Notícias do Interior
Por JOAQUIM FIDALGO
Domingo, 18 de Fevereiro
de 2001 Pode bem dizer-se que o PÚBLICO é um jornal ambicioso. Mostrou-o
claramente desde o início, já lá vão onze anos: não pretendendo ser um jornal para
toda a gente (ideia fantasiosa de alguns que já ocasionou meteóricos desastres na
imprensa portuguesa...), desejava chegar a um alargado número de leitores, criando
motivos de interesse suficientemente diversificados para que neles se revisse um público
plural.
Exemplo particularmente visível dessa intenção é o facto de o PÚBLICO editar, a bem
dizer, dois jornais por dia: um dedicado às grandes questões nacionais e internacionais,
outro às temáticas locais e regionais - neste caso, com matérias diferenciadas
consoante se esteja nas metades Norte ou Sul do país. Não é que almeje ser, ao mesmo
tempo ou no mesmo plano, um grande diário nacional e um exaustivo diário regional. Di-lo
a própria dimensão dos cadernos "locais" e di-lo também a preponderância,
neste domínio, do noticiário oriundo das duas grandes conglomerações urbanas
polarizadas por Lisboa e pelo Porto. O próprio nome para aí aponta: Local Lisboa e Local
Porto/Norte.
Decorre daqui que um cidadão do Porto ou de Lisboa, ou de concelhosdas respectivas áreas
metropolitanas, tem muito mais hipóteses de encontrar ,diariamente, nas páginas deste
"seu" jornal, informação relativa às zonas onde habita, do que um morador de
Bragança, Viseu, Castelo Branco, Portalegre ou Beja. Ou... Covilhã.
Pois foi precisamente um leitor da Covilhã, Pedro Santos, que dirigiu ao provedor um
conjunto de reflexões sobre a componente "local" do PÚBLICO e sobre a
situação particular das zonas interiores do país.
Ele próprio mostra compreender as limitações de um projecto editorial como o do
PÚBLICO que, embora sem descurar alguma informação local e regional, ocupa boa parte do
seu espaço com assuntos de âmbito mais global - sejam do país ou do mundo. "Bem
sei que não estou à espera de ser informado das notícias da minha região (Covilhã e
restante Beira mais interior) através do PÚBLICO; para isso disponho, felizmente, de uma
imprensa regional diversificada e de qualidade", diz o leitor.
Não obstante, há alguns anacronismos que este figurino não resolpveu e que assumem
especial acuidade no caso da Covilhã, por ser uma zona, digamos, de fronteira entre o
Norte e o Sul. Pedro Santos, por exemplo, entende mal que na sua cidade seja recebida a
edição Lisboa do PÚBLICO, com o correspondente caderno Local, porque isso lhe dá
alguma informação sobre a zona da capital mas, em contrapartida, priva-o de saber o que
se passa em zonas bem mais próximas como Guarda, Viseu ou até Coimbra - e cuja cobertura
noticiosa é feita pelo Local Porto/Norte. Para complicar, sucede que as distribuidoras
nem todas traçam a linha "de fronteira" exactamente pelo mesmo sítio, o que
provoca que a Covilhã ora seja abastecida pelos jornais de Lisboa, ora pelos jornais do
Porto...
Um outro problema é suscitado pelo facto de o Local Lisboa ter (ao contrário do seu
congénere nortenho) uma política mais restritiva no que toca às chamadas informações
úteis. Dá razoável informação sobre os cinemas de muitas localidades fora de Lisboa
mas, no que toca a outros espectáculos ou eventos, confina-se à Grande Lisboa. E quanto
a farmácias, a mesma coisa: o mais longe que vai é Setúbal, quando o Local Porto, em
contrapartida, indica as farmácias de serviço de todas as principais localidades da
metade Norte (e parte do Centro) do país. Assim, o leitor da Covilhã, ao consultar a
página de cinemas, constata que "a única localidade beirã presente [no
Local/Lisboa] é Pombal". E se quer ir à farmácia de noite, a mais próxima de que
tem informação no "seu" jornal está em... Aveiras de Cima! "Não seria
de rever a natureza dos vossos cadernos locais?", questiona.
A questão é pertinente, embora não seja fácil. Aliás, provocou muitas dores de
cabeça na fase de preparação do lançamento do PÚBLICO, pois já se sabia que a
ambição de fazer um jornal "dois em um" se arriscava a cometer injustiças.
É evidente que este projecto editorial específico fez opções, a começar por
introduzir uma componente de informação local e regional aprofundada e exigente, mas
selectiva: foram seleccionados objectivos de cobertura prioritária das áreas
metropolitanas de Lisboa e Porto, seguidas de perto por algumas outras localidades de
maior densidade populacional da faixa mais litoral: Braga, Aveiro, Coimbra, Setúbal,
Faro. Não foi por acaso que o PÚBLICO aí instalou as suas primeiras delegações (tendo
depois surgido Vila Real e o Funchal), sem prejuízo de tentar criar uma rede de
correspondentes regionais por todo o país.
Se, para estes conglomerados urbanos, o jornal consegue assegurar razoavelmente o chamado
"noticiário de proximidade", com um acompanhamento quase diário dos
acontecimentos mais relevantes (mas sem com isso chegar, claro, ao pormenor de um jornal
de vocação tipicamente regional), a verdade é que não conseguiria fazê-lo para, por
exemplo, a generalidade das capitais de distrito. Ou, a fazê-lo, seria um projecto
editorial diverso do actual, onde as temáticas nacionais e internacionais - da política,
da economia, da cultura, da ciência, do desporto - têm lugar preponderante.
Não obstante, talvez seja possível melhorar o actual modelo. Veja-se o caso das
farmácias de serviço, uma informação de inquestionável utilidade. Se o Local Porto
consegue dar essas indicações no que respeita a todo o Norte do país, talvez o Local
Lisboa pudesse fazê-lo também para o Sul. O director-adjunto, Nuno Pacheco, concorda que
a lacuna deve ser colmatada - embora olhe com mais reservas (até por razões de espaço,
dada a concentração enorme de oferta em Lisboa) a possibilidade de o PÚBLICO informar
diariamente sobre teatros, exposições, concertos, etc., relativos a todo o Sul do país.
Mais ambicioso poderia ser o projecto de multiplicar, para outras zonas do país, aquilo
que o jornal hoje faz com os cadernos locais Porto/Norte e Lisboa. É o que, afinal,
sugere o leitor Pedro Santos: a eventual criação de um caderno autónomo dedicado à
zona Centro do país (um "Local Coimbra/Centro"), que concentraria a
informação regional da faixa beirã, do litoral ao interior.
Aqui fica o desafio - que nem é totalmente novo. No entretanto, talvez os responsáveis
dos dois cadernos locais pudessem concertar-se para que o noticiário relativo às Beiras
saísse simultaneamente em ambas as edições, de modo a que os leitores das zonas
"de fronteira" não corram o risco de saber o que se passa a 300 quilómetros
mas não o que se passa a 30.
EM SÍNTESE
Local - Assim como há um Local Lisboa e um Local Porto/Norte, não faria sentido um Local
Coimbra/Beiras?
Covilhã - As zonas "de fronteira" devem receber a edição Norte ou a edição
Sul do jornal?
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