“— Estás muito bonita! Fazes-me lembrar um tango de Arola que eu ouvia no cabaré Parda Flora, em Buenos Aires.
— Talvez houvesse por lá alguém parecido comigo?
— Não. É precisamente por não te pareceres com ninguém que gostaria de te encontrar sempre… em toda a parte…”
Depois deste breve diálogo, que culmina numa das mais belas declarações de amor da história da banda desenhada, faz-se silêncio sobre um grande plano do rosto de Corto Maltese, seguido da imagem de Pandora Groovesnore, filha de um grande armador. A resposta de Pandora surge a seguir, rápida, curta, incisiva:
“— Não iria consigo, Corto Maltese!”
O momento mágico em que tudo podia acontecer e em que o destino de Corto e Pandora fica traçado — o marinheiro deixa a Ilha Escondida num dia do mês de Janeiro de 1915 na companhia de Raspoutine, a jovem permanecerá ainda algum tempo antes de partir para Cap Cod com o irmão Cain— constitui o ponto final e culminante da aventura. Em “A Balada do Mar Salgado”o palco é o oceano Pacífico, espaço imenso que Pandora ocupa para marcar a vida do oficial alemão Slütter, do Monge, de Tarao,de Raspoutine, além do próprio Corto Maltese. Para Hugo Pratt, ela “é o personagem central”, explicando porquê: “Toda a gente está apaixonada por ela. É uma rapariga simpática e bela, que se torna adulta.
” Fisicamente, é muito parecida com Gisela Dester, uma mulher de origem alemã que Pratt conheceu na Argentina e com quem viveu a partir de 1955. Mas o seu nome “é uma alusão à mitologia grega, a Pandora, que punia os homens pelas suas pretensões, à lenda da ‘caixa de Pandora’”. Há também nesta escolha uma homenagem a uma australiana com o mesmo nome que o autor conheceu na Austrália: “Era filha de um armador, mas eu mudei o nome de família de Grosvenor para Groosvenore.”
|