Todos Iguais, Todos Diferentes
Por JOAQUIM FIDALGO
Domingo, 7 de Novembro de
1999 Há muito quem diga que "os jornais são todos iguais".
Iguais nos temas que resolvem tratar; iguais na escolha dos assuntos que chamam à
primeira página; iguais no modo como abordam e desenvolvem certas matérias; iguais nos
"especialistas" a quem pedem comentários sobre a actualidade.
É verdade? Em parte será - e por motivos plausíveis. Se a obrigação primeira de um
jornal diário é dar uma visão o mais completa possível do que aconteceu na véspera,
os "assuntos do dia" serão muitas vezes coincidentes. Se se discute na
Assembleia da República o programa do novo Governo, e para mais se se tem dúvidas sobre
o desfecho do debate, é bem certo que esse tema ocupará a zona nobre do noticiário
político da maioria dos jornais.
Porém, como é fácil de ver, esta semelhança de partida não significa que a
abordagem jornalística do tema seja igual. Longe disso. É aqui precisamente que radica a
possibilidade (e a vantagem) de escolha dos leitores face a projectos editoriais diversos:
sobre um mesmo assunto, o jornal A faz determinadas escolhas, dá mais importância a este
aspecto, aprofunda aquela informação, diferencia graficamente um ou outro ponto, propõe
afinal uma certa "leitura" da realidade, e o jornal B faz outras escolhas,
outras interpretações, outra "leitura". Até porque os responsáveis pelo
trabalho em cada uma das publicações são jornalistas diferentes, e obviamente os seus
textos ou fotos reflectem essa diversidade. Ainda bem, em nome da liberdade e do
pluralismo.
Pois foi sobre este pluralismo diferenciador de opções editoriais que se interrogou o
leitor Domingos Moreira quando, no passado dia 1/11, olhou para as primeiras páginas de
"dois jornais de referência" - o PÚBLICO e o "Diário de Notícias"
- e viu como eram parecidas. Uma e outra ocupavam boa metade do espaço exactamente com a
mesma fotografia: a de uma procissão em Díli, capital de Timor-Leste. "Os leitores
de um jornal escolhem-no pelo grafismo (...) mas também pelo conteúdo. A minha opção
pelo PÚBLICO é o conteúdo! Se as notícias são as mesmas, se as fotos são as
mesmas...", queixa-se o leitor, apelando: "Eu quero e exijo do PÚBLICO uma
identidade própria".
Diga-se desde já que, ao contrário do sugerido por Domingos Moreira, a reportagem
(escrita) sobre a procissão em Díli é tudo menos igual nos dois jornais, pois quer um
quer outro cobriram o acontecimento com os respectivos enviados especiais que têm em
Timor. A fotografia da capa, essa sim, é rigorosamente a mesma. E , ao contrário do
texto, provém de agências internacionais.
Nuno Pacheco, director-adjunto do PÚBLICO, explica: "Não é, de facto,
agradável ver duas fotos iguais em jornais que procuram afirmar a sua distinção, mas
isso é dificilmente evitável quando a fonte é a mesma (as agências noticiosas) e não
há muito por onde escolher, como foi o caso". A única forma de evitar
duplicações, diz ainda Nuno Pacheco, "seria o PÚBLICO ter fotógrafos seus sempre
no terreno" - como, de resto, já teve em Timor-Leste; mas isso "seria
economicamente incomportável, não só para o PÚBLICO como para qualquer jornal, pelo
que o recurso às agência noticiosas (onde há excelentes fotógrafos, aliás) acaba por
se tornar inevitável".
Os responsáveis do PÚBLICO e do "Diário de Notícias" devem ter, neste
caso, raciocinado de modo semelhante: decidindo dar destaque na primeira página à
concorridíssima procissão de Díli, por entenderem que era o grande acontecimento do
dia, viram o que havia nas agências e escolheram a que lhes pareceu ser a melhor imagem.
Coincidiram. É algo que, de resto, pode suceder com alguma frequência quando se trata de
assuntos internacionais. E não só nos jornais: se espreitarmos os noticiários dos
diversos canais televisivos em dia de acontecimento forte na cena internacional, é muito
provável que vejamos a mesma sucessão de imagens repetida na RTP, na SIC, na TVI. Mas
nem por isso dizemos que os noticiários foram iguais: a imagem é apenas uma parte do
tratamento informativo das questões.
Todos os jornais recorrem, em maior ou menor grau, aos materiais (textos e fotos) que
recebem das agências noticiosas, nacionais ou internacionais. Nem de outro modo poderiam
funcionar: nenhum consegue ter jornalistas seus em todos os sítios, do país ou do mundo,
onde haja algo importante a passar-se. Seria bom, até para permitir sobre as questões um
olhar próprio, mas é inviável.
Ainda assim, a situação portuguesa é, hoje, incomparavelmente melhor do que há uma
dúzia de anos, quando boa parte dos jornais (sobretudo diários) só excepcionalmente
enviava jornalistas seus a cobrir importantes acontecimentos, por causa dos custos. Os
jornais eram, então, muito mais iguais do que hoje - mesmo que alguns, procurando
ostentar uma falsa diferença, "reescrevessem" os textos recebidos das agências
(e, como é de elementar regra deontológica, nem sequer lhes identificassem a
proveniência), fazendo-os de algum modo passar por composições próprias. Ainda hoje
alguns resquícios desta "arte" espreitarão por aí, e só não são mais
evidentes porque boa parte das pessoas lê apenas um jornal, faltando assim o termo de
comparação. Mas quem diariamente olhe por vários, constatará...
O exemplo de Timor-Leste, mesmo sabendo-se da sua excepcional força mobilizadora, é
bem elucidativo da mudança operada entre nós, no que toca à Comunicação Social e à
vontade de cada título afirmar a sua identidade. Atesta-o a quantidade de jornais,
rádios e televisões que enviaram para o território jornalistas seus, acrescentando o
tal olhar próprio à cobertura naturalmente mais impessoal (embora útil e
necessária)das agências noticiosas.
Também de fotografia falavam, esta semana, outras reclamações que chegaram ao
provedor pelo facto de a série "As 100 fotos do século", publicada na
PÚBLICA, não estar disponível no PÚBLICO On-Line. Houve até sugestões para que o
jornal publicasse em livro, ou em coleccionável, essa excelente série, pois trata-se de
documentos que muitos gostariam de guardar. Esclarece a Direcção que, por força do
contrato de aquisição daquele conjunto, o PÚBLICO não pode utilizá-lo noutro suporte
que não seja o jornal. Mas há a informação de que uma outra entidade se prepara para
lançar, no mercado português, um livro com as fotos do século e respectivos textos.
Contactos do provedor do leitor:
Cartas: Rua João de Barros, 265 - 4150-414 PORTO
Telefones: 22-6151000; 21-7501075
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