Durante sete dias singulares, Corto Maltese percorre a cidade misteriosa e mágica.
Como num sonho, procura a mítica esmeralda conhecida por “Clavícula de Salomão”
“Acontecem coisas inacreditáveis nesta
cidade”, diz Corto Maltese, estupefacto
por encontrar no seu bolso a esmeralda
conhecida por “Clavícula de Salomão”.
Ficção ou realidade, pouco importa, porque
este é o único epílogo que poderia
ter uma aventura como “Fábula de Veneza”,
a banda desenhada do marinheiro
de Malta que hoje é distribuída com o
PÚBLICO.
Numa narrativa que se desenvolve ao longo de sete dias singulares, o italiano
Hugo Pratt dá testemunho do seu “amor
por Veneza”, impregnando a cidade e os
seus habitantes de ocasião com uma
atmosfera simultaneamente misteriosa
e mágica. Sabe-se a razão sensível que
trouxe Corto de novo à cidade — decifrar
o enigma contido na carta que lhe foi
enviada pelo Barão Corvo, dando supostamente
acesso ao paradeiro da mítica
pedra preciosa. As pistas semeadas no
seu caminho propiciam ao herói uma deambulação
só aparentemente errante por Veneza, já dominada pelos fascistas e
onde os adeptos das escolas de cunho
iniciático — a começar pela Maçonaria
— têm cada vez maiores dificuldades
em se exprimir livremente.
Com um distanciamento que se tornou
a sua inconfundível imagem de marca, o
marinheiro não parece levar a sério nada
do que acontece, movimentando-se sempre
na subtil margem que distingue o real
do imaginado e a verdade da efabulação.
E, contudo, é bem concreta a perseguição
dos homens da “Sereníssima” e dos carabineiros,
assim como a queda que coloca
Corto Maltese entre a vida e a morte. É,
aliás, nesse limbo que ocorre um dos
mais belos registos oníricos da banda
desenhada traduzidos em imagens.
Tudo o que se passa em “Fábula de
Veneza”, publicada pela primeira vez
entre 3 de Julho e 23 de Dezembro de
1977 na revista italiana “L’ Europeo”,
não terá, afinal, passado de um sonho
— não é verdade que o herói acorda de
um sonho para entrar noutro e ainda outro,
numa sucessão de desvendamentos
que não parece terminar? Em todo o caso,
é um belíssimo sonho: tem o condão de
entreabrir discretamente a janela para
uma outra dimensão da realidade que
pode sempre ser franqueada. Basta que
se queira, afirma Corto Maltese.
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