Eduardo
Cintra Torres
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Caderno de Apontamentos |
A QUEM ENCONTRAR ESTE CADERNO. Este bloco de notas pertence ao Olho Vivo, que nele escreve apontamentos pessoais, ideias para artigos e pensamentos privados. A quem o encontrar pede-se o favor de o fazer chegar à redacção do jornal PÚBLICO. Obrigado. Um Estranho em Casa (RTP1) Não vou escrever a crítica. Vi dois episódios. Foi suficiente para verificar que a série não tinha estrutura narrativa, personagens sólidos, estórias interessantes. Os pobres actores tentavam esconder a vergonha. Em vez disso, é melhor referir a estranheza de a RTP (a administração e o anterior director, Jaime Fernandes) ter feito avançar este projecto. A série é uma "ideia original" de Isabel Medina, e quem lhe deu o primeiro OK na RTP foi... Isabel Medina! Por causa disso, ela teve de sair do lugar que ocupava na RTP. É o que dizem. Mesmo assim, fez-se aquela porcaria. Porque terá sido? O melhor é não me meter. Os leitores do PÚBLICO devem andar fartos deste tipo de estórias. Entrevista O presidente da Media Capital deu uma entrevista ao PÚBLICO. Não sei se a comente, não vá o Arons insultar-me outra vez e inventar coisas. As propostas receberam o apoio de Balsemão. Mostram que o Governo deixou o audiovisual chegar a tal degradação que o presidente do canal de TV mais visto se propõe tomar conta de parte do actual espaço de antena do serviço público. Paes do Amaral propõe-se "ocupar" parte da RTP2 (isso só faz sentido se comprarem o direito de concessão dum dos canais da RTP); isto só é possível porque a RTP está de rastos e é enorme a confusão no audiovisual. E quanto à repetida proposta de os canais internacionais da RTP mostrarem programas da SIC e da TVI, do tipo "o melhor de Portugal"? A SIC já tem um canal internacional e a TVI, se quiser chegar aos emigrantes, deveria lançar o seu próprio canal. E por que razão os emigrantes teriam um direito legítimo de aceder aos programas da SIC e da TVI através do serviço público? Não se pode ter tudo na vida. Eu também não tenho acesso a programas excelentes das TV dos países onde os emigrantes estão e não exijo à SIC, TVI e RTP o "direito" de os ver. A SIC no Buçaco (Evitar escrever a graçola: "a SIC, do buraco para o Buçaco"). Não há nada como passar-se por momentos de dificuldade para se conhecer as regras singelas da humildade. Lá fui eu ao Buçaco, juntamente com dezenas de outros jornalistas, conhecer propostas da SIC para os próximos meses e explicar a estratégia. A SIC sentiu necessidade de dialogar com os jornalistas. Positivo. Sociedade Anónima Perdi o rasto desta série da RTP. Mudou de horário. Gostei do primeiro episódio, tentando criar uma situação muito dramática numa prisão. Vi mais episódios. Alguma coisa falhou. Mas é melhor não escrever a crítica: estarei eu desfasado das realidades que a série retrata? Por exemplo: o director da prisão parece saído dum romance por escrever de Manuel Tiago, é um facho de primeira - grita, insulta, agride; duvido que haja directores de prisão assim, mas quem sou eu para saber? Outro exemplo: sei pelo recente estudo do sociólogo José Machado Pais que há alunas universitárias que se prostituem, mas o argumento desta série esticou a corda: o personagem professor universitário, bonzinho, vai procurar a aluna a casa dela... a moça não lhe entregou um trabalhito curricular sem importância... e daí o professor é conduzido a um prostíbulo tipo vivenda "germinada", onde a aluna o tenta seduzir mas ele, tenazmente, resiste. Professor sofre! Ainda dizem que um homem não é de ferro! Ela acaba por fazer o melhor trabalho da aula (é melhor esclarecer: trabalho académico) e o professor fica todo contente. Que haja universitárias que se prostituem já fora para mim um espanto, agora que o argumento invente um setôr que vai a casa das alunas procurar trabalhos de três páginas... O silêncio final Os canais generalistas entraram em euforia com o parto dos seis gémeos. Fizeram a festa e deitaram os foguetes antes do tempo - sabendo muito bem o que estavam a fazer. Os porta-vozes da maternidade adivinhavam o desfecho, mas fizeram o que lhes competia: factos são factos. Os bebés foram morrendo. Só quando morreu o sexto as TV baixaram de tom e calaram o foguetório. É pena que o silêncio não fosse por vergonha. Olá Juliana! (O poder da educação) Então, 'tás boa? Como é que te têm corrido as aulas de Jornalismo? Não te convenci a mudar de curso, está visto. Depois não digas que não te avisei. Olha que são sete cães a um osso. Esgadanham-se todos. Desculpa lá não te escrever há que tempos. Andei aqui a pensar se valeria a pena escrever um livro sobre o tão importante significado do meu trabalho, um livro que mostre a enorme preparação a que me dedico, que revele como é que escrevo os meus artigos e em que resuma os artigos já publicados. Mas acho que não tem muito interesse. O que é que tu achas? Não dizes nada? Estás pouco interactiva hoje. Para esse trabalho estive a reler dois artigos que escrevi já vai para dois anos. O primeiro chamava-se "O poder da pergunta" e saiu em 18 de Dezembro de 2000. Foram meses de reflexão... Vê lá tu que o pretexto foi a entrevista de Judite de Sousa a António Guterres, sete meses antes. O artigo tratava "do quarto poder naquilo a que chamo o poder da pergunta". Na semana seguinte prossegui num segundo artigo, chamado "Poder da pergunta: valor democrático e perigoso". O quê, já não te lembras? Também tu?! E andas tu a estudar, Juliana. A educação já não é o que era dantes. O Estádio de Belém Também eu? Mais um a falar de futebol? A única coisa que me ocorre referir é o "lapsus linguae" do apresentador do Primeiro Jornal, Paulo Camacho, no dia em que Jorge Sampaio recebeu a fila indiana do pessoal dos clubes, das câmaras e do Governo (por esta ordem). Em vez de dizer Palácio de Belém, fugiu-lhe a língua e chamou-lhe "Estádio de Belém". O palácio presidencial transformado, contra vontade, em estádio de futebol. Está certo. Espero pelo próximo "lapsus linguae": o Palácio das Antas. Ou: da Luz. Ou: de Alvalade. Ou... Manhãs em flor e "reality shows" Pergunto-me se os leitores terão algum interesse em que eu critique todos aqueles programas novos que os canais generalistas apresentam. Vale a pena eu falar aos leitores - do PÚBLICO, leitores especiais - das conversas do Luís Ai Goucha, da Fátima Bomba Lopes, da Sofia Gémeas Alves? De todos esses sóis que quando nascem são pirosos? E falar dos "reality shows" agora que eles entraram na "normalidade" de processos e linguagem? Ganham os leitores alguma coisa com críticas a programas que não querem ver? Vale a pena "intelectualizar" os virginais diálogos das manhãs generalistas? Ou as mesquinhezes dos "reality shows"? Mas se calhar isto é desculpa minha! A verdade, meu caro bloco de notas, é que não me apetece ver estes programas. Mas isso não posso dizer aos leitores. |