"As Duas Feras", de Howard Hawks
Nesta comédia hilariante, Katharine Hepburn faz tudo para conquistar o
coraçao de Cary Grant
No Museu de História Natural de Stuyvesant, junto a um esqueleto gigante de dinossauro, o paleontólogo David Huxley (Cary Grant) recebe a notícia de que encontraram o osso que lhe falta para completar o fóssil ao qual dedicou quatro anos de trabalho. Porém, a sua rotina está prestes a ser posta em causa e a culpa é dos caprichos de Susan Vance (Katharine Hepburn), uma jovem enérgica que o arrasta para um dia alucinante, com direito a furtos, mentiras inofensivas e perseguiçoes na floresta.
Em "As Duas Feras" (1938), o segundo filme da colecçao de DVD Clássicos Público, o amor é um território movediço, a matéria-prima ideal para a comédia "screwball", com diálogos acelerados e doses constantes de equívocos. Howard Hawks constrói uma teia de situaçoes ambíguas e dá uma visao irónica (para a época em que o filme foi lançado) das várias "batalhas" de uma "guerra dos sexos".
Como em qualquer romance irresistível, Susan conhece David por acaso, num dia em que o paleontólogo se encontra a jogar golfe com um advogado que lhe pode doar uma fortuna para o seu museu. O negócio nao vai correr bem, porque a jovem que teima em colocar-se no seu caminho decide amachucar-lhe o carro e dar-lhe "explicaçoes" de psicologia.
A situaçao complica-se quando Susan recebe como presente um leopardo (com o simpático nome de "Baby"), que, apesar de totalmente domesticado, é usado como elemento ameaçador para voltar a desestabilizar a vida de David e o forçar a deslocar-se a casa de campo da tia milionária (May Robson) da protagonista. Nas permanentes reviravoltas da história, o paleontólogo acaba por perder o osso que lhe faltava para completar o fóssil de dinossauro (uma "clavícula intercostal"), mas encontra a mulher da sua vida.
Nas semanas em que esteve em exibiçao no cinema, "As Duas Feras" gorou as expectativas comerciais e confirmou a alcunha de "veneno das bilheteiras " que, durante os anos 30, acompanhou a carreira de Katharine Hepburn. Mesmo assim, com o passar dos anos, o filme foi assumindo o estatuto de obra-prima e, hoje, é considerado um prodígio pela sua desenvoltura narrativa e pela "faísca" emocional dos protagonistas, Hepburn e Grant, o mesmo par dos filmes "Sylvia Scarlett" (1936), "A Irma da Minha Noiva" (1938) e "Casamento Escandaloso" (1940), todos de George Cukor.
Sob as directrizes de Howard Hawks, as duas estrelas transfiguram-se em nome dos valores alucinantes da comédia e nao hesitam em tropeçar, rebolar no chao, escavar buracos na terra ou cantar desafinadamente o tema "I can't give you anything but love" para amansar o leopardo "Baby". Apesar da presença do felino, as verdadeiras "feras" deste clássico sao os dois protagonistas. Capazes de se agarrarem com unhas e dentes aquilo que mais desejam.