O marinheiro de Malta está praticamente sozinho no seu percurso para os confi ns
da Ásia, onde tem como objectivo recuperar o tesouro imperial dos czares da Rússia.
Rasputine é o aliado do momento
Mandatado por uma misteriosa tríade chinesa, Corto Maltese atrevese
até aos confins da Sibéria na companhia de Rasputine, tecendo de
passagem uma ligação ambígua com Xangai-Li, uma guerrilheira do
Kuomintang que no final da aventura surge reconvertida à carreira
docente numa escola rural da China. É esse périplo que se inicia no
primeiro volume de “Corto Maltese na Sibéria”, que será distribuído
amanhã com o PÚBLICO. Esta longa aventura foi publicada pela
primeira vez entre Janeiro de 1974 e Julho de 1977 na revista italiana
“Linus”, mas com interrupções mais ou menos longas provocadas
pelas frequentes viagens de Hugo Pratt ou pelo seu envolvimento em
outros projectos, como a série de BD Os Escorpiões do Deserto.
Na perigosa viagem que o leva até aos confins da Ásia, Corto Maltese
aceita uma missão quase impossível que lhe é proposta pela sociedade
secreta chinesa das Lanternas Vermelhas — recuperar o tesouro da
família imperial russa que se encontra na posse do almirante Kolchak.
Tem contra si tudo e todos os que se encontram a leste de Moscovo. Ao
lado do herói está de novo Rasputine, que ele já não via há dois anos.A quem lhe perguntou um dia se essa era a forma de poder dizer tudo
o que queria — as coisas razoáveis na boca de Corto, as irreverentes
na do desertor russo —, Hugo Pratt limitou-se a responder:
“Há um que é imoral e o outro que é amoral. Corto sabe onde está
a moral mas por vezes, por conveniência, vai contra ela e torna-se
imoral. Rasputine nem sequer sabe o que é a moral.”
Ao contrário do que acontece em outras histórias da mesma
série, há nesta aventura mais acção, mais “mergulho” no tempo
histórico e na luta de classes. No entanto, o discreto perfume das
motivações pessoais impregnadas de razões menos “temporais”
já se faz sentir. Com a consciência de quem sabe que a realidade
sensível poderá não ser exactamente aquilo que é dado a ver pelos
órgãos dos sentidos, Corto Maltese prodigaliza um desprendimento
perante as certezas da vida que, em mais de uma situação, o ajuda a
resolver situações difíceis em que qualquer outro mortal sucumbiria.
Basta pensar nos seus perigosos encontros com o general Chang, a
duquesa Seminova e, sobretudo, com o cruel general Semenoff: o
tempo suspende o seu voo e instala-se o estado de excepção que dá
sentido ao gesto do herói.
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