Quase tão breve como a sua vida, assim é
o tempo de encontro, intenso e com muitos
silêncios significativos, de Marina Seminova
com Corto Maltese. O marinheiro tem
um vislumbre da beleza fria e sofisticada da
duquesa da Grande Rússia quando sobrevoa
o comboio em que ela se desloca pela imensidão
da Manchúria. Logo a seguir, o avião é
abatido e os dois tripulantes — Corto e o major
Jack Tippit, da Força Aérea dos Estados
Unidos — escapam por pouco a uma morte
brutal. Irritado, o marinheiro ouve com pouca
atenção as desculpas formais da aristocrata
e o diálogo que se segue com o oficial
americano. “Se me deixarem fora das
vossas histórias, fazem-me um grande
favor”, limita-se a dizer. Mas torna-se
evidente a corrente de simpatia que se
estabelece entre ambos e Corto Maltese
passa a ser afectuosamente conhecido
como “Cortushka”. Os sentimentos
da aristocrata russa são ambivalentes,
como deixou registado: “Ele tem a atitude de um aristocrata de grandes
origens. E noutras ocasiões ares de rufia.
Parece procurar a companhia das mulheres
e evitá-la ao mesmo tempo.”
Nascida em Kazan no ano de 1895,
Marina Seminova está em
Petrogrado em Março de
1917, na data em
que a família
imperial é
feita prisioneira
pela
revolução
em marcha. O ambiente torna-se muito perigoso
para os czaristas e Seminova foge para leste
em Agosto do mesmo ano. Um ano depois,
é conduzida ao tribunal revolucionário de
Ekaterinenburgo, acusada de conluio com
o Exército Branco e escapa por pouco a
uma condenação à morte. O fim da
velha ordem é já inevitável quando
a artilharia antiaérea do comboio
em que viajava abate o avião de
Tippit. Marina Seminova recorda
o episódio no seu diário, encontrado
entre os documentos de Wladimir Woyevodsky,
ex-oficial czarista e motorista de
táxi em Paris de 1921 a 1960: “Vinha com
ele um certo Corto Maltese, que diz ser
marinheiro britânico e que não deixa
de ter um certo estilo.”
Marina Seminova é atingida mortalmente
por Rasputine em Novembro de
1920 no entreposto de Karymskoïe, onde
se separam as linhas de caminhos-de-ferro
transiberiano e transmanchuriano.
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