Direito sem resposta

Luís Filipe Menezes, deputado e presidente da distrital do Porto do PSD, fez-me chegar cópia do texto que - a propósito da polémica suscitada pelos cartazes afixados na cidade pela coligação PSD/PP - enviara, evocando o direito de resposta previsto na Lei de Imprensa, ao director do PÚBLICO. O deputado não solicita expressamente a intervenção do provedor do leitor, mas este não pretende reduzir-se ao papel de conhecedor da correspondência alheia. Desde logo por ser a primeira vez que alguém se queixa (termo exagerado, posto que, como já se referiu, LFM nada reclama) ao provedor por lhe ter sido negado o direito de resposta - o que também não é certo, posto que LFM, embora me escreva a 12 de Junho, não refere ter recebido carta, datada de 11, em que tal direito lhe era negado pelo director Nicolau Santos.
Simplificando a questão e ultrapassando os incontornáveis tempos necessários aos CTT's para pôr em contacto os cidadãos que, por dever de ofício ou por razões cada vez mais enigmáticas, teimam em recorrer ao género epistolar, vamos supor que um leitor se dirigia ao seu provedor por ter visto negado aquilo que julga ser o seu direito de resposta. Nesse caso, que faz o provedor? Responde particularmente ao queixoso, indicando a possibilidade de recurso à Alta Autoridade para a Comunicação Social, ou solicita à Direcção do jornal a publicação do texto?
Nem uma nem outra. O direito de resposta é um dos direitos dos leitores (pessoas singulares ou colectivas) que viram o seu nome impresso no jornal, ou que nele foram por qualquer outra forma referidos. E para que existe o provedor senão para defender tais direitos? Sem pretender sobrepor-se às decisões de outros órgãos chamados a intervir em nome do Direito, o provedor não pode fingir que o assunto lhe não diz respeito. Espera contudo poder escapar ao estatuto em que a prática jurídica transformou o Tribunal Constitucional e não ficar submerso por ³recursos² sistemáticos de quem se sentiu injustiçado no âmbito dos órgãos que a Lei de Imprensa define como competentes em matéria de direito de resposta. Esperança que aos leitores compete infirmar ou confirmar...

Findos os prolegómenos, vamos ao assunto. LFM sustenta que a coligação PSD/PP concorrente à Câmara do Porto tem toda a razão em atribuir, nos seus cartazes de campanha, a Fernando Gomes a frase "Até 97 haverá um tapete rolante, na Rua 31 de Janeiro" citada do PÚBLICO de 9/12/93 e de perguntar aos munícipes da cidade que nunca viram tal tapete: "Quem mente? é o Público ou é o Presidente." Por essa razão, LFM não gostou da Nota da Direcção publicada a 5/06/97 em que se exigia um pedido de desculpas da coligação pelo facto de ser "mentira que tal frase conste da edição [do PÚBLICO] de 9/12/93." E é nesse sentido que evoca o direito de resposta para, depois de expor com mais pormenores o que acaba de ser relatado, citar o título e o início do texto publicado pelo jornal a 9/12/93 e concluir: "Com estas elucidativas transcrições e sem mais polémicas, deixamos o juízo à inteligência do leitor."
Após parecer do consultor jurídico do PÚBLICO, Francisco Teixeira da Mota, Nicolau Santos nega o direito de resposta solicitado por o jornal não ter incorrido nem em ofensas directas nem ter publicitado facto inverídico ou erróneo.

Decisão criticável? Para que LFM se sinta portador de um direito de resposta, basta que se considere prejudicado por algum material dado à estampa. Assim o determina a lei. Mas a mesma lei concede um estreito espaço ao juízo da publicação supostamente prejudicial no reconhecimento, ou não, desse direito. O PÚBLICO foi o jornal que mais se insurgiu contra a anterior versão leonina da Lei de Imprensa nesta matéria. Mas é também o jornal que mais (e com maior destaque) direitos de resposta publica. E do ponto de vista ético fez bem em recusá-lo neste caso. Uma citação entre aspas não tem várias interpretações: significa que aquele a quem se a atribui a pronunciou. Ora, nunca o PÚBLICO atribuiu a "famosa" frase a Fernando Gomes. Não há, a partir da edição de 9/12/93, qualquer possibilidade de atribuir a Fernando Gomes a frase que surge citada nos cartazes do PSD/PP. Desta forma, apesar de LFM se sentir prejudicado pela Nota de Direcção impressa a 05/06/97, não há forma de se lhe reconhecer o direito de resposta que evoca.

Luís Filipe Menezes não se queixou ao provedor do leitor. Apenas lhe deu a conhecer que tinha evocado o direito de resposta. Apesar disto, o provedor dedica à questão boa parte da sua coluna. E, pior ainda, não lhe dá razão. Espero que LFM não conclua - mesmo que mantenha a sua tese - que escrever ao provedor do leitor do PÚBLICO é sinónimo de ver correspondência pessoal aberta na praça pública e defendida como boa a negação daquilo que exige à Direcção do jornal. Sem ironias: o provedor não podia fingir desconhecer que lhe haviam recusado reconhecer o que solicitava, pois não?

De Vila Nova de Famalicão escreve o leitor António Cândido de Oliveira: "A não ser que o jornalista tenha omitido passagens ou coisas ditas em Œoff¹; a não ser que o jornalista e os responsáveis do jornal (que assumem os títulos) saibam muito mais coisas que não dizem", o título "Beijo de Judas" com que na primeira página da edição de 8/06/97 se chamava a atenção para a entrevista a José Luís Judas "é um exagero e um abuso." E, continua o leitor, se o PÚBLICO sabia mais do que o que deu a conhecer, "ainda o título é infeliz porque feito a partir de coisas que não são reveladas." O título da primeira página é um exagero "porque fazer críticas a um partido, no qual se está filiado, não é traição a esse partido." E é um "abuso, porque é censurável utilizar o nome ou apelido que uma pessoa tem (e que não escolheu sequer!) para o relacionar com um triste episódio de traição na paixão de Cristo."
A pontaria certeira do leitor e a sua concisão lapidar dispensam quaisquer outras palavras do provedor.


Texto de Jorge Wemans

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