Em Defesa de Quem?
Domingo, 30 de Julho de
2000 Há um ano, quando se iniciou esta função de provedor, dizia-se
aqui em jeito de intróito: "Há muito quem se mostre céptico, e por muito
respeitáveis razões, quanto à figura do provedor do leitor". E noutra passagem:
"As boas intenções também contam, pois são elas que abrem caminho e dão a
imprescindível margem de liberdade; mas a prova final há-de vir da prática quotidiana
no exercício do cargo".
Passados estes meses, pode dizer-se que algumas das previsões se confirmaram. Se houve
quem tenha apreciado as intervenções semanais do provedor ou a sua simples existência
(se mais não fosse, porque os contactos com o jornal passaram a dispor de um novo
interlocutor e, por regra, as questões apresentadas pelos leitores nunca ficaram sem
resposta), também houve quem tenha confirmado o seu cepticismo.
Considerar o provedor como um complacente "desculpabilizador" dos jornalistas
ou um empenhado "defensor dos seus companheiros de ofício", interrogar-se sobre
se este é "um provedor dos leitores do PÚBLICO" ou "um provedor do jornal
PÚBLICO", apodá-lo de "brilhante passa-culpas de casos onde à primeira vista
não há desculpa", são alguns exemplos de críticas recebidas, normalmente
associadas a opiniões ou juízos de que se discordou. Houve também quem sugerisse que o
provedor devia demitir-se, pois o jornal pouco caso faria das suas recomendações, atenta
a repetição de lapsos ou erros para os quais chamou a atenção.
Mesmo nem sempre muito alicerçadas em factos concretos, as críticas suscitaram,
naturalmente, reflexão, e irão ajudando a que este cargo seja desempenhado cada vez
melhor. Aprende-se com o fazer, aprende-se com o ouvir, aprende-se com o conversar. Ainda
assim, talvez seja útil, neste intervalo, recordar alguns dos princípios orientadores da
função - e que, mesmo com hesitações ou falhas, são os que, em boa fé, se procura
aplicar na prática.
Mais do que um "defensor" dos jornalistas ou dos leitores, o provedor é um
"mediador" entre uns e outros. Quer tornar mais transparentes para os segundos
os meandros profissionais dos primeiros, e para os primeiros as razões de queixa ou as
expectativas dos segundos. Quer que os jornalistas assumam sem arrogância os seus lapsos
e se abram às opiniões de quem lê diariamente o seu trabalho, mas quer também que os
leitores entendam melhor a complexidade de muitas das decisões que se tomam num jornal.
Não quer "desculpar" erros mas também não se vê, por mais fácil que fosse o
caminho, a cair na demagogia de culpar a torto e a direito, sem procurar indagar das
origens ou circunstâncias concretas dos erros. Apontar as falhas é importante; mas mais
importante é compreender e expor os seus porquês, ajudando a criar condições (de
atenção interna, de rotinas organizativas, de espírito crítico, de controlo de
qualidade) para que elas não se repitam. E, nesse sentido, as contribuições atentas dos
leitores têm provado ser de um enorme valor, sendo certo que foi sempre a partir delas
que aqui se procurou reflectir.
O provedor é, de facto, um defensor do jornal - não do jornal tal como está, mas do
jornal tal como se quer e deve fazer, com mais rigor, mais interesse, mais qualidade.
Trabalhar por um PÚBLICO assim não é, afinal, a melhor maneira de defender os
interesses de quem o compra e lê? Desse objectivo o provedor não desiste. Não desistam
também os leitores. |