Corto Maltese é um
personagem estranho,
que pretende configurar
o homem ideal. É um
aventureiro cujos
empreendimentos acabam
sempre num final feliz,
por mais perigosas que
sejam as situações vividas
por ele. Como as histórias
têm sempre uma ligação
à história real, esta
banda desenhada é uma
boa ficção em termos
históricos concretos,
permitindo compreender
acontecimentos passados.
Mas tem também uma
vertente política que
explica por que razão foi
tão apreciada em alguns
países, como a França.
De um ponto de vista mais íntimo, Corto Maltese
faz-me lembrar um pouco
o chefe dos gauleses
de Astérix, mas com a
diferença que o escudo é
um boné e está em cima
da cabeça do personagem,
chegando mesmo a
haver alguém que lho vá
entregar quando o perde...
O herói é uma criatura
frágil do ponto de vista dos
afectos, nunca se envolve
emocionalmente, é irreal,
com uma perspectiva de
amores impossíveis, quase
assexuado. Não existir
nele uma construção
rigorosa ao nível
emocional e dos afectos é
a sua maior fragilidade.
E depois está sempre
irrepreensivelmente
vestido, mesmo quando
acaba de se salvar de um
naufrágio...
Quando falo da estranheza
de Corto Maltese, quero
dizer que é alguém que
não parece ter vida
interior própria, mas
apenas uma vida exterior
traduzida nas inúmeras
aventuras em que está
envolvido com o seu amigo
e cúmplice Rasputine.
Como se trata de um herói
cuja conduta se pauta por
valores que não se sabe
bem quais são, eu diria
que é um individualista
que não se integra num
sistema social concreto.
É por isso que pouco
importa se ele é uma
figura simpática ou não
aos olhos de todos, pois
o que interessa é que
leve a bom termo as suas
aventuras.
|