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O GÉNESIS Jeová, por alcunha antiga o Padre EternoDeus muitíssimo padre e muito pouco eterno, Teve uma ideia suja, uma ideia infeliz: Pôs-se a esgaravatar coo dedo no nariz, Tirou desse nariz o que um nariz encerra. Deitou isso depois cá baixo, e fez-se a Terra. Em seguida tirou da cabeça o chapéu, Pô-lo em cima da Terra, e zás, formou o céu. Mas o chapéu azul do Padre-Omnipotente Era um velho penante, um penante indecente Já muito carcomido e muito esburacado, E eis aí porque o céu ficou todo estrelado. Depois o Criador (honra lhe seja feita!) Achou a sua obra uma obra imperfeita, Muito sarrafaçal, globo de fancaria, Que nem um aprendiz de Deus assinaria, E furioso escarrou no mundo sublunar E a saliva ao cair na Terra fez o mar. Depois, para que a Igreja arranjasse entre os povos Com bulas da cruzada, alguns cruzados novos, E Tartufo pudesse inda dessa maneira Jejuar sem comer de carne à sexta-feira Jeová fez então para a crença devota A enguia, o bacalhau e a pescada-marmota. Em seguida meteu a mão pelo sovaco, Mais profundo e maior que a caverna de Caco, E arrancando de lá parasitas estranhos, De toda a qualidade e todos os tamanhos, Lançou-os sobre a terra, e deste modo insonte Fez ele o megatéreo e fez o mastodonte. Depois para provar em suma quanto pode Um Criador, tirou dois pêlos do bigode, Cortou-os em milhões e milhões de bocados, (Obra em que ele estragou quatrocentos machados) Dispersou-os no globo, e foi desta maneira Que nasceu o carvalho, o plátano e a palmeira. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... Por fim com barro vil, assombro da olaria!, O que é que imaginais que o Criador faria? Um pote? não; um bicho, um bípede com rabo, A que uns chamam Adão e outros Simão. Ao cabo O pobre Criador sentindo-se já fraco, (Coitado, tinha feito o universo e um macaco Em seis dias!) pensou: Deixemo-nos de asneiras. Trago já uma dor horrível nas cadeiras, Fastio... Isto dá cabo até duma pessoa... Nada, toca a dormir uma sonata boa! Descalçou-se, tirou os óclos e o chinó. Pitadeou com delícia alguns trovões em pó, Abriu, para cair num sono repentino, O alfarrábio chamado o Livro do Destino, E enflanelando bem a carcaça caduca, Com barrete azul celeste até à nuca, Fez ortodoxamente o seu sinal da cruz Como qualquer de nós, tossiu, soprou à luz, E de pança prò ar, num repoiso bendito, Espojou-se, estirou-se ao longo do infinito Num imenso enxergão de névoa e luz doirada. E até hoje, que eu saiba, inda não fez mais nada. GUERRA JUNQUEIRO |
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