As mulheres de Corto - Venexiana Stevenson

Entre a mulher implacável que Corto Maltese conheceu nas Honduras, em 1917 (encontra-a de novo, nesse ano, em Veneza), e a criatura frágil e digna de alguma comiseração que volta a avistar em 1921-1922, algures na Ásia Menor, não parece haver grandes elos de ligação. Todavia, num caso e noutro a personagem envolvida é a mesma, Venexiana Stevenson.

A sua coragem está à altura da sua falta de escrúpulos, qualidades que foram devidamente assinaladas numa célebre comunicação do professor Alphonse Lucas ao Congresso Internacional de Criminologia, em Lausana (Suíça), no ano de 1927. Tendo como referência dominante aquela aventureira, o académico evoca a “natureza criminosa” excepcional das criaturas “nascidas sob uma estrela fatal”, que são “bizarras, irritáveis, violentas, suportando dificilmente o freio da disciplina e mostrando-se, a maior parte das vezes, refractárias a qualquer educação”. Quanto a Venexiana Stevenson, “revelou uma precocidade precocidade e um ardor particularmente notáveis na devassidão”, a que se associa “um gosto pelo sangue e pelo assassínio”.

Em 1921, quando reencontra Corto Maltese, está grávida. Hugo Pratt não se deixa iludir com a sua aparente vulnerabilidade: “Penso que ela ainda pode ser perigosa, mas está secretamente apaixonada por Corto.” Esta leitura é de alguma forma corroborada pelas impressões de Venexiana acerca do herói:

“Escapou sempre aos meus tiros de revólver, aos carregadores esvaziados inutilmente. Mas não tenho a certeza de ter tido sempre boa pontaria. Normalmente, sou mais hábil a desembaraçar-me dos empecilhos e de todos aqueles que querem pôr entraves ao meu prazer com um saque mal conseguido. Admitamos que a minha mão tenha por vezes tremido no último momento em que me preparava para mandar para o outro mundo este vagabundo sedutor.”

Até à data, Venexiana Stevenson conseguiu sempre escapar à justiça.