As mulheres de Corto - Louise Brookszowyc

“Recolhi-o ferido, velei-o durante três dias num quarto de uma velha moradia de Veneza. Sonhou e delirou, confessou sem dúvida alguns segredos, mas nessa altura eu não sabia nada da vida dele. Não passava para mim de um marinheiro anónimo, amigo de Pezinho de Prata, e não compreendia grande coisa dos pesadelos dele, que erravam de Mukden a Manaus, das Celebes às Caraíbas”. Nada desta evocação do primeiro encontro com o marinheiro de Malta consta das cartas que Louise Brookszowyc enviou anos mais tarde a Corto Maltese a partir da América do Sul, onde investigará – com as consequências funestas que todos poderão conhecer quando lerem “Tango”, a publicar dentro de algumas semanas pelo PÚBLICO – as redes que usam os guetos da Polónia “para alimentar de carne fresca os bordéis da Argentina”. Na verdade, o herói também nada sabia da bela mulher a quem deve a vida e que se apresenta como “Louise Brookszoycz de Varsóvia, mais conhecida por Sant’ Ambrogios, a bela de Milão”. Mas ele terá oportunidade de resgatar essa dívida ao encontrar em Buenos Aires uma filha de Louise que confiará depois a amigos venezianos.

A cumplicidade iniciada entre os dois personagens na aventura veneziana é complementar da admiração de Hugo Pratt pela actriz Louise Brooks. “Ela sempre foi uma das minhas actrizes preferidas e inspirei-me nela para um personagem da história de Corto Maltese ‘Fábula de Veneza’”, confessou um dia o criador italiano. No entanto, ao contrário do seu herói, Pratt terá oportunidade de se encontrar com a actriz anos mais tarde, em Rochester, nos Estados Unidos, em 1983. Era uma mulher frágil de 77 anos que vivia num pequeno apartamento, onde concedeu a Hugo Pratt a última entrevista. A sua homónima da banda desenhada teve uma vida bem menos longa e preenchida. Nascida em Varsóvia no ano de 1897, Louise Brookszowyc é assassinada em 1923 na capital argentina.