Primeiro volume de “A Casa Dourada de Samarcanda”
Por: CARLOS PESSOA

A rota da seda liga a China ao Mediterrâneo. Corto Maltese empreende o caminho inverso, à procura de um tesouro. Conseguirá atingir os seus objectivos?

A extensa rota terrestre entre o Mediterrâneo e a fronteira do Império das Índias é uma das mais longas distâncias percorridas por Corto Maltese nos seus périplos aventureiros. Através da Ásia, continente onde se assistia na altura ao nascimento de três repúblicas — a Turquia, a URSS e o Irão —, esta viagem constitui um enorme teste à capacidade de o herói passar incólume através dos massacres,carnificinas e vinganças com que a Terra mata a sua infinita sede de sangue humano. Como se verá, o marinheiro é um espectador atento — e nunca indiferente — de tudo isto em “A Casa Dourada de Samarcanda”, banda desenhada da qual é hoje distribuído o primeiro volume com o PÚBLICO.

O herói parte de Rodes em Dezembro de 1921, em busca do mítico tesouro de Alexandre, “O Grande”. Nesse tempo, a viagem através de territórios sem lei nem ordem era muito perigosa. Mais arriscada ainda, quando era feita por um ocidental muito parecido com Chevket, um general turco aliado e amigo de Enver Pacha, antigo ministro da Guerra do seu país e responsável pelo holocausto arménio de 1915. No seu caminho, o herói cruza- se com velhos conhecidos — o oficial italiano António Sorrentino, que conhecera em 1917 em Veneza, e Venexiana Stevenson, que tenta em vão matá-lo outra vez. Sonha com Rasputine, que apodrece numa prisão de Samarcanda, com o seu “duplo” Chevket e com Pandora, que não voltou a ver desde que partiu da ilha Escondida, em 1915. Encontra-se pela primeira vez com Marianne e John Bull, comediantes que dão espectáculos para os soldados da frente oriental.

Em Janeiro de 1922, Corto atravessa a cidade de Adana e prossegue para leste. É brutalmente espancado quando assiste a uma sessão do teatro karagoz e acorda num camião de soldados curdos que se dirigem para Van, perto da fronteira entre o Curdistão e o Azerbaijão. É aqui que lhe pedem para levar para a Arménia russa uma criança cuja família foi assassinada. Porquê ele? Responde enigmaticamente o interlocutor de Corto: “Cada um escolhe o seu caminho e age de acordo com isso. Afinal, tudo é ‘kismet’.”