Todo o Amado como nunca o
lemos até 2002
Por Kathleen Gomes
Quarta-feira, 8 de Junho de 2001
Dom Quixote edita obra conjunta revista
pela filha do escritor
"Tem literatura demais no mundo",
garantia Jorge Amado há dez anos, numa entrevista ao
jornal "Folha de São Paulo", sob pretexto
de cada vez ler menos e cada vez reler mais. O que relia,
então, o escritor brasileiro? Mark Twain, Dickens,
Maupassant, Zola, Gogol, Rabelais, Cervantes - "quando
a gente chega em certa idade, você tem o desejo de reler
livros que te disseram alguma coisa".
E foi preciso esperar para que ele, que contribuiu
para o tal acréscimo de literatura (e de livros) no
mundo, acedesse a reler-se a si próprio. "Sou
um grande leitor, mas não sou um leitor de Jorge Amado",
costumava repetir. Pelo menos até 1994, altura em que
a filha, Paloma Amado, tomou a cargo a revisão da obra
do escritor (com o devido aval do pai). Justamente por causa
da acumulação de edições e das
consequentes deturpações ocorridas ao longo
do tempo - o próprio escritor acabou por reconhecer
que chegara a altura de "limpar" os erros e imprecisões,
para que os leitores pudessem aceder aos textos originais.
"Há erros de todo o tipo, inclusive muitos cometidos
por mim, porque eu não corrigia nada, escrevia apressadamente,
coisas da juventude... Mas os editores também colaboravam
muito", declarou à "Folha de São Paulo".
"Não me preocupava muito com o estilo nem com
a ortografia". A título de exemplo, acrescentou
que "A Morte e a Morte de Quincas Berro D'Água",
de 1960, foi escrita em 48 horas.
Ainda assim, Paloma Amado (que tem trabalhado
com Pedro Costa na fixação dos textos, sob orientação
do autor) optou por manter "os erros do jovem escritor,
porque revelam a evolução do romancista".
O projecto, patrocinado pela empresa baiana
Oderbrecht, baseia-se na comparação entre os
textos das primeiras edições brasileiras e das
mais recentes: além dos erros ortográficos e
de gralhas, alguns dos textos sofreram, à altura da
sua edição, amputações por razões
de natureza política ou religiosa, como foi o caso
de "Capitães da Areia", o mais vendido dos
romances de Amado, onde se detectaram cerca de dois mil erros
e deturpações do texto original que se tinham
vindo a acumular, ao longo das suas 96 edições
brasileiras.
Por cá, as Publicações
Dom Quixote têm vindo a publicar, desde o ano passado,
a versão definitiva das obras de Jorge Amado, decorrentes
dessa revisão, em volumes que condensam dois romances
num só: já estão disponíveis oito
volumes, seguindo a ordem cronológica da bibliografia
do escritor (à excepção dos últimos,
reservados aos contos e novelas e aos livros de memórias).
O que ainda falta - ao todo, são 18 volumes (e não
os 14 inicialmente previstos) - deverá ser publicado
até ao próximo ano e, segundo Nelson de Matos,
editor da Dom Quixote, prevê-se a saída de mais
dois volumes ainda em 2001. Entretanto, o livro que reúne
"Mar Morto" e "Capitães da Areia"
(volume 3), já vai na segunda edição.
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