante à de Lopes (mas mais profissional): tomar decisões e seguir caminhos de acordo com sondagens, reportagens televisivas e artigos de imprensa. Isso explica que, com a maioria absoluta, o PS tenha tido ontem um discurso menos triunfalista do que quando o PS perdeu as eleições de 2002. A frase da noite de António Vitorino é paradigmática: com Sócrates, o «governo não será formado nem pela comunicação social nem na comunicação social.» E acrescentou para os jornalistas, com o riso nervoso com que habitualmente os enfrenta: «Habituem-se!» A relação dos políticos com o universo mediático tornou-se central no discurso da maior parte deles. Paulo Portas, que teve uma ampla cobertura televisiva (e até o favorecimento por parte da TVI), não se coibiu de culpar a «cumplicidade» dos media com a esquerda e a extrema-esquerda. Todavia, não se vitimizou mais do que isso, ao contrário de Lopes, que continuou a fazer o discurso do Calimero. A noite televisiva pouco mais dá que falar, precisamente porque correu bem para os três canais. A RTP1 surpreendeu avançando com a previsão da abstenção logo às 19h00, mas o seu grafismo para os resultados eleitorais era desastroso, com muito menor visibilidade do que os dos concorrentes. Marcelo Rebelo de Sousa enriqueceu o painel de comentadores da RTP, onde António Barreto continua a dar cartas e Mega Ferreira continua a enrolar lugares comuns. O Rebelo de Sousa da RTP1, que a TVI, como prova de eterna saudade, citou no seu rodapé, esteve bastante diferente dos tempos de compincha de Júlio Magalhães e José Carlos Castro: menos histriónico, como convém à gravidade do «serviço público» de TV. A RTP, tal como os outros canais, tinha mais do que um painel. Dá a impressão de que tanto painel serve para combater o horror do vazio, caso não haja mais nada para pôr no ar. Na prática, os comentadores acabam por ser constantemente interrompidos. O painel de comentadores da TVI foi o mais animado e teve direito a drama, com o ecrã dividido em dois quando Portas anunciou a demissão: ele dum lado e, no outro, ora o irmão Miguel ora o companheiro político Luís Nobre Guedes. A SIC repetiu a fórmula de êxito do trio da Quadratura do Círculo e foi o único canal a dar em directo a declaração de Marques Mendes desafiando Lopes. |