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O Que É, Ou Não É, Notícia?
Por JOAQUIM FIDALGO
Domingo, 10 de Outubro de 1999

Talvez seja esta a pergunta mais frequentemente colocada a um jornalista, quando se trata de discutir e entender os meandros do mundo complexo da informação: o que é que faz com que um dado acontecimento "seja notícia" e outro não o seja? Dito de diferente modo: como procede um jornal para fazer uma selecção dentro do enorme caudal de assuntos potencialmente noticiáveis, escolhendo publicar isto mas ignorar aquilo?

Sendo das perguntas mais repetidas e debatidas, nem por isso tem resposta fácil ou óbvia. Bem pelo contrário... Nesta matéria há, de princípio, algumas regras comummente partilhadas, mas o mais relevante acaba por ser o modo como determinadas pessoas concretas, em projectos editoriais concretos, em momentos concretos, interpretam essas regras e fazem as consequentes opções.

Se há, hoje em dia, tarefa exigente para um jornalista (e, por maioria de razão, para um director ou editor), é a necessidade de constantemente seleccionar. Não é só decidir fazer ou não fazer notícia de determinado acontecimento; é decidir, depois, se dele nascerá um texto grande ou um breve registo, se terá ou não fotografia, se vai numa página mais "nobre" ou mais "pobre", se tem título graficamente forte ou fraco, se merece referência na primeira página... E tudo isto são escolhas, decisões, riscos. Nada disto é automático. Mais: nada disto se faz do mesmo modo em todos os meios de comunicação, nem sequer em todos os jornais, nem em todas as áreas do mesmo jornal...

Não estamos, obviamente, em terrenos de puro arbítrio ou de abandono cego às subjectividades. A própria tradução (necessariamente subjectiva) de um conjunto de regras não é um mero exercício pessoal, dependente dos gostos do jornalista: pelo contrário, ele tenta, em cada situação, interpretar o que mais se adequa ao projecto editorial em que trabalha e o que importa / interessa ao maior número possível dos "seus" leitores. Mesmo sabendo que nunca poderá agradar a todos, contribui para um conjunto que se espera coerente e que os leitores precisam de reconhecer como tal.

Claro que há os tais "critérios de noticiabilidade" que ajudam, como base de partida, a promover ou a ignorar um dado acontecimento. Ingredientes como a novidade, a actualidade, a proximidade, a relevância social, são habitualmente referidos como obrigatórios para a notícia. Mas este é, sobretudo hoje, um crivo larguíssimo, por onde passa muito mais material informativo do que o que cabe nas páginas do jornal. A partir daqui, a selecção é mais fina: já não se fica pelos critérios gerais, antes se adequa a projectos informativos específicos e a sensibilidades diversas. Daí que um acontecimento possa "ser notícia" no PÚBLICO mas não no "Correio da Manhã", outro possa abrir o "Telejornal" mas não passar de cinco linhas no "Diário de Notícias", outro mereça meia hora de uma rádio local e nem um segundo da "TSF". E tudo vice-versa...

No fundo, o que espera um leitor do "seu" jornal? Espera (também) que, face ao manancial de informação existente em todos os domínios, ele o ajude a organizar e a hierarquizar o que em cada dia considere mais relevante, mais significativo, mais merecedor de atenção. E isto, naturalmente, dentro de condicionamentos práticos (um jornal tem um número finito de páginas e fecha a determinadas horas, por exemplo) mas também no âmbito de uma relação cujos pressupostos se conhecem e aceitam (um jornal de referência não atende aos mesmos assuntos, nem no mesmo registo, que um jornal popular; um jornal nacional tem um leque de interesses diverso de um jornal regional; um diário selecciona com critérios que não são os de um semanário). E é em todo este conjunto, mais feito de complementaridades do que de oposições, que um leitor devidamente "sinalizado" vai recolhendo a informação que lhe interessa.

Vem isto a propósito da queixa da leitora Maria Laura Martiniano (Portimão), que considerou "insuficiente e incorrecta" uma notícia, publicada no caderno Local/Lisboa de 2/10/99, a propósito do "prémio nacional de artesanato 1999". O texto referia apenas o nome de uma premiada, quando, segundo a leitora, "houve dois primeiros prémios, um em artesanato tradicional e outro em artesanato moderno, além de segundos e terceiros prémios".

O editor da secção, Francisco Neves, explica que decidiu publicar esta notícia porque lhe pareceu "com interesse do ponto de vista regional/local", até por se referir à "distinção de alguém ligado a práticas culturais específicas ou relativamente raras". Sobre as insuficiências, admite que podia ter sabido algo mais, mas não houve tempo porque a edição estava a fechar; por outro lado, confiou na selecção de informação que recebera da agência Lusa. Esta foi, afinal, a fonte da notícia - e o facto devia, como manda o Livro de Estilo do PÚBLICO, ter sido referido no texto.

Pelo que se disse atrás, talvez não fosse de esperar que um jornal com as características do PÚBLICO desse todos os nomes de todos os premiados neste concurso. Mas, se optou por fazer notícia, devia ter referido os vencedores dos dois prémios - porque dois houve, e não um. Tem razão a leitora, portanto. E o facto de a informação ter vindo da delegação do Funchal da agência Lusa (a única premiada referida é madeirense - lá está o critério da proximidade...) nem por isso desobriga o jornal.

Erro desagradável foi o que apontou o leitor Fernando Pulido Valente (Lisboa) e que saiu no destaque da edição de 6/10/99: na notícia sobre uma conferência de Fernando Rosas ("A República, a Igreja e Guterres"), escrevia-se que o golpe de 28 de Maio de 1926 fora "encabeçado por Sidónio Pais". Coitado de Sidónio, já morto desde 1918... Do erro penitencia-se o jornalista Ricardo Dias Felner (que confessa a sua confusão e precipitação) e penitencia-se o director-adjunto Nuno Pacheco, a quem coube supervisionar o jornal ("foi um desleixo, falharam as rotinas habituais"). Entende o provedor que talvez não seja necessário criar no PÚBLICO "uma comissão revisora" dos textos, como sugere o leitor, justamente aborrecido com a asneira; mas, se há mecanismos preventivos, espera-se que funcionem sempre.

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