Em termos estéticos, Hugo Pratt é um dos inventores da banda desenhada enquanto literatura. Introduziu uma figura retórica altamente expressiva que é o silêncio… Como isso, para mim, é o mais importante, deixo para os nossos marialvas o brinco na orelha do herói ou os diálogos pseudopoéticos das histórias. Os silêncios dramáticos da série permitem-nos ver logo que Pratt não só leu Emílio Salgari, mas também Samuel Beckett.
Quanto ao personagem Corto Maltese, todos nós gostamos dele porque é o Rick do filme “Casablanca”, mas mais bonito e mais próximo do humano. O facto de ele ser filho de uma cigana dá-lhe um toque de “gipsy king”, ou seja, alguém que não é boa pessoa mas que acaba por estar sempre do lado das causas perdidas. Corto é o lado adolescente que há em mim e que todos nós temos; isso não tem a ver com a sua efabulação — inexistente! — com as mulheres, mas com a relação que mantém com os homens que não são muito simpáticos. É fácil ter amizade com alguém que é bonito, loiro e rico. Ser amigo de alguém sem qualidades nenhumas e que é um psicopata — Rasputine — é muito interessante e constitui uma grande inovação. Fico contente por ver que as aventuras
são publicadas a preto
e branco. Como disse o
cineasta Wim Wenders
há muitos anos, o mundo é a cores, mas a preto e
branco é mais realista.
Os diálogos de Corto
Maltese são da mesma
cor do desenho e isso é
importante.
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