Eduardo Cintra Torres

Variedades


Eu vejo a meteorologia na TV espanhola e vejo todo o mapa da Espanha. Vejo a meteorologia na TV francesa e vejo todo o mapa da França. Vejo a meteorologia na TV britânica e vejo todo o mapa da Grã-Bretanha. Vejo a meteorologia na TV italiana e vejo todo o mapa da Itália. Mas vejo a meteorologia na TV portuguesa e não vejo todo o mapa de Portugal. Seja qual for o canal, vejo Portugal continental aos pedaços e, num dos canais, também os Açores.

O país meteorológico espartilhado e em movimento começou na SIC e espalhou-se à RTP1 e à 2. Na TVI, de manhã, nem pedaços do país mostram. Preferiram umas nuvens e uns sóis infantis que lhes saíram caríssimos.

Quero ver o clima em todo o país em simultâneo e não me deixam. Aqueles mapas de Sul para norte, em que primeiro vemos o Algarve e uma parte do Alentejo, depois o centro sul, depois o centro norte e depois o norte são uma grande tolice. Há pessoas nas televisões que, como dizem no Porto, não se enxergam. Bastava ver a atrapalhação dos apresentadores, que ainda dizem a temperatura de Évora e já o mapa vai em Viseu, para se perceber que aquilo está mal.

A leitura dos mapas faz-se, na mão, de norte para sul. Nas nossas televisões é ao contrário. Ver bocados de mapa mexendo-se em plano inclinado, como se o país fosse uma jangada de pedra digital, não faz sentido visual e dá cabo do funcionamento da função cerebral de orientação no espaço.

Também não faz sentido nacional, se assim me posso exprimir: a meteorologia televisiva é uma maneira de todos os cidadãos, e nomeadamente as crianças, se habituarem a ver a imagem física do seu país e entenderem a sua unidade geográfica e até as diferenças climáticas entre as suas partes. Nada disso acontece com o mapa aos bocadinhos. Fizeram assim para lhe dar movimento e porque o formato do país, por culpa dos primeiros reis, é vertical. A televisão, mais para o horizontal, aborrece-se com isso. As nossas televisões conseguem desvirtuar a geografia para a pôr ao serviço do estilo excessivo.

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Em entrevista à SIC Notícias (27.01), Carlos Carvalhas disse e repetiu que o PCP não tem a simpatia da imprensa e da TV e por isso se nota menos na vida política que outros partidos. Carvalhas tem razão. As simpatias, não assumidas, de uma parte da imprensa, rádio e TV vão principalmente para o Bloco de Esquerda. O BE está em "estado de graça" em alguns "media" há anos e não é escrutinado pelo jornalismo como os outros partidos parlamentares. Toda a actividade do BE se destina a maximizar tempos de antena e a obter a tal simpatia referida por Carvalhas.

Tal como Santana Lopes, o Bloco é uma empresa de relações públicas de si mesmo. No programa Conselho de Estado (2) em que participei há semanas fiquei estupefacto com as intervenções da ex-deputada Joana Amaral Dias, porque todas elas, mesmo arriscando descentrar os temas em debate, visaram apenas bajular os jornalistas e a imprensa em geral. Esta estratégia tem dado resultado. Enquanto na entrevista à SICN Carvalhas foi de novo confrontado com o apoio do PCP a regimes ditatoriais, nunca ninguém pergunta a Francisco "Écrã" Louçã, dirigente do PSR, "Secção Portuguesa da IV Internacional", se ele ainda defende a revolução permanente do camarada Leon Trostky.

Só que ao dizer que o PCP não tem a simpatia da imprensa Carvalhas deveria considerar a frase também como uma autocrítica. A política faz-se em grande parte pela comunicação de ideias e acções através dos "media". O BE faz tudo através dos "media". O PCP quase nada faz. No caso do BE o problema é dos "media" que se deixam embalar pela superficialidade do mediatismo bloquista. No caso do PCP o problema é do PCP. Para não dizer que o problema é o PCP.

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A pobreza da informação televisiva esconde-se sob a permanente agitação e estilo excessivo. As notícias repetem-se da noite para o dia seguinte. É desesperante ver os noticiários matinais da RTP1, da TVI e da SICN. Quase nada, às vezes nada, acrescentam às reportagens e notícias da véspera às oito da noite. Os mesmos textos, as mesmas imagens, os mesmos sons. E que notícias? Durante dois dias da semana passada as televisões prometeram com uma insistência infernal para o próprio dia uma decisão do juiz Rui Teixeira relativa à prisão preventiva do apresentador Carlos Cruz. É hoje! É hoje! No dia seguinte: afinal é hoje! Afinal é hoje! Lá estão os jornalistas em directo à porta da Penitenciária, onde não há mais ninguém senão eles, num trabalho absurdo, ridículo e incompetente.

Continua o jornalismo de expectativas. As televisões não dizem o que aconteceu, preferem prever o que acontecerá. E ficam o dia todo nisso. Até se gorarem as expectativas. Se eu disser "amanhã o mundo acaba" e depois ele não acabar chamam-me mentiroso. Que chamar às repetidas previsões jornalísticas que depois não ocorrem? Jornalismo de sucesso?

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Na Rua 52 em Nova Iorque há um museu da televisão e da rádio. Visitei-o em Setembro de 2001 e foi uma grande e agradável surpresa. Este museu não tinha uma única máquina de filmar, um único aparelho de rádio ou de TV, nenhum equipamento de transmissão, nenhuma antena. É como deve ser: um museu de conteúdos, de programas. A engenharia, que proporciona a magia mas não é a magia, fica à porta.

Há uma sala para exposição de fotografias. O resto são pequenas salas de exibição de programas antigos ou nem tanto. Numa das salas exibia-se Tudo em Família (Family Ties), com Michael J. Fox, que passa actualmente na SIC Gold. Noutra passavam "talk-shows" como o de Ed Sullivan. Este último regressa agora ao Museu, que tem outra sede em Los Angeles, para uma exposição sobre a já histórica visita dos Beatles aos EUA em 1964.

Inaugurada na sexta-feira, a exposição inclui o programa de Ed Sullivan em que os Beatles interpretaram cinco temas, entrevistas de rádio e fotografias. A estada dos Beatles nos EUA foi um ponto de viragem, não tanto para a cultura popular no país, mas para os comportamentos sociais da juventude. O programa de Sullivan é o arranque visível dessa viragem social na espiral da opinião pública. Hoje é impensável, mas em 9 de Fevereiro de 1964 - faz hoje 40 anos - o programa de Ed Sullivan foi visto por 74 milhões de pessoas: quase metade da população dos EUA assistiu à actuação dos quatro rapazes de Liverpool, então com 21 a 23 anos. Começava a supremacia dos "valores jovens" nos "media" e na cultura popular.