Um provedor para quem?

Jorge Wemans

Para que serve o provedor do leitor? O estatuto que se publica nesta mesma página dá conta das razões e objectivos que presidiram à sua instituição e define as suas competências. A pergunta pode, contudo, levar-nos mais longe, se entendida como desafio: "Mas o provedor serve mesmo para alguma coisa?" Ou, como no final do ano passado um leitor escrevia ao "ombudsman" do jornal "Folha de São Paulo", Marcelo Leite: "Todos os domingos o senhor inunda a "Folha" com críticas que em parte contemplam a indignação da semana. No entanto, além de apaziguar os ânimos dos leitores indignados, o que é uma função comercialmente importante, suponho, qual é na verdade a sua função nesse jornal, se as suas críticas parecem solenemente ignoradas?"

Não. As críticas não são ignoradas, mas nenhum jornal, nem nenhum jornalista, deixa de cometer erros, ou de fazer escolhas erradas no plano deontológico, só por ter um provedor do leitor. Já este terá perfeita razão de existir, se, ao tornar pública a sua reflexão quanto aos erros de hoje, conseguir evitar a sua tranquila repetição amanhã. Porque a deontologia do jornalista não é uma prática abstracta nem uma ciência exacta: é um campo de escolhas e de juízos que não admite o desleixo e a leviandade, mas não expurga a possibilidade do juízo erróneo.

Como é sabido, "os médicos enterram os seus erros, os advogados enforcam os seus, enquanto os jornalistas publicam os erros que cometem". É nesta exposição pública permanente - a que, no caso do PÚBLICO, se acrescenta a personalização pelo facto de a maioria dos textos editados serem assinados pelo seu autor - que se fortalece o perverso comportamento de nunca aceitar que se errou. "Errar é humano, não admitir o erro é jornalismo", dizem os hipercríticos da imprensa. Quem durante 18 anos viveu o dia-a-dia desta profissão não pode ignorar a frequência com que a sobranceria jornalística se impõe ao justo reconhecimento das razões e da verdade que assiste a leitores, fontes ou visados. Conseguir que os jornalistas desta casa e os leitores deste jornal pratiquem e saibam que "errar é humano e admitir publicamente que o erro é jornalismo" sintetiza todo um programa para o provedor do leitor. Porque o jornalismo não é o registo cinzento e burocrático das verdades oficiais, mas a revelação das verdades que se escondem do público, ele é feito de risco, investigação e capacidade para interpretar o presente e antecipar o futuro. E o provedor não serve para castrar o jornalismo. Assim como não basta para garantir o bom jornalismo. Só pode, tal como a deontologia, chamar a atenção para que o mau jornalismo é isso mesmo: mau jornalismo.

Em vários órgãos de comunicação social o provedor do leitor é denominado "ombudsman". É uma palavra escandinava que designava a pessoa escolhida pela comunidade local para, durante os longos Invernos, zelar para que a neve, o gelo e a porcaria fossem removidos das ruas e as chaminés se mantivessem desobstruídas. O conceito ilumina na perfeição o papel do provedor do leitor. Não na sua vertente de limpa-chaminés, mas no sentido de que este deve ser um varredor das barreiras que se erguem entre os leitores e o jornal. O provedor serve para ouvir as queixas dos leitores e obrigar os jornalistas a levarem-nas a sério e a responderem-lhes. Sem deixar, ele próprio e com total independência, de sobre cada caso formular recomendações aos jornalistas e à direcção do jornal. Porém, as barreiras que é preciso remover nem sempre se apresentam sob a forma de conflitos. Barreiras múltiplas nascem do simples desconhecimento que torna opacos (quando não suspeitos) os processos, as razões e as decisões que antecederam a publicação de uma notícia. O provedor serve para remover essas suspeitas, tornando claro aquilo que era desconhecido dos leitores.

Charles W. Bailey, editor do "Minneapolis Tribune", disse ao empossar o primeiro provedor do leitor do jornal: "O papel do "ombudsman" não é o de se fazer popular ou amado. Nem a ele próprio, nem ao editor, nem mesmo ao próprio jornal. A função do "ombudsman" é a de recuperar ou de manter o respeito dos leitores pelo seu jornal. Não é um objectivo completamente desinteressado. No longo prazo, o respeito é o único sentimento que manterá o público a ler, a acreditar, a apoiar - e a comprar - um jornal." O respeito pelo PÚBLICO depende dos jornalistas que o fazem. O provedor procurará ser para os leitores do PÚBLICO um ouvido atento e um acréscimo de transparência.

Façam favor...

Contactos do provedor do leitor:

Cartas: Rua Amílcar Cabral, Lt. 1 - 1750 Lisboa

Fax: (01) 758 71 38

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