Um Título, Um Topónimo e Alguns Apelos
Por JOAQUIM FIDALGO
Domingo, 30 de Abril de
2000 Se eu pego no jornal e leio, em título, algo como "Gás natural
mais barato", fico persuadido de que a minha conta de gás vai baixar. E até corro a
ler o texto, procurando saber pormenores. Foi o que fez o leitor Luis Veiga, já lá vai
quase um mês, quando o PÚBLICO (edição de 31/3) deu conta de uma previsível descido
do preço do gás, acompanhando um anunciado aumento de produção - e consequente baixa
de preço - do petróleo.
E que leu, depois do título, este nosso leitor? Leu que, de facto, se admitia uma
baixa do preço do barril de petróleo até aos 20 dólares e, confirmando-se essa baixa,
o gás natural iria ficar também mais barato. Mas... quando? Possívelmente no segundo
semestre do ano em curso, como referia o presidente de empresa distribuidora deste
combustível. Só que, no imediato, o gás natural não ia baixar de preço. Pelo
contrário, até ia aumentar. O texto da notícia o dizia bem clarinho: para o trimestre a
iniciar em 1 de Abril, fora já estabelecido um agravamento de custo para os clientes
domésticos na ordem dos oito por cento, e para clientes industriais na ordem dos 10 a 15
por cento. Ou seja: o título aludia a uma realidade que se concretizaria daí a três
meses, mas, entretanto, estava à porta uma outra realidade bastante mais crua. Afinal, o
gás natural ia ficar de certeza mais caro no dia seguinte, e só provavelmente mais
barato daí a três meses...
O leitor Luis Veiga sentiu-se enganado por este título - e tem a sua razão. Não é
que a notícia estivesse incorrecta; ela até explicava tudo ao pormenor . Mais: no
próprio antetítulo, dizia-se que o "aumento de produção decidido pela OPEP"
provocaria "descida a partir de Julho". Mas, olhando para a página do jornal, o
que realmente saltava à vista na força das suas cinco colunas era a apetitosa boa-nova:
"Gás natural mais barato". As expectativas suscitadas por um título assim
eram, em boa verdade, defraudadas pelo seguimento do texto. Não só o preço não ia
baixar no curto prazo - ao invés, até ia subir!... -, como a promessa de embaratecimento
se baseava apenas nas conjecturas de uma empresa do sector.
Os títulos têm este perigo: curtos, sintéticos, incisivos, arriscam-se por vezes a
dizer mais (ou menos) do que devem. E é complicada também a opção de "puxar"
para título esta ideia em vez daquela. No caso em apreço, podia perfeitamente ter-se
escrito "Gás natural mais barato" (subentendendo-se "a partir de
Julho"), ou "Gás natural mais caro" (subentendendo-se "a partir de
amanhã"). Este último era obviamente mais próximo. O outro, passe a ironia, talvez
fosse mais "notícia": estamos já tão habituados a que os preços subam que
só há real novidade quando se anuncia que eles baixam... O pior é se é só anúncio de
boa intenção. Já agora, em Julho lá veremos para que preço vai o gás!
A grafia dos topónimos estrangeiros não é assunto consensual, muito longe disso. Há
jornais que optam por escrever os nomes de países e cidades claramente "à
portuguesa" (embora já rareiem os exageros dos puristas que levavam, por exemplo, a
chamar Mogúncia à cidade alemã de Mainz, com isso deixando desorientado qualquer
cidadão de mediana cultura geográfica...), há outros que preferem escrevê-las tal qual
segundo a língua de origem ou com ligeiras adaptações ao português. Para além das
regras gramaticais, passam por aqui opções, convenções, que os jornais adoptam com
mais ou menos lógica, não sendo fácil dizer que esta grafia está certa e aquela
errada.
O PÚBLICO, por exemplo, decidiu chamar (e escrever) Tchechénia àquela região do
Cáucaso cujo conflito armado com a Rússia, em prol da independência, a tem chamado
quase todos os dias à actualidade. Ora o leitor António Carvalho considera tratar-se de
um "erro linguístico", defendendo que, em português, a palavra deveria
escrever-se - como outros jornais, de facto, fazem - Chechénia. E aduz um argumento por
comparação: "Também não escrevem República Tcheca, ou escrevem?".
A palavra Tchechénia não consta do glossário do Livro de Estilo do PÚBLICO - o que
não espanta pois, à data em que ele foi elaborado, o topónimo não era ainda de uso
corrente nos jornais. Em contrapartida, aparece uma outra palavra grafada de modo similar:
Tchernobil, nome da cidade russa onde aconteceu uma enorme tragédia com um reactor
nuclear. Também neste caso, sabemos que outros jornais preferem "Chernobil".
O exemplo talvez nos ajude a perceber qual a lógica seguida no periódico, e que o
responsável do sector de "copy desks", José Imaginário, explica:
"Escrevemos Tchechénia, como outras palavras eslavas, de acordo com critérios que
as façam aproximar da pronúncia indígena. No caso da Tchechénia, como noutros afins,
foi o jornalista José Milhazes [correspondente do PÚBLICO em Moscovo] que nos forneceu
uma listagem com a indicação das grafias mais correctas e mais próximas
foneticamente".
Há, portanto, uma lógica. Há um critério. É discutível, podia ser trocado por
outros critérios, mas parece legítimo. Ainda que alguns leitores, legitimamente também,
preferissem grafia diversa, mais "portuguesa". Até porque só o critério da
proximidade fonética, se aplicado à generalidade dos topónimos estrangeiros, talvez nos
levasse muito longe...
Tentando "pôr em dia" algumas reclamações mais antigas chegadas dos
leitores, e de que nem sempre é possível dar eco imediato, acolhe-se a crítica de
Francisco Artur Vieira de que, nos "links" do PÚBLICO Online alusivos à
religião, "nada [encontrou] que não fosse sobre Bíblia e Vaticano". E
pergunta: "Para religião é muito pouco, não concordam?".
Concordamos, sim senhor. E também concorda o editor do PÚBLICO Online, José Vítor
Malheiros: "É realmente muito pouco e, para mais, oferece uma perspectiva algo
estreita das religiões. (...) A escassez de 'sites' recomendados deve-se ao facto de
apenas querermos recomendar serviços que nos pareçam particularmente interessantes e de
estes não aparecerem às catadupas. Mas é evidente que, neste caso, não foi feito um
enorme esforço de pesquisa. Vamos tentar ampliar rapidamente as nossas sugestões".
O editor deixa ainda um apelo ao leitor, que gostosamente se reproduz: "Sinta-se à
vontade para nos sugerir 'links' que lhe pareçam interessantes, na religião ou noutros
temas". Força, então.
A terminar, duas sugestões de dois leitores, que aqui ficam para consideração de
quem de direito. José Summavielle gostaria que as "Palavras Cruzadas" não
aparecessem por vezes com uma letra "tão reduzida que só uma boa lupa permitirá a
tentativa de resolução dos problemas...". Lembra, aliás, que muitos dos
"viciados" neste passatempo são "pessoas a quem o tempo e a idade
sobram". Michel Resnikoff, por seu lado, pede aos críticos de cinema do PÚBLICO que
escrevam "de modo mais compreensível para o cidadão comum". Quando procura,
nestas páginas, orientação para as suas escolhas cinematográficas, nem sempre entende
(às vezes, bem longe disso...) o que o crítico quer dizer. E não será só ele, pois
não?
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